sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Sobre política



Essa  semana o Nico Araújo me disse que meu texto “O simbolismo afro-brasileiro no cancioneiro de Jorge Ben” é extremamente político.  Embora esse não seja nunca o meu primeiro objetivo, confesso que adorei! Na verdade foi um grande presente, porque me lembrou a importância da individualidade  do leitor, ou em outras palavras, mostrou que  Nico sabe que  política não é só uma questão partidária, mas é a forma de organizar o estar no mundo. Mostrar esse conhecimento, neste contexto texto das eleições mais tensas dos últimos tempos (ocorre em meio ao golpe) tem todo o significado.

Nesse sentido, a existência da minha coluna “História Cultural” no Blog da Loja Axé, e também todo o meu trabalho como pesquisadora  em História (especialmente o pós-doutorado sobre Pedro Bloch e o poder do diálogo com as crianças), em maior ou menor intensidade, é e sempre foi político. Sobretudo a extensa pesquisa  sobre a obra de  Guimarães Rosa, que negava o discurso “anti-humano”  da política, mas se orgulhava se ser diplomata, profissional da harmonização. E esse tipo de posicionamento, expresso na década de 1960, não é extremamente histórico e por consequência, muito político? Eu acho que é sim.

Nessa semana, em virtude da urgência do tema, eu também, escrevi um texto contra Jair Bolsonaro  que não assinei, mas que foi publicado como um posicionamento institucional, e do qual muita gente gostou muito. Eu gostei menos. Embora ali esteja o meu posicionamento legítimo, não me reconheço naquela forma de expressar tão direta. Não sou da “palavra de ordem”. Mas claro que isso não quer dizer que não tenho posicionamento político, como comecei alertando.

 Termino setembro com esse ato político, até para muito além do #EleNão, mas que é fundamental que ele não, isso é!

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Segunda é dia de Exu

Exu

SOU EXU
Não sou preto, branco ou vermelho
Tenho as cores e formas que quiser.
Não sou diabo nem santo, sou exu!
mando e desmando,
traço e risco
faço e desfaço.
estou e não vou
tiro e não dou.
sou exu.
Passo e cruzo
Traço, misturo e arrasto o pé
Sou reboliço e alegria
Rodo, tiro e boto,
Jogo e faço fé.
Sou nuvem, vento e poeira
Quando quero, homem e mulher
Sou das praias, e da maré.
ocupo todos os cantos.
sou menino, avô, maluco até
posso ser João, Maria ou José
Sou o ponto do cruzamento.
durmo acordado e ronco falando
corro, grito e pulo
faço filho assobiando
sou argamassa
De sonho carne e areia.
sou a gente sem bandeira,
o espeto, meu bastão.
o assento? O vento!..
sou do mundo,nem do campo
nem da cidade,
não tenho idade.
Recebo e respondo pelas pontas,
Pelos chifres da nação
Sou exu.
sou agito, vida, ação
sou os cornos da lua nova
a barriga da rua cheia!...
Quer mais? Não dou,
Não tô mais aqui!
(Jorge Amado)

sábado, 8 de setembro de 2018

Ora Ei Ei Ô Oxum


Sou Oxum. Transparecendo doçura venci todos os meus inimigos. Resisti com meu povo à escravidão, à fome, à humilhação. Minhas filhas, essas mulheres tão lindas, essas negras que exalam o doce perfume do macassá, sofreram as mais terríveis violências. Corpos expropriados, almas destruídas, ventres violados. Chorei ao parir esses filhos. Filhos da pior desgraça, filhos do medo, do abuso, da crueldade. Filhos que nem sempre pude amamentar, mas que amei como minhas mais belas joias, como minhas maiores riquezas.
Abençoei a luta dessas mulheres. Com mel e água curei suas chagas. Mesmo as dores mais profundas, abrandei. Nascer mulher é uma sina, um castigo? Que homem disse isso? Só quem desconhece a força da vida é capaz de negar o poder feminino. Sou Oxum, sou mulher. Sou a grande dama da sociedade, a Iyalodê! Sou rainha, sou mãe, sou feiticeira
Vim das terras de Ijexá e Oxobô, da Nigéria, da África. De lá transborda meu rio, o Rio Oxum, de águas douradas e calmas que se expandem e tomam muitas formas, que se transformam e se confundem, que se ampliam e desaguam. Águas sinuosas, um dia calmas, outro revoltas, mas nunca as mesmas.
Oxum é como as águas do rio que parecem límpidas e calmas, mas que sem o menor aviso se transformam em uma corredeira violenta que deságua em uma cachoeira de si.
Ser filha de Oxum é ser tudo isso e ter todo esse turbilhão de água ao seu redor e conseguir a calma necessária para superar todos os obstáculos
Gratidão ao universo por ser filha desta grande mãe
Ora ye ye ye ooooo Oxum

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Show dos 40 anos do disco Clube da Esquina 2


Entre 31 de agosto e 02 de setembro de 2018 o SESC Vila Mariana promoveu uma mini turnê em comemoração pelos quarenta anos do disco Clube da Esquina 2 (1978), em três shows de Wagner Tiso e Flávio Venturini, com convidados : Toninho Horta, Nelson Ângelo e Zé Renato.
O disco de Milton Nascimento, como o primeiro Clube da Esquina, em parceria com Lô Borges de 1972, contou com a presença de um extenso grupo de músicos, todos aglutinados em torno de Milton, o grande guru do Movimento Musical.
No  curso que assisti sobre o Clube da Esquina, a partir do artigo sensacional “Nada ficou como antes” do professor Ivan Vilela só foi abordado o primeiro disco e suas saídas musicais criativas, apesar de nós pedirmos muito para falar do disco 2, para Vilela o segundo disco não apresentava novidades frescas como o primeiro, seria apenas uma celebração da ideia daquele movimento musical. Se é verdade ou se é mentira, o certo é que em determinado momento do curso Vilela, que propunha um método auditivo para tratar das canções,  separou  três minutos e meio para ouvirmos a segunda faixa do segundo disco, ” Nascente” na voz de Milton Nascimento, e todos ficamos extasiados e emocionados.
O fato é que o disco Clube da Esquina 2, tanto quando o primeiro disco de 1972, tem seu lugar definido na memória afetiva e musical dos admiradores  da música mineira daquele álbum composto por vinte e duas faixas e tantas delas foram interpretadas no show. Como eu tenho o álbum todo preservado na memória, percebi que não foram interpretadas as faixas mais tristes do disco (que é também fruto da ditadura, como todo o Clube da Esquina), como “Olho dágua”, “e daí?”, “cancion por la unidad de latino America”, “Dona Oimpya”, “a sede do peixe”(essa é outra do meu coração porque tem Rosa),”Toshiro” e “que bom amigo”(que se eu escutasse ao vivo iria soluçar!)...
Além de boa quantidade de canções do disco, tocaram músicas simbólicas que estão no primeiro disco  como “Clube da Esquina 2”, “Paisagem na janela” , esta a única que a plateia, visivelmente não composta apenas de clubeiros (senti  isso porque sempre vou a shows do clubem sei como é quando tem clubeiros)  pareceu cantar com força).

Em geral, Wagner Tiso brilhou no piano  nos arranjos  para uma banda muito boa executar e todos se emocionaram muito. Uma canção, “o que foi feito devera” foi tocada duas vezes  e apesar de ter esquecido algumas letras, Flavio Venturini se saiu até que bem interpretando as clássicas do Bituca. Foi el quem contou a anedota  mais saborosa: quando o disco foi lançado, em 1978, a música de trabalho que puxava o álbum foi a sua composição “Nascente”, que já tinha sido gravada pelo Beto Gudes no seu primeiro disco “A página do relâmpago elétrico” (‘977), mas na voz do Bituca tornou-se definitiva. Achei interessante porque hoje, como o Clube da Esquina 1 e 2 são álbuns clássicos, nunca pensei em quais  teriam  sido suas músicas de divulgação ...  
Como sempre, super valeu ouvir música mineira, que eu amo, e estar entre clubeiros...
Agradecimento final