quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

A China já estava aqui

 
A foto podia mostrar mais detalhes
Só pra quem viu ao vivo 
 

Como sabem pesquisei Guimarães Rosa por cerca de uma década, fiz mestrado e doutorado sobre e sei que nem arranhei decifrar aquilo tudo. Quando li o autor japonês Kawabata observei algumas aproximações que devem ser devido ao “espírito do tempo” -escritos dos anos 1940/1950- , pois nunca vi nada sobre o Japão ou japoneses no acervo ou biblioteca de Rosa. Já sobre a China, vi muita coisa, talvez porque a história de Brasil e China não derive da época da imigração no século XX, como acontece com o Brasil e o Japão, mas de muito antes. Segundo Leyla Perrone Moisés, no artigo “Orientalismo e orientação em Guimarães Rosa” (2000), a influência chinesa nas artes coloniais brasileiras já  ocorria desde tempos mais remotos, em especial no estado de Minas Gerais (...) , devido à intensa circulação de pessoas e de cultura no interior do vasto Império português, e à concentração de suas riquezas nessa região."  Como Macau também foi colônia portuguesa desde 1557, e no século XVIII Minas era a colônia mais rentável, é compreensível que,  apesar de tão distantes geograficamente, para a metrópole, elas fossem uma terra só, uma terra deles. Embora eu não conheça muitos escritos  sobre a passagem dos chineses no Brasil colônia e isso  é  mais uma história de apagamento cultural, no caso dos amarelos em beneficio da dos brancos, é sempre bom lembrar que ela existiu, a prova é essa foto (muito mau tirada e escura, mas...) de dentro de uma igreja de Sabará com muita influência oriental. Mas e Rosa, onde entra nessa história? Ele percebia as marcas dessa influência tão longínqua em sua terra. No final da década de 1960  publicou em seu livro “Tutaméia” (1967) uma das suas estórias mais graciosas, chamada "Orientação", a estória do cozinheiro "Yao-Tsing-Lao - Facilitado para Joaquim. Quim" ,figura de "mínimas mímicas", chinês que acreditava que “esperar é um à toa muito ativo”, e assim vive um amor atribulado com a sertaneja Rita Rola,-Lola ou Lita,  “feia de se ter pena de se por em espelho”, mas havido o de haver. “Cheiraram-se e gostaram-se”. E “Yao amante, o primeiro efeito foi Rita Rola semelhar mesmo Lola-a´Lita- DESENHADA POR SEUS OLHARES. A gente achava-a de melhor parecer, senão formosura (...) O chino imprimira mágica (...) Casaram-se: “nôivo e nôiva: o par, til no i, pingo no a”  (o “chapéu” nos noivos e a troca na acentuação das letras é brincadeira do menino João Rosa, adoro). Não vou dar spoiler do conto, só recomendar a leitura mesmo. Faço isso porque,  nesse momento, para além da literatura, a China é a bola da vez. Nessa realidade distópica que se inaugura em 2025, não é que de trás de um biombo, surge a enorme e milenar China para mexer as peças do tabuleiro mundial? A China, que esteve ali há tempos, confiando que, como quis Rosa, “esperar é um à toa muito ativo” !