Nas tardes entre 03 e 05 de agosto de 2010 eu assisti ao envento promovido por um grupo de estudos sobre Literatura infanto juvenil aqui na USP. Assisti quase tudo ( só não via os filmes), porque queria mesmo era ouvir de que falavam os pesquisadores e me surpreendi para o bem com a densidade das pesquisas sobre os livros clássicos "Alice no país das maravilhas" de Lewis Carroll e "As aventuras de Pinóquio" de Carlo Collodi .
Vou escrever sobre momentos que eu pensei serem os mais reveladores do evento :
No dia 03/08 me encantei com a exposição de edições desses livros, muitas delas, de todos os tamanhos, formas, cores... fotografei tudo o que eu pude! Também Me encantou um livro enorme de pano, em forma de colchoado, onde vimos Alice e Pinóqui juntos! Depois começaram as palestras... a pioneira no tema na USP- Professora Nelly Novaes Coelho - falou um discurso lindo, apaixonado da literatura, como um fazer 'de ser humano' para 'ser humano', que não está submetido a tempos determinados e que isso também pode - e deve- tocar a sensibilidade das crianças. Foi a professora Nelly quem começou introduzindo o significado de abordarmos conjuntamente essas duas obras: ambas falavam eram releituras de um arquétipo literário - a viagm do herói - e por isso sobrevivem e se multiplicam em diversas linguagens. No caso de Alice, estamos diante de um forte questionamento da razão vitoriana, a partir da consideração da perspectiva de crianças, mais tarde um questionamento semelhante - mas para adultos - será apresentado por Kafka. No caso de Pinóquio essa viagem seria "iniciática", pois a personagem se transforma até fisicamente, e sua história foi escrita em um momento alegre da Itália - final das guerras - e a necesidade era produzir histórias didáticas e moralizantes.Neste dia eles exibiram o filme "Pinóquio", de Roberto Benigni -que é considerado como um dos piores filmes italianos. Será mesmo? Não assisti! Mas à tarde tivemos uma mesa redonda interessantíssima entre João Gomes de Sá (um escritor que adaptou Alice para o cordel) e o ilustrador Odilon Moraes.
Sobre João Gomes de Sá eu pensei ser uma das participações menos ricas do evento, porque ele começou sendo bem deselegante - dizendo que não gostava de ilustradores, mas elestava ao lado de um!- e apresentou uma leitura bem rasa de Alie, quando disse, mais de uma vez, que ela nunca sofria pelo indeterminado da história (não acho mesmo que isso seja verdade! Alice sofre, sim, ela chora várias vezes, mas o que ela não faz é drama!). Essa leitura dele é ligada à idéia da "criança sempre alegre", da "criança fofinha", que já sabemos não ser verdadeira (vide Freud) e muito menos a noção da criança como uma página em branco a ser preenchida, que partir de um pré positivação da educação formal, desconsiderando tudo que a criança já é antes disso!
Já Odilon Moraes apresentou leituras bem mais interessantes das obras! Para ele, talvez, a tradução do nome Wonderland como "país das maravilhas" é uma das possibilidades, mas significa iluminar apenas um lado da infância e escurecer outro sentido da palavra "wonder", que é inquietação (até o fim do evento vamos ver outras traduções para wonder, diferentes de maravilha). Pensar na criança como o ser que vive no mundo das inquietações é muito interessante para mim! Mas ele lembrou que não só as crianças são inquietas, todos os que tocam o espaço de potência poética da estranheza são banhados de inquitação.Eis uma belíssima conceituação de infância. Mas o mais interessante da fala dele para mim foi a leitura que ele apresentou de Pinóquio, como a alegoria da "morte da infância", isso porque todo o conteúdo moralizante da obra (o processo de aquisição da "roupagem ocidental") apresenta como iminente a morte do que é "criança". O interessante é que ele falou de uma leitura imagética onde o boneco -que está na vivência errática da criança- não se transforma em menino e deixa de ser boneco, ele aparece e o boneco fica de lado, esquecido. Acho isso lindo e verdadeiro. Se considerarmos isso, sempre é possível resgatar o boneco esquecido. Lindo!
No dia 04/08 tivemos uma palestra de Mauricio de Sousa sobre adaptação de clássicos. Na
verdade ele falou bem pouco de adaptação, falou muito mais da história de sua produção. Em um momento alguém pergunto sobre a opinião de uma mãe- que dizia que essa infância da qual ele tratava já não existe mais- ele disse que existem, sim, crianças, mesmo essas que estão usando as "cascas" urbanas e os seus questinamentos permanecem, pois são humanos.
Uma questão que reapareceu várias vezes neste dia foi sobre o que significa "ser boneco", porque pensamos na Emília, que por ser boneca, podia falar o que queria falar e a criança é um ser em processo de modelagem social, que está "aprendendo" os valores morais. Será que os reais 'bonecos' não somos nós, os que nunca tem sua voz ouvidas?
No dia 05/08 O mais legal que eu vi neste dia foi a palestra de Andréa Simão sobre adaptação de literatura para o cinema, ela explicou que para o cinema o que importa é a dinâmica 'ação/consequência" e que uma história como "Alice no país das maravilhas" tem o seu melhor justamente na ideterminação dessa dinâmica, então seria um tanto quanto violento adaptá-la, como fez Tim Burton. Ela falou, também, que essa racionalidade cinematogáfica de "causa e consequência" eliminava a reflexão e etava cada vez mais produzindo gente estranha.Uma pena é eu não estar na sala dela (estava assistindo por vídeo conferência), se não eu teria perguntado o que ela pensava da adaptação do livro Lavoura Arcaica de Raduan Nassar, que é muito criticada, mas que eu adoro, porque é levantar a bandeira do leitor do livro escrito.Ainda sobr cinema, ouvimos uma moça falar da relação entre o Pinóquio e o robô do filme A.I.,um filme idealizado por Stanley Kubrick e dirigido por Steven Spielberg, que é completamente inspirado na história de Pinóquio. O interessante foi que todo mundo teve que admitir ter CHORADO MUITO NO FILME DO ROBÔ PROGRAMADO PARA AMAR, MAS QUE NÃO CONTOU O AMOR DE NINGUÉM! (RS)
Mais adiante tivemos algumas das falas mais interessantes do evento: Alice apareceu não mais no "pais das maravilhas", mas sim no "pais do querer saber" (isso não é muito infância?) e por isso põe à revelia a lógica tradicional.
Outras pesquisadoras trataram da escritura de Alice - a linguagem labiríntica- onde atuam o Nonsense (que é trazido pela potencialização do ritmo, do som, que acabam por instituir novos sentidos através de uma outra ordem, a da brincadeira, do lúdico que produz estranhamento) - e do paradoxo que aposta na existência de dois sentidos ao mesmo tempo (o que é uma leitura da vivência infantil, que é grande para algumas coisas e ao mesmo tempo pequenas para outras, e o campo da brincadeira está exposto nos jogos sintáticos de Carroll, onde expressões aparentemente opostas podem ter o mesmo significado. Ainda sobre o texto de Carroll foram apresentados os chamados "Pequenos labirintos" 1o. CAMINHOS DIFERENTES E MESMA SAÍDA; 2o. CAMINHOS DIFERENTES E SAÍDAS DIFERENTES e 3o. PERDER-SE NA TRAJETÓRIA. No fim do dia, que também era o fim do evento todo, eu fui sorteada e ganhei o livro "As caçadas de Pedrinho", de Monteiro Lobato e eu fiquei querendo MUITO MAIS!
Parabéns aos organizadores do evento e a todos os participantes!
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