segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

As 16 caminhos (qualidades) de Mamãe Oxum

Mamãe Oxum e seu Abebé



Que em 2019 o Abebé (espelho)  da Mamãe Oxum mande de volta todo o mal para quem o espalhou! Oraeieiô! 💛👑🌻INFORMAÇÃO:
Qualidades do Orixá Oxum (Outubro 23, 2008 por Manuela) FONTE CLIQUE AQUI
Divindade calma veste-se sempre de cores claras, de preferência amarelas que é a sua cor consagrada; porém, dependendo da qualidade, òsun guerreira pode vestir-se de cor de rosa, òsun velha de branco e azul claro; òsun Ijimu, por exemplo, usa uma saia azul claro, òja e adé cor de rosa. Òsun leva na mão direita seu leque ritual, o abèbé de latão ou qualquer outro metal dourado, com uma sereia, um peixe ou até mesmo uma pequena pomba no centro.
O número de òsun sendo dezesseis, o colar terá dezesseis fios, dezesseis firmas (ou duas, ou quatro) que podem ser de divindades com as quais ela tem afinidade, ou com as quais sua filha estiver relacionada: Òsòsi, Sàngó, Yémánjá, por exemplo. Òsun dança os ritmos ijesa, com passos miúdos, segurando graciosamente a saia.
O toque Ijèsà é ritmado como o balanço das águas tranqüilas, e muito apreciado pelos fiéis. Quando estão Presentes Òsòsi e Logun Edé acompanham òsun. ògún também dança com òsun os ritmos Ijèsà, assim como òsányín. No terreiro jeje do Bogun, òsun (ÍYÁLODE) dança o bravum como Naná. Ela se banha no rio, penteia seus cabelos, põe suas jóias, anéis e pulseiras. No dia do deká de uma filha de Yasan (Oya Bale) daquela casa, òsun manifestou-se para disputar Sàngó, empurrando-a e dançando, provocante, diante do deus do trovão.
São dezesseis qualidades de Òsun;
– ÒSUN ABALÔ é uma velha Òsun, de culto antigo, considerada Iyá Ominibú, tem ligação com Oyá, Ogun e Oxóssi, veste-se de cores claras, usa abebé e alfange.
– ÒSUN IJÍMU ou Ijimú, é outro tipo de Òsun velha. Veste-se de azul claro ou cor de rosa. Leva abèbé e alfange, tem ligação com as Iyamís, é responsável por todos os Otás dos rios.
– ÒSUN ABOTÔ também uma velha oxun de culto antigo, ligada as Iyamís, feiticeira, carrega abebe e alfange, tem ligação com Nanã, Oyá de culto Igbalé.
– ÒSUN OPARÁ ou Apará seria a mais jovem das Òsun, e um tipo guerreiro que acompanha Ògún, vivendo com ele pelas estradas; dança com ele quando se manifestam, juntos numa festa; leva uma espada na m ão e pode vestir-se de cor de marronavermelhado,a Senhora da Espada.
– ÒSUN AJAGURA ou Ajajira, outra òsun guerreira que leva espada, jovem, tem ligação com Yemanjá e Xangô
– YEYE OKE Oxun jovem guerreira, muito ligada a Oxóssi, carrega ofa e erukere
– YEYE ÌPONDÁ é também uma òsun Guerreira ligada a Ibuálàmò. Yeye Pondá é rainda da cidade que leva seu nome Ìponda, leva uma espada e veste-se de amarelo ouro e branco quando acompanha Oxaguiã.
– YEYE OGA é uma òsun velha e muito guereira, carrega abebe e alfange
– YEYE KARÉ é um osun jovem e guereira, ligada a Odé Karè, Logun edé.
– YEYE IPETU é uma Oxun de culto muito antigo, no interior da floresta, na nascente dos rios, ligada a Ossaiyn e principalmente a Oyá dada a sua ligação com Egun.
– YEYE AYAALÁ- é talvez a mais ancestral dentre todas, veste-se de branco, ligada a Orunmilá e as iyamis, considerada a avó.
-YEYE OTIN- Osun com estreita ligação com Ínlè, ligada a caça e usa ofá e abebé.
-YEYE IBERÍ ou merimerin- Oxun nova, concentra a vaidade e toda beleza e elegância de uma Oxun, dizem que ser a Oxun de mãe menininha do Gantois.
–YEYE MOUWÒ- oxun ligada a Olokun e Yemanjá, grande poder das iyamís, veste-se de cores claras e usa abebé e ofange.
–YEYE POPOLOKUN- oxun de culto raro, ligado aos lagos e lagoas,
-YEYE OLÓKÒ- Oxun guerreira , vive na floresta nos grandes poços de água, padroeira do pôço.
Revisão: Fernando D’Osogiyan

domingo, 30 de dezembro de 2018

METAS PARA 2019

metas com glitter, para enganar

Quase não saem as metas para o ano novo. A instabilidade é tamanha que nem dá vontade de projetar nada, mas como o balanço das metas de 2018 foi melhor do que parecia, vamos tentar mais uma vez, mas agora estão reduzidas pela metade, vamos lá:

1 - CONTINUAR VIVA, resistindo num país que está sob um governo que gostaria de exterminar o que eu sou - mulher, negra, historiadora -, e não apenas sobrevivendo, também é importante viver e tentar me divertir sempre que puder, seja no Carnaval, na Casa das Caldeiras, no Instrumental Sesc Brasil, em qualquer lugar;

2 - ACHAR UM MOZÃO é meta da vida, pois não preciso  ser feliz sozinha. Mas sei que estou mais exigente e tal. só que com o tempo fico mais valiosa;

3-   ENCONTRAR  OCUPAÇÕES, pois uma vez viva e alegre, é importante  continuar tentando arrumar um jeito de me manter, minimamente nesse mundo cruel, seja trabalhando, seja estudando, seja escrevendo ou palestrando, porque a vida também é isso;

4- AMPARAR MINHA MÃE, nesse ano em que sua saúde está tão instável e  desafiadora  para nós duas, com a bênção de Deus e de todos os Orixás, vamos conseguir vencer mais esse grande desafio,juntas.

5- TREINAR BASTANTE, pois é o mínimo que posso fazer para me manter saudável. Num ano pesado e dolorido como foi 2018, tenho muito a agradecer por não ter tido nenhum problema com a EM. Em 2019 também estarei vestida com as roupas e as armas de Jorge! Salve Jorge!

sábado, 29 de dezembro de 2018

Oxum Ye Ye Ypondá

Não sei, mas acho que sou Yeye Ypondá... vaidosa, esposa de Oxóssi, come com Iemanjá, usa amarelo e azul, gosta de crianças... muito eu!
OXUM YPONDÁ

Um pouco sobre as passagens de Oxum.

Ypondá

Rainha na cidade de Pondá, dona do rio Pondá, Yeye Ipondá rivaliza com yeye Opará quando seus rios se encontram.

Yeye Ipondá é guerreira, vaidosa ao excesso, aponta sua espada para qualquer um e desafia o intruso. Muito ligada a Owárìs e Igbòálàmà, adora roupas douradas com branco e não responde no jogo mais de uma vez, ou seja, se ela responder entenda rápido pois ela não repetirá o que já respondeu.

Se irrita ao ser puxada numa roda de candomblé, gosta de ser a primeira se tiver outra Oxum na sala e conte com ela sempre quando se tratar de uma criança. Não perdoa um filho que não respeita ou quebra os seus preceitos e sua liturgia.

Ponda ou Ypondá como esposa de Oxossi Ibualama. Porta um leque. É a mãe de Logun-Edé e com sua espada guerreia bravamente. Vive no mato com seu marido. Veste amarelo-ouro e azul-claro na barra da saia. Alguns dizem que é relacionada ao fogo e aos cemitérios e tem ligação com Egun.

A pata é a sua maior quizila, seu bicho de fundamento é a tartaruga.

Tem ligação com Ogum, Oyá, Oxossi e Oxaguiã. Come com Iyemonjá e Oxalá. Alguns dizem ser companheira de Omulu, muito feiticeira tendo ligação com o fogo.

Uma lenda conta que....

“Ypondá e Opará disputavam o mesmo amor. Em um determinado dia, Ypondá deu-se conta de que os olhos de Opará brilhavam muito quando avistava Erinlé, o Odé preferido de Ypondá.

Ypondá muito faceira e perigosa, andava sempre armada com seu par de fisgas (espécie de arpão), chamou Opará e pediu que se ajoelhasse, nesta época Opará era uma espécie de dama de companhia de Ypondá e sempre ficava aos pés de Ypondá.

Opará muito jovem e sempre afoita mesmo sem entender, cumpriu com o pedido da Osun mais velha e correu para abaixar-se, quando Ypondá fisgou-lhe as duas vistas e arrancou fora os olhos.
Tornando-se então Opará cega. Onira revoltada com tal situação tenta comprar a briga de Opará, lançando raios contra Ypondá, e queimando-lhe os pés.

Ypondá por sua vez muitíssimo inteligente mira o abebé dela contra os raios de Oyá e a cega também. Desde então Opará e Oyá fazem companhia uma a outra, são inseparáveis e Ypondá por sua vez, as guia.A esta Oya damos o nome de Onira que é uma Oya Olodo (ou seja das águas).

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

"Receita para Nostalgia: Rosa e seus leitores"

Outro texto belo de recepção de Primeiras Estórias (1962), encontrado no  acervo João Guimarães Rosa no IEB e retirado dos anexos da tese de 2014. Este escrito por  Dinah Silveira de Queiroz, que estava em uma viagem a Moscou quando leu o lançamento de Rosa e fez considerações maravilhosas.
Foto do recorte encontrado no Fundo JGR no IEB
MOSCOU – Como começa no escritor essa tal nostalgia? – Perguntaram-me, aqui em Moscou, pois correu um zumbido entre pessoas que ela chegava a dar enjoo de estomago, dor de cabeça, distração no trabalho, mau gênio e às vezes até uma pontinha de febre. Tal pergunta nascia de uma conversa em que se tratava seriamente do fenômeno. Alguns usavam tranquilizantes,outros se encharcavam de música brasileira, ainda outros simplesmente se obstinavam a folhear velhos álbuns com menininhas em jardins  mães serenas. É preciso não caçoar da nostalgia – ela existe. Ouvi que russos ai também a sentem. A mesma insônia, a mesma moleza com o calor, aqui tocada pelo recolhimento do frio. E a gente se envergonhando no Brasil perante os que se ressentem da falta da neve. – ‘Pois olhe, meu amigo, verão maior do que este eu passei na Espanha’! Aqui, cidadãos procurarão convercer-nos de que frio, frio mesmo, é da Áustria. Mas voltando à pergunta:’Como começa essa tal nostalgia?’ Direi que ela chega meio imperceptivelmente, quando principiamos a enfeitar demasiado nossa vida quotidiana no Brasil. A tal ponto, que o insólito ruído da Avenida Copacabana,bem lembrado de longe, vira a mais alegre das sinfonias. Remédio para nostalgia? Sim,conheço paliativos; um deles será, por exemplo, ler o gostosíssimo livro de Guimarães Rosa, Primeiras Estórias , editado pelo nosso caro José Olympio e festejado por Luiz Jardim e sua pena feiticeira.
Convém que se peça a algum amigo de boa voz para ir lendo. Então Guimarães Rosa se faz canto da Pátria. Seus bandidos, suas santinhas, seus personagens cercados de mistérios – e vai ver tudo isto é  encantamento simples – pertencem aos ‘causos’, isto é, às ‘Estórias’ contadas e não lidas. Tudo tem graça, tudo é apetitoso, tudo faz nascer em mim a longíqua menina  que ainda sem saber ler chupava a ficção por um canudo :’Conta mais!’ – e se tornava um monstrinho devorador de histórias. Agora, quieta, os olhos cravados no rodopiar das lentas pétalas brancas que caem manso na paisagem , atravesso  o campo branco de neve, abro os olhos para os façanhudos irmãos Dagobé, penetro na misteriosa casa onde Guimarães Rosa montou sua maquininha de assombro e construiu um italiano misterioso que tinha um cavalo empalhado, o pudor de um irmão doente, e morreu por ter feito de verdade, como se desencantado.
Conheço, pois, algum remédio para nostalgia. E pena que ele aqui se torne  racionado, porque ‘Estórias’ como essas, de Guimarães Rosa, bem nos conduzem ao Brasil melhor que existe. Todo ele feito de graça e de cor, e que a gente ama ainda melhor assim de longe, com a perspectiva infinita da distância e a ressonância tão íntima da nostalgia.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

RELEMBRANDO 2018 4: Balanço das metas




Uma última forma de revisitar o ano 2018 é revendo as metas que eu mesma propus atingir neles. Neste ano tinha uma lista de 10 metas e analisar se cumpri ou não pode ser surpreendente.

1 - Arrumar um emprego desafiador na minha área para produzir e arrumar grana para prestar  concursos;
Meta parcialmente cumprida. Era meu desejo principal para 2018, a partir do qual eu supunha resolver vários outros, mas não foi, mesmo, como eu imaginei e desejei que seria. Não arrumei um trampo que me deu grana, mas mesmo assim prestei concurso e fracassei. Por outro lado eu produzi, escrevi cinco textos para um blog, o que me manteve aquecida no ramo do trabalho. Não foi um mar de rosas, mas também não ficou paralisado.
 2 - Encontrar o mozão para construir uma relação feliz;
Meta não cumprida. Essa é uma meta da vida, mas ainda não deu certo. Se em 2017 eu conheci muita gente e tive experiências das mais diversas, em 2018 fui bem mais seletiva, mas ainda não achei alguém que aposte nos mesmos planos que eu. Sigamos.
3  Publicar os artigos que não publiquei em 2017 por conta do fim do pós doc;
Meta cumprida. Além dos textos para o blog, que valem como contribuições informais, comecei o ano publicando o artigo Pedro Bloch: Um escutador de crianças, sobre meu pós-doc em um periódico especializado neste link . Logo em janeiro submeti um artigo sobre os Dicionários de Humor de Bloch para a Revista de História da USP, ele foi aprovado para publicação em primeira instância, mas ainda não foi publicado, vamos aguardar. Mais para o final do ano, enfim, publiquei o artigo As novas realidades das “fictâncias” de Guimarães Rosa., este sobre as representações de crianças nas estórias do Rosa, na revista Tópoi. Para um ano difícil como este que se encerra, acho mais que bom.
4 - Continuar frequentando o "Todo Domingo Musical" na Casa das Caldeiras;
Meta cumprida. Não foi como em 2017, só alegria, porque tivemos meses em que nem todo domingo foi musical, infelizmente. Mas nos que tivemos festas, eu estive lá, me divertindo muito.
5 -  Voltar a assistir frequentemente o Instrumental SESC Brasil toda semana;
Meta não cumprida. Embora tenha começado bem, frequentando o evento muitas vezes em janeiro, em breve comecei a ter problemas, fiquei doente, tive que estudar, fiquei com preguiça... Acabei desanimando muito e no final não tive mais ânimo de ir ao Consolação. Algo que lamento muito, especialmente porque não sabemos como ficarão as coisas com os cortes de verba no Sistema S... tomara que não, mas infelizmente há a possibilidade de eu ter perdido essas oportunidades de ouro e não sei se vou poder retomar.
6 - Seguir firme no treino seis vezes na semana, pois cansa,mas me fez muito bem;
Meta cumprida. Apesar de tudo, acho que consegui me manter fisicamente esse ano. Posso não ter sido tão assídua na academia, como em 2017, mas é que eu tive problemas – tive que estudar muito, viajar para o concurso, acompanhar minha mãe no hospital muitas vezes, desânimo com a vida mesmo, mas não cheguei a parar ou dei passos para trás. Estou contente por estar como estou. Sigamos.
7 - Continuar minha imersão no  mundo negro em novas músicas e pessoas, pois foi muito rico para mim esse exercício de identificação;
Meta cumprida. Cheguei no ponto onde não me identifico, e isso doeu muito. Não sei lidar com o não pertencer. Mas não vou parar a imersão, um dia pode doer menos. Tomara.
8 -Viajar. Se em 2016 fui a MG  e em 2017 ao RJ, para 2018 minha meta é voltar aos dois Estados, ou então conhecer um novo, quem sabe Salvador, para ajudar a cumprir a meta 7?! ;
Meta parcialmente cumprida. Não viajei para Salvador, nem para o Rio de Janeiro, mas estive em MG, num das viagens mais doloridas que fiz até lá, acho que vou demorar um bom tempo até ter coragem de retornar àquele lugar que eu tanto amo. Mas Minas sempre haverá e um dia ainda volto para lá!

9 - Assistir a um show do Tom Zé novamente, já que em 2017, ano que vi muitos e muitos shows, o dele eu não  pude ver depois de tantos anos sendo público fiel do meu ídolo;
Meta cumprida. Depois de dois anos, finalmente me dei de presente de aniversário outro show do Tom Zé, meu amado. Deu para matar um pouco da saudade e sentir como é bom estar “em casa” e como ele me nutre de forma tão integral! Viva Tom Zé, sempre!
10 - Ajudar todo mundo a transformar os obstáculos em conquistas  sempre que puder, essa é a meta para a vida!
Meta parcialmente cumprida. Foi um ano que senti como muito ruim, não só para mim, mas para todos e suponho que muito mais do que ajudar, eu fui ajudada tantas vezes. Gratidão.
Finalmente, ao contrário do que eu mesma suponha antes dessa análise, o ano não foi de todo ruim, muito pelo contrário, aliás: das dez metas  só duas não foram cumpridas; três foram parcialmente cumpridas e a cinco, a metade, oram cumpridas com sucesso. Só tenho a agradecer ao universo, a Deus e aos Orixás pela oportunidade de ter vivido mais esse ano, apesar de tantas vezes ter querido desistir de tudo. Não desisti e nem desistirei, pois imersos na vida não a interpretamos bem, no final revendo as cosias, o bicho nem era tão feio quanto parecia. Sigamos em 2019. Em breve publico a lista de metas para o Ano Novo.
 


terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Walmir Ayala fala sobre infância nas estórias de Rosa

Walmir Ayala, década de 1960


Na íntegra um dos textos mais belos que encontrei no acervo de Rosa, sobre a temática "infância", nas Primeiras Estórias...

Código Arq. IEB JGR R7,100                                                                            

Título  Primeiras Estórias
Autor Walmir Ayala
Data  02 de outubro de 1962
Periódico Jornal do Comércio RJ
Guimarães Rosa volta à praça surpreendentemente. E nos dando a lição de que, com fidelidade à sua linguagem, logo seremos dono dela.  E se é difícil? Difícil é. Pois  não regate-a  o novo em instante nenhum, e cria um “falar” que nos comunica a entonação certa da região onde é falado; restitui-nos aquele viço popular da formação de palavras a partir de outras, fundindo duas numa só, e o faz de forma a passar logo para os dicionários, isto é, certo, científico, inegável. Palavras como: ‘diligentil’, ‘brumava’, se multiplicam, mas todas perdidas (ou achadas) num discurso de alta poesia em rigorosa prosa, num constante depoimento humano que nos conduz ao inevitável  suspiro de concordância e pena:Mas, a mãe, sendo só a alegria de momentos. Soubesse que um dia a mãe tinha de adoecer, então teria ficado sempre junto dela, espiando para ela, com força, sabendo muito que estava e que espiava com tanta força, ah.”  Depois de tanto atravessar suas selvas, seguimos enfim, quase em totalidade, apreciar o frescor das águas que nos derrama. E é assim, como um verídico hausto de amor que nos chega. Saber contar uma história é assunto superado em Guimarães Rosa .  Isto ainda advogar mais a seu favor, no terreno de lhe acusarem de complicado, porque a ‘estória’ sobrenada à experiência, ao laboratório, e nos fica o seu forte incenso humano, seu sangue e sua doçura de flor silvestre, impregnando nosso atribulado instante:“De repente, a velha se desapareceu do braço de Soroco, foi se sentar no degrau da escadinha do carro. -"Ela não faz nada, seo Agente... – a voz do Sorôco estava muito branda: - Ela não acode quando a gente chama...” A moça, aí, tornou a cantar, virada para, o povo, o ao ar, a cara. dela era um repouso estatelado, não  queria dar-se em espetáculo, mas representava de outroras grandezas, impossíveis. Mas a gente viu a velha olhar para ela, com um encanto de pressentimento muito  antigo - um amor extremoso. E, principiando baixinho, mas depois puxando pela voz, ela pegou a cantar, também, tomando o exemplo, a cantiga mesma da outra, que ninguém  não entendia. Agora elas cantavam junto, não paravam de cantar.”Seus personagens são sempre simples, os que nada leram, nada mais ouviram falar do que de sucedimento espontâneo e  mágico da vida.Geralmente em sertões que são dissimuladas Bagdás. Delicia-se no entrosamento das onomatopeias para discriminar o instante ou o animal. Tem a permanente visão da paisagem, dando-lhe alma, comprometendo a gente com a  verdura e o panorama. Descreve com uma riqueza em que a imaginação vem servida de um caprichoso vocabulário, trançando verdadeiras filigramas plásticas.
“Senhor! Quando avistou o peru, no centro do terreiro, entre a casa e as árvores da mata. O peru, imperial, dava-lhe as costas, para receber sua admiração. Estalara a cauda, e se entufou, fazendo roda: o rapar das asas no chão brusco, rijo  se proclamara. Grugulejou, sacudindo o        abotoado grosso de bagas rubras; e a cabeça possuía laivos de um azul-claro, raro, de céu e sanhaços; e ele, completo, torneado, redondoso, todo em esferas  e planos, com reflexos de verdes metais em azul-e-preto - o peru para sempre. Belo, belo! Tinha qualquer coisa de calor, poder e flor, um transbordamento. Sua ríspida grandeza tonltriante. Sua colorida empáfia. Satisfazia os olhos, era de se tanger trombeta. Colérico, encachiado, andando, gruzlou outro gluglo. O menino riu, com todo o coração. Mas só bis-viu. Já o chamavam, para o passeio.”O sentido de acesso de Guimarães Rosa ao mundo que o rodeia é de extremada inocência. Pega pelo sentido da criança, toda a matéria de que necessita. Fala preferencialmente de crianças e ao falar delas vai escorrendo um pensamento multifacetado e inventivo, de bom pueril. Faz sua sabedoria do arrepanhado de sensações de quem vê o mundo pela primeira vez, acrescenta a isto uma cultura que apenas sedimenta as impressões e as legaliza. Pesquisa a linguagem infantil (vide o conto “A menina de lá”) ressaltando  a pureza poética dos seus vestígios, fazendo disso acertos para sempre.Sobretudo, em cada conto começado temos uma história perfeita, sem palavra a mais, que nos dá, acima do conflito sempre positivo pelo movimento emocional de rara beleza e humanidade em que se interpreta, uma definição completamente nova de sombra, do raio, do animal, do verdor, da água, e de mil elementos naturais pelos quais passamos cotidianamente e que nossos olhos não mais distinguem sob o pó do hábito e de nossa nublada solidão.  Então temos em Guimarães Rosa o milagre de ver-o-mundo, nisto reside seu dom efetivamente divino: ele cria inelutavelmente a partir de um material estritamente seu, inimitável. Como contista só lhe encontro paralelo em Clarice Lispector, diferentemente, é claro. Clarice é menos panorâmica, é mais restritiva e febril em sua paixão penumbrosa. Guimarães Rosa faz um exercício rente permanente de saltimbanco e nos transmite lugares inesquecíveis, coloca as pessoas em paisagens certas, reflete costumes tribais de extrema fatalidade, tem muito sol, e uma saudade indefinível em cada alma posta ali em terreiros, matagais, ambientes de intima pobreza. A morte sobrevoa suas histórias-estórias, não podia ser de outra forma em se tratando de um poeta de raro acento. Mas há uma contante para a vida que emoldura seus enredos: para o menino que viajou enquanto a mãe sarava, e que ia perseguido pela ideia dos tucanos, disso tudo criando uma fábula dramática e forte, para este menino ele reserva a frase final do conto assim: “Sorria fechado: sorrisos e enigmas, seus. E vinha a vida”; para o outro menino num simples passeio onde vê tantas coisas, inclusive a estranheza de um peru e sua morte, um menino perplexo diante das coisas inexplicáveis para um menino, para este menino ele  reserva outra frase final, ou seja: “ Era, outra vez em quando, a Alegria”; para Sorôco, acabado de levar a um trem de partida a filha e a mãe, loucas, o contista reserva aquele abrigo:” A gente estava levando agora o Soroco para a casa dele, de verdade. A ,gente, com ele, ia até aonde que ia aquela cantiga.”Assim prossegue, abraçando todos os personagens numa emoção de lágrimas, este grande prosador, sobre o qual é muito perigoso falar com armas de técnica literária, de estilística ou coisas mais. Um prosador para estar nas escolas e na afeição singela do povo, pois o povo as que ele quer comunicar. Difícil, já o dissemos no princípio deste artigo.Mas como atingirmos esta outra facilidade de sua música, se não nos debatermos no difícil de sua cartilha.
E depois, aprendidos em ler, como nos são dadas delícias com seu desenho primitivo e gritante. Quantos revoos para nossa alma vazia, quanta cor para nossa solidão brumosa, quanto amor para o nosso momento de apatia.Prosseguimos o livro: de repente se adensa em considerações sobre o espelho, bem menos eficientes, a meu ver, do que as considerações sobre a vaquinha fugida. Mas é no Espelho que vamos surpreender por um momento a exigentíssima oficina de Guimarães Rosa. Ao confessar-se um perquiridor, surpreendido num determinado ângulo de um espelho, e desconhecendo-se repelindo-se sob esta visão, ele começa a praticar o seu ‘urgir científicos de surpreender outros estágios de fisionomia, então: Operava com toda a sorte de astúcias: o rapidíssimo relance, os golpes de esguelha, a longa obliqüidade apurada, as contra-surpresas, a finta de pálpebras, a tocaia com a luz de-repente acesa, os ângulos variados incessantemente. Sobretudo, uma Inembotável paciência. Mirava-me, também, em marcados momentos - de ira, medo, orgulho abatido ou dilatado, extrema alegria ou tristeza. Sobreabriam-se-me enigmas. Se, por exemplo, em estado de ódio, o senhor enfrenta objetivamente  a sua imagem, o ódio reflui e recrudesce, em tremendas multiplicações: e o senhor vê, então, que, de fato, só se odeia é a si mesmo. Olhos contra os olhos. Soube-o: os olhos da gente não têm fim.”
Eis o homem. Astucioso, incansável, lúcido. Com as palavras o mesmo. Sobretudo sabedor de que os olhos da gente não tem fim. Os olhos de sua inteligência literária são dessa natureza: indefinidos. Mergulhadores incansáveis de um caos enumerável, ordenadores de sequencias latentes de gramática, simplificador de complexidades. Que mais dizer de um alquimista tão inevitável? Nada. Apenas convidar, insistir, impelir, a ler seus contos de “primeiras estórias” onde encontramos os mais belos momentos desse gênero literário no Brasil. E podemos entender melhor o que é o novo. E a quem isso não interessar lhe servirá o eterno, inerente e claro na narrativa de João Guimarães Rosa.
         (Texto retirado da tese RODRIGUES, Camila. Escrevendo a lápis de cor: Infância e história na             escritura de Guimarães Rosa)

domingo, 23 de dezembro de 2018

Salve São Jorge

Porque 2019 será regido por São Jorge/Ogum , começamos com ESSA MÚSICA LINDA

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

RELEMBRANDO 2018 3: Retrospectiva do blog


A tradicional retrospectiva do blog Pequenidades, embora eu tenha escrito pouco aqui esse ano e  a vontade de rever esse ano duro seja quase zero, vamos lá:

JANEIRO – Estava confiante de que ia achar algum trabalho e procurando muito, mas em troca só o grande silêncio. Vi  ouvi Hamilton de Holanda e Armandinho no Sesc Instrumental. Li  a biografia de Van Gogh de David Haziot e amei !
Biografia de Van Gogh

 Neste mês também foi publicado o  meu primeiro artigo sobre meu pós doutorado  sobre  Pedro Bloch e as crianças e eu estava positiva sobre o ano que só começava.
FEVEREIRO – Como quase todo ano, fevereiro é Carnaval... em 2018 foi um desses! Nas escolas de samba cariocas, emocionante foi a Tuiuti e sua crítica social! Mas eu curti demais mesmo foram  os bloquinhos de rua aqui de Sampa. Tentei o pré-carnaval o bloco Pilantragi, mas acho que eles dão certo só para festas e no bloco  não deu muito certo. Diversão mesmo só  nos quatro dias oficiais : começando com meu favorito Tarado ni você! Depois o delicioso Bloco do Sydney Magal e minha estreia no Bloco Lua vai  e a tentativa de diversão no Bloco SP Beats e fez o ano valer a pena!
Elenco de Pantera Negra

Mas fevereiro foi mesmo o mês do filme Pantera Negra! Que sensação! Amei, amei amei!
MARÇO- Embora eu tenha começado bem, ouvindo as sensacionais meninas do grupo Dedo de moça misturarem samba e música erudita  no Instrumental Sesc Brasil e do Red Hot Chili Peppers ter tocado "Menina mulher da pele preta", "esta música linda" no Lollapalooza, março foi o mês marcado por mortes : começando pelo brutal assassinato de Marielle Franco, que ainda não engolimos até agora.  Depois foram mortes na ciência, o físico Steven Hawking e o historiador Hayden White, encerrando uma era da historiografia, na qual eu também fui formada. Sigamos.
ABRILFoi um mês de celebração para mim, fui a dois shows maravilhosos no Sesc Pompéia, o Grooveria, com a minha parceira de rolê Andrea Pereira. 
Eu e Eriane na festa black

Depois  num Baile Black, no qual conheci o Jordan Costa, da banda The Soul Session, sempre louvando Tim Maia, nosso rei! Também em abril eu vi, com a Rosane Pavam, a exposição do fotógrafo Chichico Alckmin sobre Diamantina, coisa linda, lindíssima! 
MAIOFoi o inicio de um período com menos comemorações na  vida,  mas eu comecei a escrever textos sobre a herança africana na canção brasileira, com um texto sobre Jorge Ben, que eu amo! 
JUNHO Se em fevereiro tem carnaval, junho tem Festa Junina, e em 2018 não foi qualquer uma, foi uma Pilantragi, morri de dançar!


Caipirinha pilantra


Divulgação da festa junina
Mas junho foi mesmo um intenso mês de estudos, e  nele consegui escrever sobre canção popular, como este texto sobre o disco Tecnomacumba, da Rita Ribeiro. 
JULHO Foi o mês que curti uma dolorida frustração profissional, por isso postei pouca coisa aqui no blog. Ainda neste mês eu publiquei um texto sobre a herança africana na música de Milton Nascimento, mas o que me salvou mesmo foi a Copa do Mundo, na qual SÓ DEU SENEGAL!Queria todos para mim, mas o mais comentado aqui foi mesmo o técnico Aliou Cissé, que homem maravilhoso!
Um senegalês gentil
 AGOSTO – Em agosto não tinha mais Copa, mas ainda tinha que digerir a frustração de julho, foi  punk, fiquei dias sem forças para sair de casa. Mas aproveitei para ler o livro mais legal do ano, Segredos guardados,  do Reginaldo Prandi, foi maravilhoso. 
Capa do melhor livro do ano
SETEMBRO – Também foi duro. Preocupada com a saúde da minha mãe. Fui a igrejas, a terreiros, a todos os lugares. Logo no começo do mês eu assisti a um show sobre o disco Clube da Esquina 2, muito emocionante. Salvou meu mês. Tive que falar de política no blog, falei bonito, não de forma eleitoreira, mas com propriedade. Mal sabia o terror que seriam as eleições, embora os alertas estivessem sendo dados!
Melhor meme de 2018
OUTUBRO  Eleições, só o terror! Um mês cheio de temor:  #EleNão, fake news, um horror! De bom foi que escrevi mais dois textos, um sobre o primeiro disco dos Afro Sambas, este sobre o lançado na década de 1960, o outro sobre a regravação dele por Baben Powell, coisa muito fina.
Foi meu aniversário de despedida dos "inta" e comemorei lindamente os 39 anos no Memorial da América Latina com as amigas Ana e Karen, depois teve até surpresa de um grupo de samba
a surpresa de aniversário da Ana Matos e da Karen

Amigos que me levaram para um bar para me fazer surpresa
NOVEMBRO – Tudo que temíamos em outubro aconteceu em novembro. #EleNão virou Ele sim e o clima não foi nada tranquilo, novamente. De bom teve o Dia da Consciência Negra, com DJ Hum e tudo mais, e que tive este artigo publicado em uma revista conceituada. Segue o baile.
Baile Soul do DJ Hum 
DEZEMBRO – Inferno astral de Jesus. Imagina, né? Tivemos uma resposta emocionante, sensata e precisa do  historiador Sidney Chalhoub sobre os ataques à história que sofremos no Brasil de 2018, muitos orixás e cansaço deste ano mau. Adeus 2018...

Em breve posto o último da série RELEMBRANDO 2018, e será um balanço  sobre as metas 2018 e as propostas para 2019.