domingo, 30 de junho de 2019

Um monólogo de "Dor e Glória", de Almodovar

Asier Etxeandia interpreta Albarto Crespo

No filme  "Dor e Glória" de Pedro Almodóvar, um momento impactante é quando o basco Asier Etxeandia, no papel do ator Alberto Crespo,  interpreta um belo  monólogo do cineasta em declínio Salvador Mallo.

Em frente ao fundo vermelho vivo, comum ao Almodóvar tradicional (mas quase inexistente em Dor e Glória, quando os vermelhos tendem mais para o vinho), conta uma história de amor homossexual adolescente, que imediatamente me lembrou o conto "Frederico Paciência", de Mário de Andrade. Mais tarde, no filme, ficamos sabendo que uma das personagens que teriam dado origem ao monólogo se chama Frederico.


Coincidência deliciosa, né?
Vamos ver um breve trecho do monólogo, para nos deliciarmos?




"Estávamos em 1981 e Madrid era nossa!"

sábado, 29 de junho de 2019

Dor e Glória : O Outono alaranjado de Almodóvar

Um registro perdido no tempo

Nesta última semana assisti  mais um filme de Pedro Almodóvar, o  Dor e Glória, na companhia de uma grande amiga e, como sempre, foi uma baita experiência. Fazia tempo que não ia ao cinema  e sobretudo fazia tempo que não via um Almodóvar, por isso praticamente pedi a uma amiga, que tem o mais belo olhar sobre as coisas que eu conheço, para assistir comigo. Fomos no famoso cinema da Augusta, hoje Cine Itaú, o antigo Espaço Unibanco e regressar àquele lugar que foi tão meu, onde vivi tantas experiências cinematográficas, foi como voltar a uma vida que eu achei que não existisse mais, mas ela existe e eu posso participar dela, ainda.
 Sobre o filme, deixei passar alguns dias, para o impacto esfriar um pouco e ainda acho que poderia falar de alguns temas interessantes, como os atores, a questão do desejo, as lembranças da infância, mas sobre tudo isso tantos já falaram com mais propriedade que eu que eu quero apenas deixar um brevíssimo comentário sobre a mudança estética  que eu vi ocorrer  nesta obra .
Continuamos vendo um filme no qual as  famosas "cores de Almodóvar", por si só, já dizem muito e são, sem dúvidas, personagens da película. Mas estas estão diferentes. Os tons mais usados são os azuis  e os vermelhos, mas ambos se apresentam mais frequentemente em tons  menos quentes do que de costume. Seja na caverna onde o personagem principal morou quando menino, ou na casa mal iluminada que vive na maturidade para afastar as crises de enxaqueca, a luz, que destaca a cor, é economizada, como se estivéssemos mesmo num alaranjado pôr do sol.
Seria o outono da cinematografia de Almodóvar?Vejamos algumas imagens:




Cores se diluem no começo do filme.
A mãe: flores

O reencontro: tons mais claros
Paisagens oníricas: vermelho e Amarelo formando o alaranado pôr do sol



Muito azul e vermelho em todo o cenário


Azul e vermelho na casa



A infância: pontos vermelhos
Edoardo: O desejo é um espaço em branco



segunda-feira, 24 de junho de 2019

Ainda a biografia de Martinho da Vila : a ancestralidade tomando o corpo social dos afrodescendentes

Na bio de Martinho, p. 100: Martonho com Mãe Teresa e
 Ruça na Folia de Reis, em Grajau ( sem data)nar legenda

Continuo lendo a bio do Martinho da Vila nas tardes de segunda feira e adorando.
Como já tinha deixado claro, Martinho é uma figura que muito me encanta, é um  sucesso, um sambista, um autor,  um militante, um negro que deu certo! Fequentemente, ao saber mais sobre os seus feitos, me emociono.
Hoje li mais sobre a presença da herança angolana nas composições musicais de nossos sambistas
Primeiro sobre de uma composição chamada Semba dos Ancestrais, que é do tipo que arrepia até a alma, especialmente a letra
Se teu corpo se arrepiar
Se sentires também o sangue ferver
Se a cabeça viajar
E mesmo assim estiveres num grande astral
Se ao pisar o solo teu coração disparar
Se entrares em transe em ser da religião
Se comeres fungi, quisaca e mufete de cara-pau
Se Luanda te encher de emoção
Se o povo te impressionar demais
É porque são de lá os teus ancestrais
Pode crer no axé dos teus ancestrais (Martinho da Vila Semba dos Ancestrais)
 Chama-se semba um ritmo angolano  que foi dos que originaram o nosso samba e nesta composição aparece em sua melhor forma:


Mas Martinho estava habituado à vivência da herança africana no Brasil e isso é louvado de muitas outras formas e seu trabalho. Segundo sua biógrafa Helena Theodoro, no disco Canto das Lavadeiras (1989), Martinho  homenageia as congadas, como forma de ocupação do espaço social pelos afrodescendentes. Nesse contexto, fez o Brasil inteiro cantar sua adaptação do canto da congada de Barra do Jucu no Espirito Santo. Quem não se lembra de Martinho cantando essa? 
De arrepiar, não acham?

sexta-feira, 21 de junho de 2019

Odilê Odilá: Martinho da Vila e João Bosco

Continuo lendo a bio do Martinho da Vila, e agora achei um trecho que trata do meu querido João Bosco. Eu sabia que João, dentre os músicos mineiros que se tornaram universais, ao contrário da galera do Clube da Esquina, que requintaram na harmonia, aproximou-se dos sons dos pretos e atribuía a isso músicas como Odilê Odilá. 
Mas na bio do Martinho soube que esta foi composta durante um passeio deles pela gelada madrugada de Sampa, quando encontraram uma baiana vendendo acarajé, que lhes gritou Odilê e ofereceu uma cachacinha pra esquentar, gesto que responderam com Odilá e uma batucadinha! Segundo a biógrafa Helena Theodoro:
Martinho da Vila: Reflexos no espelho, p. 92
Isso é muito História Cultural brasileira!

sábado, 15 de junho de 2019

Poder negro

BLACK LOVE IS BLACK POWER!

É porque "a gente combinamos de não morrer", lembra?
BLACK LOVE IS BLACK POWER!

terça-feira, 11 de junho de 2019

A bela voz da ancestralidade : Tiganá Santana

Tiganá Santana

Mano! Mano! Mano!
Como faz com UM HOMEM DESSE, FALANDO UMAS COISAS DESSAS?
Acho que eu desejo algo assim para minha vida! 

sábado, 8 de junho de 2019

Samba e História, por Almir Guineto

Caxambu : na alma do povo brasileiro 

Coisa mais linda essa entrevista. Nela Almir Guineto fala de samba, de História, de Caxambu, etc

terça-feira, 4 de junho de 2019

Gingos reagem ao Pagode anos 90

Como toda situação de encontro entre culturas,  é muito engraçado e interessante. Eles falam zig zig zig ê, não #digdigdigê kkkkk


domingo, 2 de junho de 2019

"A gente combinamos de não morrer" , por Conceição Evaristo

Desde o ano passado, conhecemos o nome de Conceição Evaristo por causa da fala a ela atribuída "Eles combinaram de nós matar, mas nós combinamos de não morrer" e essa foi a voz de reação dos negros ao cenário infernal que se montado no Brasil de 2019. 
Porque a citação é MUITO BOA, acabei usando sempre sem conferir se era fato ou fake. É fato, é uma síntese do livro Olho Dágua (clique aqui para ler em PDF) , especialmente  do conto "A gente combinamos de não morrer"  deste livro.  
Capa do livro de Conceição Evaristo

Pois ontem eu. muito antiquada, imprimi e li com atenção o conto "A gente combinamos de não morrer" e,claro, ele não saiu de mim.
O conto tem aquele movimento do século XX, meio Saramago, no qual a "voz de fala" muda a todo o momento e o que importa é o manter o fluxo da FALA. Sim, estamos falando de oralidade, por isso que é verdade que Conceição Evaristo escreveu aquela frase, mas não como foi divulgado, pois no seu conto não é "nós combinamos de não morrer", e sim "a gente combinamos de não morrer" . Essa diferença, para uma especialista na literatura de Guimarães Rosa, é fundamental.
Mas esse combinado, um " juramento feito em voz uníssona, GRITADO SOB O PIPOCAR DOS TIROS " (como não lembrar dos 200 tiros disparados e 80 acertados no carro da família que só tinha como "crime" ser negra?), pelos meninos do morro, as mães etc... todos os que, sem dúvida, TINHAM COMBINADO DE NÃO MORRER, ainda que morressem, e sabiam que iam morrer e não demoraria, pois sempre foram, são e serão vidas não permitidas de serem vividas. Balanço mais sintético a respeito da situação do negro brasileiro, é muito difícil encontrar
Para sair do título fortíssimo e revisitar o texto, que trata da realidade de pobres negros envolvidos com tráfico de drogas (a tal da nova senzala, saca?), escolhi este trecho ,que não sai da minha memória:
"Dorvi respirou e aspirou fundo. Mas que merda, pó contaminado, até parece talco para pôr na bunda de neném.Pois é, meu filho nasceu. Um pingo de gente. Quando Bica me mostrou, nem tive coragem de olhar direito. Pequeno,tão pequeno! Deveria ter ficado na barriga da mulher, ou melhor, incubado como semente dentro do meu caralho.Quis cutucar o putinho com a ponta de minha escopeta.Bica se afastou como se o filho fosse só dela. Não sei para que o medo."
Não tinha porque ter medo, afinal já tinham jurado e combinado de não morrer, né? E estavam procriando, mesmo achando que o melhor seria ter deixado ele no útero, ou nem mesmo ter saído "de dentro do caralho", porque vivo, teria que combinar de não morrer, mesmo que tenham combinado de matá-lo e faz tempo.
Sem medo, portanto, recomendo vivamente a leitura de Conceição Evaristo!