sábado, 24 de maio de 2008

Comentando a História de sua cidade, nosso escritor começou “O Verbo e o logos”, seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em 17 de novembro de 1967:

“Cordisburgo era pequenina terra sertaneja, trás montanhas, no meio de Minas Gerais. Só quase lugar, mas tão de repente bonito: lá se desencerra a Gruta do Maquiné, milmaravilha, a das Fadas; e o próprio campo, com vasqueiros cochos de sal ao gado bravo, entregentis morros ou sob o demais de estrelas, falava-se antes : ‘os pastos da Vista Alegre’. Santo, um ‘Padre Mestre’, o Padre João de Santo Antonio, que recorria atarefado a região como missionário voluntário além de trazer o raro povo das grotas toda sorte de assistência e ajuda, esbarrou ali, para realumbrar-se e conceber o que tenha talvez sido seu único gesto desengajado, gratuito. Tomando de inspiração da paisagem a loci opportunitas, declarou-se a erguer ao Sagrado Coração de Jesus um templo, naquele mistério geográfico. Fe-lo, fez-se o arraial, a que o fundador chamou ‘o burgo do Coração’. Só quase coração – pois onde chuva e sol e o claro ar e o enquadro cedo revelam ser o espaço do mundo primeiro que tudo aberto ao supraordenado:influem. Quando menos, uma noção mágica do universo.”

João Guimarães Rosa. O verbo e o logos. In : ROSA,Vilma Guimarães. Relembramentos: Guimarães Rosa, meu pai. P. 481.