“ ’Às vezes o México é um país nefasto, mas às vezes
também é um país magnífico.’ A frase é quase um bordão deste livro e resume
muito de seu clima mental: palavras rebuscadas que, com maniqueísmo naïf, tentam dar sentido às absurdas
contradições da realidade ‘patética e sórdida.’ Quem as diz é o pequeno Tochtli
(coelho, na língua asteca), garoto curioso que vive entocado na fortaleza de um
cartel da droga. Seu pai-chefão, Yolcault (serpente-cascavel), parece hesitar
entre a vontade de preservá-lo do mundo cruel e a necessidade de adestrá-lo
como herdeiro, jogando de esconde-aparece com o indícios e o sentido da
violência. Faz questão de que o filho seja educado por um professor ‘que é dos
cultos’, egresso da esquerda esclarecida, mas por outro lado decreta que, se
ele chorar, não será mais macho; não quer que veja certas cenas fortes do noticiário,
mas assiste com ele aos sanguinários filmes B e lhe mostra as reais e brutais
surras aos ‘maricas traidores’; oculta-lhe seu imenso arsenal de guerra, mas
brinca de ensiná-lo a atirar nas zonas mais vulneráveis do corpo humano; é
coruja e mandão, mas não quer que o chame de pai.
Não
à toa o garoto passa o tempo tentando desvendar os mistérios que envolvem sua
vida. Entre uma sessão de Playstation e um sermão anti-imperialista do
preceptor, examina incansavelmente sua gaiola de ouro para construir e testar
uma cosmovisão que dê conta de tudo o o que vê e ouve. Mas só quando Yolcault
decide que é hora de sumir por um tempo, tirando-o desse mundo fechado, é que Tochtli
vive sua reviravolta existencial: embarca numa viagem delirante que, na volta,
completará todo um ciclo de revelações
iniciáticas.
Festa
no covil concentra em suas poucas páginas um panorama impactante e sem
moralismos da violência do narcotráfico em meio a outras violências, pelos
olhos límpidos e pela voz surpreendente de uma criança à beira do abismo
de seu destino.”
(Texto da orelha do romance “Festa
no Covil”, de Juan Pablo Villalobos. São Paulo: Cia das Letras.2012)