quarta-feira, 27 de junho de 2012

Vendo vozes Oliver Sacks


"Não falamos ou pensamos apenas com palavras ou sinais, mas com palavras ou sinais que se referem uns aos outros de uma determinada maneira. (...) Sem uma inter-relação adequada de suas partes, uma emissão verbal seria mera sucessão de nomes, um amontoado de palavras que não encerra proposição alguma. (...) A unidade da fala é uma proposição. A perda da fala (afasia)é, portanto, a perda da capacidade de proposicionar (...) não só a perda da capacidade de proposicionar em voz alta (falar), mas de proposicionar interna ou externamente. (...) O paciente sem fala perdeu-a não apenas no setido popular, de não conseguir se expressar em voz alta, mas no setido completo. Falamos não apenas para dizer a outras pessoas o que pensamos, mas para dizer a nós mesmos o que pensamos. A fala é uma parte do pensamento."
 (Hughlings- Jackson, citado por Oliver Sacks em Vendo vozes.p.28)

"Joseph (um surdo) ansiava por comunicar-se, mas não conseguia. Não sabia  falar, escrever, nem usar a língua de sinais, e só podia servir-se de gestos, pantomima, além de uma notável habilidade para desenhar.(...) Anteriormente privado de oportunidades - pois ele nunca fora exposto à língua dos sinais, Joseph  estava começando a aprender um pouquinho e a ter comunicação os com outros. Isso manifestamente o deleitava; ele queria ficar na escola o dia inteiro, a noite inteira, o fim de semana inteiro, o tempo todo. Dava muita pena ver sua aflição ao sair da escola, pois ir para casa, para ele, significava voltar ao silêncio, retornar a um vácuo de comunicação sem esperanças, onde ele não podia conversar, comunicar-se com os pais, vizinhos, amigos; significava ser deixado de lado, tornar-se novamente um ninguém.
Isso era muito pungente, extraordinário - sem nenhum paralelo exato em minha experiência. Lembrava-me um pouco uma criancinha de dois anos vacilando a um passo da língua - mas Joseph tinha onze anos, era na maioria dos outros aspectos, um menino de onze anos. Lembrava-me um pouco um animal não verbal, mas nenhum animal jamais transmitiu o anseio pela língua como fazia Joseph." Oliver Sacks. Vendo vozes. p.42-3