sábado, 31 de março de 2012

Lidar com manuscritos: Questionamentos éticos!

“... na cultura contemporânea que a questão dos limites se faz ainda mais necessária diante do desejo de transparência, do culto da auto-exposição ou da constância da pergunta "como você escreve?". Quando não há qualquer coisa que seja produzida na intimidade que não alcance um valor mercadológico no instante seguinte (premência que sofrem com muita força os manuscritos de trabalho, as cartas, etc.), seria interessante que o crítico genético se perguntasse pelos limites de sua própria pesquisa. Isto é, o trabalho do geneticista, com mais força do que qualquer outro trabalho crítico, é um trabalho que depende do questionamento constante de seus próprios pressupostos."
Roberto ZULAR. CRÍTICA GENÉTICA, HISTÓRIA E SOCIEDADE.
http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?pid=S0009-67252007000100017&script=sci_arttext


Eu não sou crítica literária, nem tampouco geneticista, mas também pesquiso produções manuscritas e sempre, sempre me pergunto "qual a minha legitimidade em consultar estes textos produzidos para permanecerem em âmbito privado (como cartas e Cadernos de Estudo) e que agora, eventualmente, já foram até publicados?
Será que me questionar sobre isso quer dizer dar uma super atenção às questões individuais? Sei não...
Ainda na graduação eu estudei um pouco sobre a lida do pesquisador com cartas e me dei conta de que este gênero é bem mais complexo do que parece: se eu leio as cartas escritas, devo ter noção que quem as escreve nunca é diretamente o seu autor, mas um ser fictício que ele criou para se comunicar com seu destinatário naquele momento. Portanto, tem seu alto grau de ficção e isso deve sempre ser levado em conta, só que historiadores costumam ter grande dificuldade em lidar com ficção...
Claro que, à medida que exponho esses meus questionamentos internos, muitos poderão retrucar de imediato. Não me importo. São as marcas do meu processo de pensamento em ação...

terça-feira, 13 de março de 2012

Sobre o Tempo


"O tempo não exite em si, afirma Norbert Elias - não é nem um dado objetivo, como sustentava Newton, nem uma estrutura a priori do espírito, como queria Kant. O tempo é antes de tudo um símbolo social, resultado de um longo processo de aprendizagem. Nesta vasta exploração da experiência do tempo ao longo das eras, Norbert Elias nos convida a refletir sobre um aspecto fundamental do processo civilizador." Comentário da segunda capa do livro.
ORA, 'REFLETIR SOBRE A EXPERIÊNCIA DO TEMPO' NÃO É (OU DEVERIA SER) TAREFA PRINCIPAL DO OFÍCIO DO HISTORIADOR? LOGO AQUI ESTAMOS FALANDO DE HISTÓRIA PURA, OU NÃO?

sábado, 3 de março de 2012

A morte da mula sem cabeça


"Na porta de seu Chaves, o farmaceutico, tinha uma lâmpada na varanda e eu e minha mãe descemos e a esposa dele - ó me esqueço o nome dela - falou "Helena..." e minha mãe "Mas que iluminação linda, que lâmpada linda", "Helena venha ver", ai eu entre com minha mãe e ... criança não fala, né, ai minha mãe e ela começaram a falar e eu olhando aquela luz faiscante, porque uma lâmpada, naquele tempo não tinha nenhum abajour , era simplesmente a lâmpada nua, ninguém tinha ainda pensado em abajour, então eu fiquei olhando aquela coisa faiscante, aquela luz absolutamente irrepreensível na varanda toda, que ia pro quintal, ia pra rua ai eu tive uma intuição, da metafísica, do folclore, sei lá e disse assim "nossa, morreu a mula sem cabeça, morreu o lobisomen, acabaram as histórias de medo, porque o medo precisa do escuro."

Tom Zé. DVD Prirulito da ciência

Nas páginas 4-5 do livro Tom Zé tropicalista lenta luta, há uma foto da Praça do Comércio em Irará, esquina da venda de seu Naziazeno, que pertence ao acervo pessoal de Tom Zé. Olhem e digam se não lembra essa anedota? Reparem na Luz:


Tom Zé e a música de protesto...




"Eu trabalho com música como uma coisa que as pessoas às vezes confundem e chamam música engajada e música de protesto e nestas palavras engajamento e protesto tem várias nuances. A canção de protesto como é registrada em dicionário é o método jesuítico com a novidade da palavra de ordem e eu não pratico isso. Eu pratico observar a sociedade quando ela baixa a guarda por descuido, fotografar rapidamente e depois tentar descrever rapidamente aquilo que ficou desnudado, aquilo que ela não pode confessar, e isso não pode ser chamado de música de protesto, isso é música que pode aumentar a capacidade de discernimento da platéia, mas música de protesto não!"

Tom Zé no DVD Pirulito da ciência, 2010

Pois é isso meus senhores, arte criativa exige a participação direta dos receptores para constituirem seu sentido. Não são fáceis, exigem atividade mental para discernir as coisas e executar filtragem nos discursos. Essa é uma prática que dá certo, mesmo que às vezes a gente se deixe levar por discursos já prontos, que parecem ser mais apaziguadores, mas não podemos perder de vista que a vida está ai para ser refletida sempre, não podemos ter preguiça!