Capa de Leonardo Loft, Com indicações de prêmios |
Como um ponto de partida para explorar a que pé anda a literatura contemporânea, gosto de explorar, um pouco, a lista de romances indicados ao Jabuti, nem todos os livros me interessam, tem os que eu já li, tem os que gostaria de ler, mas sempre vou dar uma olhadinha nas resenhas deles, eles podem me abrir para outras publicações, é bem interessante. No caso da lista de 2021, só tinha lido , e amado, o maravilhoso "O avesso da pele", que acabou vencendo a competição, dos outros, apenas "Nem sinal de asas" me interessou. Portanto, eu quis muito ler essa ficção desde o ano passado, mas tinha longas leituras sobre figuras femininas em curso (biografia da Elza e Tereza Batista cansada de guerra),ele entrou para a lista de 2022 e não me arrependi mesmo.
Foi especial desde quando o comprei na loja da Editora Patuá, e sabia que ele ia demorar para chegar, mas estava imersa na heroína do Jorge Amado, não teve problema, o mais importante foi que aproveitei a promoção do dia do leitor, ganhei de presente o livro de contos "O sêmen do rinoceronte branco", de Cintia Kriemler, outro livro e a compra possibilitou que um livro fosse doado a uma biblioteca pública, muito bom !
O romance e os contos |
IMPRESSÕES DE LEITURA
Foi uma leitura rápida, mas bastante registrada em postagens nas redes sociais, em pelo menos quatro momentos , começando com primeiras impressões no dia 1 de fevereiro:
Dias depois, um recorte imagético do romance e meu interesse por outras linguagens no romance :
Dias depois, já ambientada com o contexto soturno da história de Anja, até me emocionei com o romance:
Enfim, o baque da proximidade do fim do romance e o contato com as questões que ele aborda, numa postagem sofrida:
Me trouxe tão forte sensações de Torto Arado. Dureza.
INTERPRETAÇÕES E IDENTIFICAÇÕES:
DULCE : Contando a história de Anja, filha de um Francisco, um homem negro que morre na infância da menina, e Dulce, uma mãe branca amorosa e difícil, com quem ela convive até a morte, que no romance parece ser sempre um ponto de questionamentos. Dulce ama a filha, depende dela (física e emocionalmente), mas nunca a aceitou como era. Nunca aceitou sua negritude. Quando bebê, tentou clarear a pele da menina, queimando sua pele com suco de limão e expondo-a ao sol, causando feridas rosadas no corpo todo, marcando-a para sempre como a preta manchada, como "rosas cálidas", e gerando culpa infinita pelo que fez com sua filha. Quanta dor! Mas também os "cabelos de Anja", crespos e negros eram para Dulce uma afronta, como percebemos nesse belo e terrível trecho lido . A minha sorte é que, não sei como, acabei construindo uma opinião própria sobre mim mesma, que pode passar como arrogância, mas eu gosto de mim, mesmo tendo ouvindo o contrário, toda a vida. Na leitura do romance, devo pontuar que Marcela Dantés até usa de um humor cinza em alguns momentos, mas não consegui rir muito, mesmo sabendo que é , é possível enfraquecer a importância desses ataques, transformar em piada, que se minha existência ofende alguns, sempre tem quem vai gostar de mim, mas até ter força para ressignificar isso o tempo, é preciso bastante tempo de prática. Uma coisa que cansa e muito.
A SOLIDÃO: Para uma mulher preta, convivendo toda vida com a inadequação, é claro que o tema solidão pontua toda a vida. Como já comentei, Anja é uma personagem ficcional, então na sua história permite-se alguns exageros. Anja não gosta de gente, não gosta dela mesma, na trama percebemos como seu isolamento social é detalhadamente construído durante a vida toda, a menina preta de cabelos crespos; a menina com manchas que não frequentou a escola na infância como todas as crianças, porque tinha que esconder o que ela era do resto do mundo para não ofendê-lo. Ninguém é obrigado a olhar a cara da rejeição o tempo todo, entendo tanto as tentativas de Anja de se isolar, o medo do abandono, a dúvida sobre se ela merece contato, como as outras pessoas. Deu certo. Ela simplesmente foi esquecida, em vida e depois de morta. Como eu? Muito triste isso. Se comecei achando a leitura de boa, confesso que fiquei bem mal quando cheguei no final do romance, me sentindo menos que nada, talvez como Anja tenha se sentido na vida e na morte. Tenso.
A MORTE : Para quem vive uma vida assim como a de Anja, a morte sempre foi uma saída, cansativo é viver. Eu sei disso porque eu sempre dizia que ia viver até os quarenta anos (não aguentaria mais do que isso) , estou resistindo à previsão. Mas muito porque eu tentei demais pertencer ao grupo VIDA, dei muitas bananas para a morte, mesmo que isso me causasse exaustão. Na pandemia, especialmente, o cansaço veio de forma física e emocional, ai voltei ao contato com pessoas na academia (diferentes de mim, mas de quem eu posso gostar, e elas também podem gostar de mim, essas sutilezas que oxigenam a vida, mas que Anja não viveu). Não quero a morte, não quero me acostumar com o cheiro de morte na vida, por isso reajo, reajo o quanto posso.
Enfim, não consigo mais escrever sobre esse livro, mas aos corajosos (especialmente às corajosas) , recomendo demais esse grande livro de Marcela Dantés,