sexta-feira, 17 de março de 2023

Tutaméia e "O local da cultura"

 
Meu exemplar

Este é um livro bem complexo, usei muito na pesquisa para escrever minha dissertação de mestrado em História "Mãos vazias e pássaros voando: memória, invenção e não-história em "Tutaméia: terceiras estórias", de João Guimarães Rosa : me ajudou a entender Guimarães Rosa e as personagens de Tutaméia no mestrado, mas sobretudo, a pensar o motivo daquilo tudo ser sempre um acolhimento para mim. Anos se passam e novos significados vão surgindo.

"a questão da identificação nunca é a afirmação de uma identidade pré-dada, nunca uma profecia autocumpridora - é sempre a produção de uma imagem de identidade e a transformação do sujeito só assumir aquela imagem. A demanda da identificação - isto é, ser para um Outro - implica a representação do sujeito na ordem diferenciadora da alteridade. A IDENTIFICAÇÃO É SEMPRE O RETORNO DE UMA IMAGEM DE IDENTIDADE QUE TRAZ A MARCA  DA FISSURA DO LUGAR DO OUTRO DE ONDE ELA VEM. Tanto para Fanon, quanto para Lacan, os momentos primários dessa repetição do eu residem do desejo do olhar e nós  limites da linguagem. A atmosfera de certa  incerteza que envolve o corpo atesta sua existência e o ameaça de desmembramento."[ (Grifo meu) BHABHA. Homi. O local da cultura. Trad. Myriam Àvila, Eliana Lourenço de Lima Reis, Glaucia Renate Gonçalves.Belo Horizonte: Editora UFMG.1998,  p.76-7.]

Nesse livro  sobre nômades, migrantes, refugiados, exilados, toda sorte de pessoas não cobertas pelos braços de uma pátria, a maioria  dessas pessoas se locomove para sobreviver. Trazendo isso para o trazendo para o contexto brasileiro,  eu analiso na página 131 da minha dissertação acima citada. que a estudiosa Maria Cristina Wissenbach expica que  a  mobilidade como forma de sobrevivência dos brasileiros  é uma das heranças deixadas pela escravidão, marcada pela mobilidade por toda a extensão do país, que em seguida marcou o comportamento dos habitantes das zonas rurais do Brasil, mostrando que a "sociedade escravocrata engendrou homens andarilhos." ( Wissenbach, M.C.."Da escravidão à liberdade: dimensões de uma privacidade possível". p. 57-60) 

Dito isso , lembramos que no livro Turaméia, que começa assim:

 "a estória não é história. A estória, em rigor, deve ser contra a História. A estória, às vezes, quer-se um pouco parecida à anedota" 

Temos "estórias/anedotas" com esse tipo de personagens : ciganos, vaqueiros, circenses: todo mundo mundo que se move pelo sertão pra sobreviver. Bhabha afirma que essa gente, não coberta pela grande narrativa oficial nacional (História),tem que escrever a sua de forma diferenciada, a sua estória. Foi muito importante essa leitura para mim.