domingo, 27 de março de 2016

Mario Prata escreve sobre Pedro Bloch

Achei uma crônica do Mário Prata sobre Pedro Bloch aqui.
Copio-a inteira abaixo:

"Criança diz cada uma… (Mário Prata)

Tempos atrás o jornalista e dramaturgo Pedro Bloch tinha uma página na revista Manchete com o título acima. Contava histórias engraçadas e inusitadas acontecidas com crianças que passavam pelo seu consultório.

Outro dia achei uma revista dos anos 60 e me diverti muito com o Bloch. E me lembrei de histórias recentes com filhos ou filhas de amigos meus que, tenho certeza, o velho jornalista não titubearia em manchetá-las.
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O protagonista da primeira delas é o Antonio, filho da velha amiga Maria Emília Bender, digníssima editora da Companhia das Letras e o grande italiano Lorenzo, ilustre professor de música na Universidade de São Paulo.
Antonio, seis ou sete anos, tinha o aniversário de um amigo, o Bruno, lá num daqueles bufês no Itaim. Festa das seis às nove da noite. O pai Lorenzo, conhecido por suas distrações cá no Brasil, ficou de levar o garoto ao tal bufê. Depois iria pegar a Emília, iriam a um cinema e voltariam para buscar o menino.
E assim foi feito. Lorenzo deixou Antonio no bufê, pegou a esposa e foram para o cinema. Nove da noite, conforme o combinado, foram buscar o pimpolho. Tocaram a companhia, veio o menino.
Já no carro:
– Tava boa a festa do Bruno, filho?
– A festa tava boa, só que você errou de bufê, pai! Era aniversário de uma menina que eu nunca tinha visto na vida. Mas foi legal. Ajudei até o mágico. O nome dela é Andréa.
A segunda história é da minha mais recente afilhada, a Maria Shirts, filha do Mateus e da Silvinha.
Deu-se que o pai da Silvia morreu, o velho e bom Lori. Maria, cinco anos, insistiu em ir ao velório ver o avô morto. Foi levada (nos dois sentidos).
No colo da mãe ficou ali alguns segundos, olhando para o avô. A sala cheia. De repente ela pergunta bem alto, como são, geralmente, as perguntas impertinentes:
– Mãe, como é que ele sabe que morreu?
Risadas filosóficas e generalizadas.
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Já disse que meu filho se chama Antonio. Um dia, ele tinha uns quatro anos, dei uma bronca nele sei lá porque e ele me xingou, feroz:
– Você é uma anta!!!
No que eu, sem perder a calma, perguntei:
– Ah, é? E quem é filho de anta, o que quê é?
Pensou dois segundos e me desarmou completamente:
– Filho de anta é… é… Antonio!
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Uma minha prima, hoje já casada e com dois filhos, quando tinha uns doze anos a mãe a chamou para um reservado:
– Hoje eu vou lhe ensinar o que é sexo.
A menina já fez cara feia. E a mãe começou lá pelo princípio com a história da maçã.
– Uma vez Adão e Eva estavam no paraíso e…
– Isso eu já sei. Pula.
– O homem tem uma sementinha e…
– Isso eu já sei. Vai mais para a frente.
– Bem, para nascer uma criança é preciso que…
– Pô, mãe, eu sei como é. Pode pular essa parte.
– Bem, a mulher ter um órgão chamado útero…
– Grande novidade, mãe.
– O espermatozóide tem umas substâncias…
– A porra.
– Isso. Escuta aqui, menina. O que é que você não sabe?
– O que é que a senhora ser saber? Pode perguntar, mãe. Pergunta!
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E tinha um garotinho que era infernal. Brigava todo dia na escola.
Um dia, no almoço, o pai, para testar seus conhecimentos bíblicos (ele estudava num colégio de padre), perguntou:
– Meu filho, me diz quem foi que jogou a pedra no Golias.
O garoto desatou a chorar.
– Tá vendo, mãe? Tudo eu. Tudo eu. Juro, pai, juro pelo que é de mais sagrado que eu nem conheço esse menino.
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E aquela religiosa mãe que pegou o filho e um amiguinho dentro do banheiro fazendo uma troca-troca? Só que, quando ela entrou, o filho queridinho e santo levava uma nítida desvantagem no ato. Mas o pequeno pecador não se abalou:
– Mas mãe, eu comi primeiro!!!
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Aninha já estava com dois anos. Loira, linda. Nunca tinha cortado o cabelo. Era amarelo-ouro e cacheado. Parecia um anjinho barroco.
Lá um dia, a mãe pega uma enorme tesoura e resolve dar um trato na cabeça da criança, pois as melenas já estavam nos ombros. Chama a menina, que chega ressabiada, olhando a cintilante tesoura.
– Mamãe vai cortar a cabelinho da Aninha.
Aninha olha para a tesoura, se apavora.
– Não quero, não quero, não quero!!!
– Não dói nada…
– Não quero!, já disse.
E sai correndo. A mãe sai correndo atrás. Com a tesoura na mão. A muito custo, consegue tirar a filha que estava debaixo da cama, chorando, temendo o pior. Consola a filha. Sentam-se na cama. Dá um tempo. A menina para de chorar. Mas não tira o olho da tesoura.
– Olha, meu amor, a mamãe promete cortar só dois dedinhos.
Aninha abre as duas mãos, já submissa, desata o choro, perguntando, olhando para a enorme tesoura e para a própria mãozinha:
– Quais deles, mãe?
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Claudia tinha seis anos. Seus pais se separaram. O pai arrumou outra namorada e a engravidou. Resolveu ter o filho. Foi contar para a Claudia, filha do primeiro casamento.
– Filhinha, o papi quer te contar uma novidade.
– Ahn…
– Você vai ganhar um irmãozinho.
– A mamãe tá grávida?
– Não, filhinha. É com a minha namorada.
Claudinha fica intrigada. Seis anos:
– Mas como é que você vai ter um filho com a Fernanda se vocês não são casados?
O pai se embaraça, sai pela tangente:
– Sabe o que é, filhinha, a cegonha errou a data, entende?
– Cegonha, papi? Cegonha?
– É, errou a data… Acontece…
– Papi, eu estou achando que você andou colocando uma sementinha na Fernanda!!!
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E o pai daquele garotinho, o Bruno, foi designado para trabalhar em Washington durante dois anos. Na viagem, a mãe foi explicando ao Bruno, quatro anos, como seria a vida nos Estados Unidos, que lá é tudo diferente, o povo, a comida e, principalmente, a língua.
Bruno ouvia tudo, no avião, muito curioso.
– Como que é a língua, mã?
– É outra língua, completamente diferente. Mas, com o tempo, você vai se acostumando.
Uma semana depois, a mãe vai buscar o filho na escola, depois do primeiro dia de aula. Bruno tinha passado o dia inteiro lá. Vem a professora americana, toda preocupada:
– Seu filho é um amor. Participou de todas as atividades. Só que não disse uma única palavra. Não abriu a boca nem na hora do lanche.
Voltando para a casa, a mãe pergunta ao filho:
– A professora me disse que você não abriu a boca nem para comer. Sem fome, filho? Estranhou a comida?
– E eu sou bobo? Se eu abro a boca eles trocam a minha língua…
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Laurinha era separada e tinha duas filhas. Conheceu Carlinhos que era igualmente separado e tinha quatro filhos. Só que três de um casamento e o caçula, Pedro, de uma outra relação.
Laurinha e Carlinhos se casaram e juntaram os seis, numa mesma casa. Passa o tempo, Laurinha se engravida de Carlinhos. Reúnem todos os filhos numa sala para dar a notícia.
Laurinha:
– Queremos avisar a todos vocês que eu e o pai de vocês vamos ter mais um filho.
No que o caçula Pedro, incontinenti:
– Ué, mas pode ter filho morando junto?"

In: https://marioprata.net/cronicas/crianca-diz-cada-uma/