terça-feira, 28 de outubro de 2014
domingo, 26 de outubro de 2014
Reencarnação de Buda?
Mais um trecho de "A casa das belas adormecidas", de Yasunari Kawabata:
"...não era difícil imaginar que esses velhos, do ponto de vista mundano, deviam ser vencedores na vida, e não fracassados. Contudo devem ter conseguido alguns êxitos cometendo o mal, e preservando seus sucessos a custo de males acumulados. Então, eles não teriam paz de espírito, pelo contrário, estariam se sentido derrotados e aterrorizados. Quando se deitavam em contato com a nudez da jovem mulher, os sentimentos que ressurgiam do fundo dos seus âmagos talvez não fossem apenas o medo da morte que se aproximava ou o lamento pela juventude perdida. Talvez houvesse neles também certo arrependimento pelos pecados cometidos, ou pela infelicidade do lar, coisa muito comum nas famílias dos vencedores. Decerto os vencedores não possuíam seu Buda, diante do qual pudessem ajoelhar-se e orar. Por mais que abraçassem fortemente a bela desnuda, derramassem lágrimas frias, se desmanchassem em choro convulsivo ou berrassem, a garota nada ficaria sabendo e jamais acordaria. Os velhotes não haveriam de se envergonhar,nem ficariam com seu orgulho ferido. Estavam inteiramente livres para se arrepender e lamentar à vontade. Consideradas dessa forma, seriam as ‘belas adormecidas’ uma espécie de Buda? E, além de tudo, um Buda vivo? A pele o cheiro jovem das garotas seriam, então, o perdão e o consolo desses pobre velhotes. “ Yasunari Kawabata - A casa das belas adormecidas, p.80-1PS. Direto da Wikipédia:"Buda (sânscrito-devanagari: बुद्ध, transliterado Buddha, que significa "Desperto"1 , do radical Budh-, "despertar") é um título dado na filosofia budista àqueles que despertaram plenamente para a verdadeira natureza dos fenômenos e se puseram a divulgar tal descoberta aos demais seres. "A verdadeira natureza dos fenômenos", aqui, quer dizer o entendimento de que todos os fenômenos são impermanentes, insatisfatórios e impessoais. Tornando-se consciente dessas características da realidade, seria possível viver de maneira plena, livre dos condicionamentos mentais que causam a insatisfação, o descontentamento, o sofrimento."
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quarta-feira, 22 de outubro de 2014
Um adeus a Nicolau Sevcenko, por Elias Thomé Saliba
Este texto e a imagem foram retirados da revista Carta na Escola e também está disponível neste link.
Um adeus a Nicolau Sevcenko
Irrepreensível na pesquisa e elegante no estilo, obra do historiador é um diálogo com a razão e com os sentimentos.
Por Elias Thomé Saliba
Em relação ao passado e à história experimentamos frequentemente duas atitudes diversas: aquela espécie de curiosidade intelectual, que nos leva a perguntar “como realmente ocorreram as coisas” ou uma inquietação nostálgica, que nos leva a acreditar que, como dizia Goethe, “o melhor da história é o entusiasmo que ela inspira”. A obra do historiador Nicolau Sevcenko (1952-2014) é destinada tanto àqueles leitores com inquietações intelectuais quanto aos nostálgicos pelo passado, ansiosos por reencontrar ou evocar suas próprias experiências intelectuais e afetivas.
Arthur Friedenreich, filho de imigrante alemão com uma ex-escrava, foi o maior artilheiro futebolístico brasileiro no ano de 1920. Naquele mesmo ano, Edu Chaves venceu o maior desafio aéreo sul-americano, percorrendo pela primeira vez a rota Buenos Aires-Rio de Janeiro num avião pintado com as cores da bandeira paulista. Qual a relação desses dois eventos esportivos com a história brasileira no início do século XX?
A revolução tecnológica, o crescimento explosivo das grandes metrópoles e as alterações no comportamento coletivo após a Primeira Guerra Mundial criaram um novo cenário para esses, os novos heróis. Não mais as celebridades da palavra e do pensamento reflexivo como Rui Barbosa ou o Barão do Rio Branco mas, sim, as estrelas da energia física, do esporte competitivo, do movimento e da velocidade.
Revelando uma original capacidade de articulação entre a cultura internacional e a brasileira, esta é uma, entre muitas, das mais importantes e originais contribuições de Sevcenko para a cultura brasileira, no livro Orfeu Extático na Metrópole, de 1982.
O fluxo intenso de mudanças em escala mundial, que se concentrou de fins do século XIX até meados do século XX, envolveu, de forma completa e rápida, todas as pessoas, alterando dramaticamente seus hábitos cotidianos, suas convicções, seus modos de percepção e até mesmo seus reflexos instintivos.
O mundo, após a Primeira Guerra (1914-1918), gerou uma inédita forma de mobilização coletiva: em lugar da razão e da palavra, o universo imprevisível da ação que inaugurava uma curiosa espécie de cidadania fundada na emotividade.
Músico prodigioso e sedutor, Orfeu, na mitologia grega, era louvado como celebrante dos rituais de exaltação e êxtase coletivo. Como historiador de rara sensibilidade, Sevcenko serve-se da metáfora de Orfeu como inspiração para traçar um vigoroso painel da história brasileira nos anos 1920.
Do balé ao jazz, do cubismo ao futurismo, dos mitos fascistas à patafísica de Alfred Jarry, o historiador consegue captar com surpreendente versatilidade a forma como os registros literários e artísticos sintonizavam essa fragmentação e esse desenraizamento generalizados.
No final do livro, a narrativa retorna à cena urbana paulista, desdobrando-se em três acontecimentos, nos quais se exercitaram aquela mobilização e ritualização coletivas: 1922, a cena dos mártires na Revolta do Forte de Copacabana; 1924, quando São Paulo, a bela capital cosmopolita, foi bombardeada após a invasão das tropas federais; e 1930, quando Getúlio Vargas vem a São Paulo e foi (surpreendentemente para o próprio Vargas) saudado por uma imensa multidão.
O historiador já trilhava aí a senda aberta pelo seu primeiro livro, Literatura como Missão, de 1983, um estudo pioneiro, no qual se dedica a rever a história cultural brasileira a partir das obras de Euclides da Cunha e Lima Barreto. Pioneiro na abordagem, porque a criação literária não mais é vista como mero reflexo mecânico da história, mas como um conjunto vivo de práticas e eventos. A literatura revela todo o seu potencial como documento, não apenas pelas referências esporádicas a episódios históricos ou pela beleza de suas criações estilísticas, mas como um universo complexo que incorpora a história em todos os seus aspectos.
Com olhares simultâneos – um na história social e outro na história da cultura –, Nicolau Sevcenko acaba desvelando o quanto a literatura da época transformou-se naquele “testemunho triste, porém sublime, dos homens que foram vencidos pelos fatos”.
Rejeitando a concepção tradicional de História, que a concebe como fluxo evolutivo, genético ou finalista, a abordagem de Sevcenko consistiu no esforço de olhar a realidade com desprendimento, considerando toda singularidade histórica como objeto de conhecimento de igual relevância. É o que notamos no livro A Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes, cuja primeira edição é de 1983, uma das primeiras e mais sólidas reconstruções desse capítulo pouco conhecido da história brasileira. O que não impediu o historiador de realizar uma interpretação engajada e crítica: a República brasileira pretendeu inaugurar uma sociedade liberal e democrática, mas acabou não só excluindo a maioria da população, como tratando-a com desmedida violência. Ou, na frase definitiva de Lima Barreto, a “república apenas democratizou a senzala”.
Já o livro A Corrida para o Século XXI catalisa os temas mais caros da obra do historiador: a avaliação dos custos irredimíveis da modernidade ao provocar o esgarçamento da solidariedade e anular as energias críticas do indivíduo. A aceleração da vida, que Sevcenko compara ao loop de uma montanha-russa, altera radicalmente o quadro de valores da sociedade.
Publicado em 2001, o livro ainda conserva uma estranha atualidade, pois antecipa os imperceptíveis efeitos da comunicação digital. Nas grandes metrópoles, todos vieram de algum lugar, portanto, ninguém conhece ninguém, são tantos e estão tão ocupados que a forma prática de conhecer os outros é pela maneira com que se vestem, pelos objetos simbólicos que exibem, pelo seu comportamento. A comunicação básica entre as pessoas é toda ela externa e baseada em símbolos exteriores. Como esses códigos mudam com extrema rapidez, ingressamos, sem o saber, no efêmero império das modas. Toda a comunicação humana não se concentra mais nas qualidades humanas da pessoa, mas nas mercadorias que ela ostenta ou nos objetos que possui.
Irrepreensível na pesquisa e elegante no estilo, toda a obra de Nicolau Sevcenko, tristemente inconclusa em face do seu precoce desaparecimento, é um diálogo com a nossa razão e com os nossos sentimentos. Como sabem as centenas de alunos de seus cursos e palestras, ele sempre atraiu e sempre atrairá muitos leitores porque conseguiu o raro feito de captar aquele ponto da vida humana, onde se cruzam experiências vividas com expectativas de experiências futuras. Aquela encruzilhada da vida que constitui o maior prêmio à nossa memória e na qual passado e presente se projetam no futuro. Ou, como dizia T.S. Eliot, aquela esquina quase desconhecida, onde “tempo presente e tempo passado são ambos presentes no tempo futuro”.
Publicado na edição 91, de outubro de 2014
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domingo, 19 de outubro de 2014
As fantasias femininas e os homens...
"...um outro episódio, talvez menos importante, foi aquele em que Eguchi,ainda moço, ouvira em confidência a esposa de um dos diretores de certa empresa de destaque, uma mulher de meia-idade, uma mulher que detinha fama de 'esposa exemplar', com um vasto círculo de relações.
- A noite, antes de pegar no sono, eu fecho os olhos e tento contar os homens pelos quais gostaria de ser beijada. Eu os conto dobrando os dedos. É tão divertido! E se não consigo contar dez, sinto uma tristeza. (...) falara apenas em contar, mas ele desconfiava que, enquanto contava, ela evocava o corpo e o rosto desses homens, remexendo sua fantasia e demorando um tempo considerável para contar até dez. Ao pensar nisso, o perfume de apelo afrodisíaco dessa mulher que já passara um pouco de sua plenitude de repente atingiu com força o olfato de Eguchi. O que ela evocaria a respeito dele antes de adormecer, como um dos homens por quem desejaria ser beijada, era sua liberdade secreta e não dizia respeito a Eguchi que, não podia evitar isso e se defender, nem podia reclamar. Mas parecia-lhe que, sem saber, tornara-se um brinquedo na imaginação daquela mulher de meia - idade, e isso lhe provocou a sensação de indecência. Mesmo assim, até agora não conseguia esquecer as palavras dela. " Yasunari Kawabata. "A casa das belas adormecidas"
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sábado, 18 de outubro de 2014
O apressado
Gente, hoje eu passei quase o dia todo no SESC Pompéia estudando... fico na sala de estudos lá de cima, sozinha, lendo, pensando e, claro, filmando o entorno rsrs
Hoje um rapaz barbudinho me chamou a atenção porque entrou correndo com uma mochila, disparado mesmo e subiu até onde eu estava, mas na parte da frente a mim.eu fiquei sentada em um canto e ele foi para o outro extremo, até longe, mas como não havia nada nem ninguém entre nós, pude observar melhor. Logo percebi que ele ia trabalhar, por isso correu tanto, que usava óculos e era bastante agitado. Uma hora ele me surpreendeu mesmo, porque simplesmente tirou a blusa que usava (nada demais, claro), mas eu não esperava que ele fizesse isso naquela hora, entende? Não na frente dos meus olhos de voyeur... foi mágico! Mas logo ele colocou uma camiseta, um uniforme (ele deve ser monitor da exposição que estava acontecendo ou algo assim). Então ele pegou na mochila uma tangerina e começou a descascar e comer, vagarosamente, como se oferecendo a si mesmo aquele simples prazer. E me oferecendo também. Ai chegaram os outros iguais a ele, meninos e meninas com o mesmo uniforme, então ele sumiu na multidão de uniformizados, tão rápido quanto chegou, como algumas coisas na vida da gente.
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sexta-feira, 17 de outubro de 2014
Caminhos da memória
"... mesmo que falasse de passado muito distante, talvez, no ser humano, a memória e reminiscências não pudessem ser definidas como próximas ou distantes unicamente por ser sua data antiga ou recente. Pode acontecer que, mais do que o dia de ontem, os acontecimentos da infância, sessenta anos atrás, tenham ficado guardados na memória e fossem recordados de uma forma mais nítida e mais viva. Isso não acontece com mais frequência na velhice? Além disso, não haveria casos em que os acontecimentos da infância contribuiriam para formar o caráter e dar direcionamento à vida de uma pessoa?.... " Yasunari Kawabata " A casa das belas adormecidas", p. 25
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quinta-feira, 16 de outubro de 2014
Carta a Chico Sá - Marilene Felinto
Carta a Chico Sá
Ou carta à presidenta Dilma Rousseff
MARILENE FELINTO
São paulo, 15/10/2014
Escrever para a Folha de S. Paulo não enobrece ninguém !
Pelo contrário, Chico. Mancha o nome da pessoa. Agora que você se demitiu desse jornal, por não poder expor sua opção política pela candidatura Dilma, vamos conversar. Aconteceu comigo também em 2001, quando da primeira eleição do Lula à presidência.
Quanto tempo faz? Eu também era o que se chamava de “colunista” de opinião do caderno Cotidiano. Quanto tempo faz? Mas, veja: a história não se repete agora nem como tragédia nem como farsa. A história se repete como descaramento, como safadeza mesmo, hipocrisia dessa mídia golpista.
Aconteceu também, há poucos anos, com Maria Rita Kehl, não foi? Se não me engano, no jornal O Estado de S. Paulo. Os dois “veículos de comunicação” pactuam de novo o complô censor e golpista. Lá no meu caso, em 2001, a coisa teve menos repercussão porque, afinal, não sou tão importante quanto você e Maria Rita. Além do que, você também é da TV, não? Um cara pop. Aparece muito mais, e tal. E Rita é uma personalidade intelectual do mais alto nível (além de loira, o que, já de cara, dá muito mais repercussão aqui no Sudeste racista!).
Olha, eu até queria que essa carta tivesse um pouco de repercussão (queria que chegasse na presidenta!). Mas vai ser mínima, cara. Talvez circule um pouco pelas redes sociais, minimamente, porque eu não me publico mais nem me divulgo. Então, não tenho repercussão nenhuma! E, agora, que não temos mais, nem você nem eu, a tribuna de um jornal tipo FSP, imagine, quem vai ler essa carta? (Gargalhe!). Kkkkkkkkkkkkk! Quem se importa, afinal, com essa “mer...” dessa Folha de S. Paulo? Quem precisa dessa “bos...” pra escrever ou publicar algo? Peço desculpas pelos palavrões, mas eu não aguento não. Como jornalismo é m mundo baixo, do qual me lembro com enjoo ainda hoje, evoca palavrões na minha fala.
Cara, nem sei porque escrevo pra você essa carta, se mal nos conhecemos. Falei com você umas três vezes na vida, talvez. E isso não é uma carta de solidariedade, não. Ninguém precisa de solidariedade porque deixou de escrever nesse jornal.
Escrevo talvez porque me deu uma enorme vontade de gargalhar quando soube que o caso se passa agora também com você. Gargalhar por causa da importância que ainda se dá a esse jornal e a outros, e à Rede Globo e às redes todas da mídia golpista. Cara, é muita gente querendo ainda escrever na Folha, aparecer na Folha, no Globo, na Globo, na pqp! É de intelectual a artista e político! É de secretário de governo a ministro, a prefeito e a assessor disso e daquilo! É por essas e outras que essa cambada de golpistas age como se fossem eles os donos do mundo, impunes que se sentem, protegidos pelo interesse econômico que representam!
Chamei esse texto aqui de “ou carta à presidenta Dilma” porque minha vontade era fazer chegar à presidenta um recado torto, e ao Lula também: gente, entendam de uma vez por todas que é preciso regular essa mídia brasileira! Que já demorou demais, que é pura covardia não peitar essa cambada de irresponsáveis. Demorou, presidenta! Presidenta Dilma Rousseff, é preciso garantir as liberdades comunicativas no país, é preciso pluralismo, democratização da mídia, liberdade de expressão! São 12 anos de acovardamento do PT! E eu sou petista, sim, desde sempre, desde então. Lula e você, Dilma, são ídolos meus! E olha que eu quase não tenho ídolos! Só Graciliano Ramos depois de vocês! Ou antes, melhor dizendo!
Chico. Escrever pra Folha de São Paulo não enobrece ninguém. Não traz renome. Pelo contrário: a pessoa chafurda ali na lama daquelas vaidades, das pequenas trapaças, das intrigas internas, das grandes e perigosas manipulações da informação. Aquilo é um mundo baixo, do qual me lembro com enjoo ainda hoje. E carrego pecha ainda maior: de ter sido amiga do dono, um erro de cálculo provocado pela cegueira e pela vaidade da juventude. Sempre fui péssima nas matemáticas da vida. Sempre só soube direito português, que não serve pra nada, afinal.
Chico. Em 2001, me chamaram por telefone lá daquele jornal, para dizer também que eu tinha feito “proselitismo político” pró Lula, e que o jornal, neutro (Gargalhe! Que fazia campanha aberta pro Serra), não aceitava aquilo. Gargalhemos novamente. E que, portanto, tudo o que eu escrevesse dali por diante passaria, antes de ser publicado, pelo escrutínio da “direção de redação”. E que, além disso, meu texto sairia apenas de 15 em 15 dias e não mais semanalmente como era. E que, portanto, meu salário também seria cortado pela metade!
Fiquei pasma! Pela ousadia da tal “direção de redação” chegar para uma pessoa e dizer uma barbárie dessa! E impor uma censura assim, descaradamente, presidenta! Censura é isto! Cadê a liberdade de expressão que eles exigem da senhora? Arrumei a trouxa e fui-me embora daquela “mer...”, com perdão da palavra.
Do lado de lá, a “direção de redação” também pasmou quando percebeu que eu, de fato, decidira largar aquilo de uma vez por todas depois de 12 anos! Devem ter achado que eu, por ser negra e pobre, dependente daqueles honorários de “mer...” que me pagavam, cederia a tamanha humilhação! Tentaram reverter, tentaram me convencer a ficar, dizendo que voltavam atrás nas condições, nos salários, talvez na “p...” da censura.
Não cedi não. E rompi com aquela gente. E prefiro hoje morrer de fome a ter que escrever uma linha que seja de autoria minha pra essa mídia golpista. Chico, certamente hoje você é uma pessoa melhor do que ontem. Transcrevo aqui o texto da “coluna” que foi o estopim do meu pedido de demissão naquela época (com o Lula já eleito, ao menos isso, graças a Deus, que eles não engolem até hoje!). Dedico de novo o texto ao ex-presidente Lula, a minha candidata à reeleição, Dilma Rousseff, e... a um terceiro ídolo, que eu lembrei que tenho: Marilena Chaui. A você, agradeço a oportunidade de tocar no assunto, com palavrão e tudo, como eu queria. Um abraço.
Marilene Felinto, 56, é escritora e tradutora, autora do romance AS Mulheres de Tijucopapo (1982), pelo qual recebeu o Prêmio Jabuti na categoria Revelação de Autor, entre outros livros. Trabalhou na imprensa de 1989 a 2006, na Folha de S. Paulo, Revista Caros Amigos, entre outras publicações.
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É proibido comemorar – Marilene Felinto
Texto escrito em 29/10/2002, quando da primeira eleição do Lula à presidência da República. Publicado na Folha de S. Paulo).
É PROIBIDO comemorar, mas eu vou comemorar: por minha tia Irene, pelo menos, que também perdeu parte de um dedo na máquina da fábrica de tecidos em Paulista (Grande Recife), nos anos 50. Paulista, Caetés, Buíque, está tudo ali, naquelas vilas perdidas do interior do país, onde tudo foi sempre seco, matuto, duro e difícil. Buíque (PE), vilarejo muito perto de Caetés (onde nasceu o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva), é onde o escritor Graciliano Ramos passou parte de sua infância, ele que nasceu em 1892 em Quebrangulo (Alagoas), no mesmo 27 de outubro que Lula.
E ele, Graciliano, que escreveu um romance chamado "Caetés" (1933) e outro chamado "São Bernardo" (1934), nome da cidade São Bernardo do Campo, onde o operário virou líder sindical. Está tudo ali. Está tudo aí, fazendo história universal, quase irreal, quase fictícia de tão surpreendente.
É proibido comemorar, mas eu vou comemorar: comemorar não uma pessoa, mas uma idéia, um símbolo. O povo elegeu sua própria cara mais profunda pela primeira vez. Isso é bom para a auto-estima do povo. Quem já experimentou o preconceito sabe _a discriminação por origem social, tão típica da estrutura da sociedade brasileira. É mais do que saudável que o poder mude de mãos: especialmente num país sempre dominado por uma elite sem nenhuma simpatia humana, de uma perversidade e de um egoísmo sem par no mundo.
É proibido comemorar, mas eu vou comemorar: ao menos pela menina "Te", de quatro anos de idade, que conheci num casebre de taipa em Cruzeiro do Nordeste (município de Sertânia, a 350 km de Recife) em 2001. "Te" era o apelido dela que não tinha nome ainda, não tinha certidão de nascimento, não tinha nacionalidade, não tinha país, não existia para o Brasil e seu censo. Não merecia nenhuma simpatia humana da parte desses governantes insensíveis, eruditos urbanos empertigados ou usineiros exploradores. "Te" estava doente, eu acho. Não parava de chorar quando a conheci, a não-sei-que-nascimento na fila de uma carrada de sete filhos de um casal analfabeto, que passava o mês todo com os R$ 80 que o chefe da família então ganhava carregando estrume para fazendeiros da região. "Te" era apenas esse monossílabo, seminua, suja, talvez faminta chorando no meio da casa.
Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU: "Artigo 21 - 1. Toda pessoa tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos."
É proibido comemorar, mas eu vou comemorar: por um raio de esperança ao menos para essas tragédias nordestinas, a de "Te", a de Lula, a de Irene (que morreu alcoólatra e empregada doméstica a um salário mínimo mensal), a minha mesma. Se eu fosse dez anos mais velha, talvez tivesse vindo para São Paulo sacolejando na mesma boléia de um pau-de-arara. Vim 15 anos depois de Lula, mas de ônibus, da viação São Geraldo ou Itapemirim, não me lembro. Tive mais sorte, vim na poltrona já estofada do ônibus, numa viagem que durou quatro dias, ao invés de 13. Tive mais sorte, fiz curso superior.
É proibido comemorar porque jornalistas não comemoram, criticam. Mas cada coisa a seu tempo. Não faltarão críticas. Mais do que isso: há fascistas e neo-fascistas à espreita país afora. Farão de tudo para aterrorizar e destruir.
No momento, comemoro, faço do português o inglês (para o mundo entender) que me ensinaram por sorte na universidade _e digo como a atriz Marilyn Monroe disse ao presidente Kennedy, num dia de aniversário: "Happy birthday, Mr. President!", pelos mais de 50 milhões de votos.
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eleições 2014,
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Xico Sá
terça-feira, 14 de outubro de 2014
Enfim, Xico Sá "explica" o caso da saída da Folha, como sempre de forma sensacional!
NOTA AOS LEITORES E AMIGOS
Caríssimos amigos & leitores, pretendia nem mais falar desse assunto, mas devido à forma como se alastrou –rizomáticos riachos e riachinhos delleuzianos & gonzaguianos em busca do velho Chico em anos de bom inverno no Navio e no Pajeú-, creio que devo alguma satisfação na praça, além dos “pinduras” morais e existenciais de sempre. Valha-me meu bom Deus, viver é dívida, canelada e dividida de bola.
Como só os galãs vencem por nocaute, procurarei, mal-diagramado por natureza que sou, triunfar nessa luta por pontos, minando, nas cordas do ringue ideológico, vosso juízo emprenhado pelas redes sociais. Vamos lá;
1) Não há herói nenhum nesse episódio. O máximo que chego é a anti-herói macunaímico ou ao João Grilo do cordel teatralizado pelo bravo Suassuna. E olhe lá, e olhe lá, amiga Karina Buhr, eu só quero tocar meu tamborzinho cósmico.
2) Como já informaram alguns sites, pedi demissão do meu posto de colunista (do caderno de Esportes) da Folha, jornal com o qual mantenho uma velha relação de duas décadas, entre idas e vindas, furos, erramos assumidos variados, pés-na-bunda de ambas as partes, grandes momentos, crises profissionais e esticadas D.Rs (discussões de relação) gutenberguianas.
3) Eis que na sexta-feira, 10/10, mandei a coluna em cima da hora, só para variar. Nas linhas tortas -o velho Graça me entenderia nessa hora, embora corrigisse a minha escrita adjetivosa-, tratava do Fla-Flu eleitoral, defendia que os jornais saíssem do armário –como as publicações americanas- e tecia queixas à cobertura desequilibrada da Folha e da imprensa no geral. E repare que a Folha, senhoras e senhores, é bem melhor em se comparando aos outros jornalões, vide grande revelação do aeroporto privado de Aécio e o mínimo questionamento do choque de gestão nas Gerais, esse fetiche econômico insustentável até para a Velhinha de Taubaté do meu amigo Veríssimo.
Bem, como eu ia falando, defendia na coluna que os jornais assumissem suas explícitas posições, donde encerrei o desabafo gonzo-lírico-político usando o direito de declarar minha preferência pela Dilma.
4) A direção do jornal entendeu que o texto feria um dos princípios da casa; o de não permitir fazer proselitismo político ou eleitoral em favor de nenhum candidato. Sugeriu, civilizadamente, que alterasse o texto. Prosa vai, prosa vem. Refleti e mantive a escrita. Argumentei que outros colunistas, de alguma forma, feriam o princípio interno, no que me acho prenhe de razão, né não? Ou seriam textos inocentes?
5) Finquei pé, mais honra do que birra, pantins e queixumes. A direção do jornal sugeriu que eu poderia publicar, porém na página 3., na segunda-feira. É a página de “tendências & debates”, na qual convidados, não gente da casa, manifesta livremente suas opiniões, inclusive de voto. Migrar para um espaço de “forasteiros” não me fez a cabeça, não achei que fosse a solução para o impasse. Qual o faroeste dos irmãos Cohen, achei que também teria o direito de ser, pelo menos um dublê, à esquerda, dos caras que botam para quebrar nas suas colunas da Folha. O faroeste moderno se chama “Onde os fracos não têm vez”.
6) Daí o meu pedido de desligamento como colunista do jornal, função que exercia na figura de PJ (pessoa jurídica mediante nota fiscal), não como funcionário contratado pelo grupo Folha.
7) No dia seguinte, não mais na condição de colunista, soltei uma saraivada de posts de escárnio e maldizer nas redes sociais, em um espasmo de ira & lirismo que defini, no twitter, como um manifesto gonzo-político livremente inspirado na minha atual releitura de Hunter Thompson e na memória do genial Nezinho do Jegue, personagem de “O Bem Amado”, do baiano Dias Gomes, que, uma vez alcoolizado, insultava a humanidade. Eis um direito divino, dionisíaco, um direito dos malucos, além muito além de todas as Constituições, como diria o gênio-mor Antonin Artaud e seu duplo.
8) Um dos posts dessa performance dionisíaco-tuiteira-brizolista, meu caro e amado Zé Celso, vociferava também contra os petistas, considerando que não desejava o (inevitável e irrefreável) uso da minha opinião como propaganda oficial. “Phueda-se o PT”, com PH e tudo, dizia este monstruoso cronista. Relembrava que o governo do PT e de todas as siglas da sacanagem alfabética têm que ser investigados sim. Meu reclamo é/era pontual; por que só os caras de um lado são responsabilizados pela história universal da infâmia e ninguém publica, para valer, o “rebuceteio” –para usar um clássico da pornochanchada nacional- do outro lado da suruba pornô-política, querido Reinaldo Moraes?
É muito desequilíbrio. É praticamente jornalismo de campanha. Não cobertura.
9) O pedido de demissão. Finalmente explico. Mais demorado do que a declaração de voto da queridíssima Marina, que infelizmente esqueceu a nova política na qual eu caí feito um patinho de primeiro turno na lagoa Rodrigo de Freitas.
A demissão. Suspense à Hitchcock.
Vixe. Volver a los 17, como cantaria Mercedes Sosa, a quem escuto ao fundo dessa escrita, alternando com Nação Zumbi, óbvio. Volver à minha pobre coluneta do caderno de Esporte da Folha. Defendi meu patrimônio imaterial único e universal, quase um sufrágio, meu direito, daí o finca-pé que resultou no meu pedido de afastamento do universo folhístico.
Ingenuidade achar que, em período de extremada passionalidade e justíssima crítica ao desequilíbrio na cobertura da “imprensa burguesa” (outro termo vintage comuno-anarquista usado e abusado nos meus posts com toda sinceridade desse mundo) neguinho não fosse compartilhar essa bagunça barroca toda, agora falo com meu irmão Wally Salomão, para o que der e viesse. Rede social é como aquela parada bíblica do olhai os lírios do campo, eles não tecem, eles não fiam...
10) Enfim, o resto é barulho, mas creio que narrei, com alguma vantagem pessoal comum aos narradores de primeira pessoa, a onda toda –ai de mim, amigo Walter Benjamin! Donde reafirmo, não há heroísmo algum além de uma refrega dramática de um velho cronista, talvez um pouco ultrapassado e dionisíaco, com la prensa burguesa, reafirmo o clichê da velha bossa, afinal de contas renascemos sempre num Cocoon metafísico de águas imaginárias e milagrosas.
Como diria, agora meu brother Arnaldo Baptista, quero voltar pra Cantareira.
Deus abençoe os velhos e as crianças, eis meu dizer sobre essa confusão toda que eu achei tão normal como falar do seu candidato no boteco da esquina, era assim na vida antigamente.
Por que isso virou tão chato e eu não posso?
Justo num texto tão babaca, defendendo uma candidatura que só consegue ser mil vezes melhor do que Aécio mesmo. Afinal de contas essa peleja é um W.O. da porra. Ou deveria ser para quem tivesse juízo.
Ah, cadê a dialética do esclarecimento das espumas flutuantes dos mares de cerveja, viejo Wander Wildner?
Aliás, por que eu não poderia escrever aquele texto babaca, aliás eu tenho sido um péssimo cronista, tanto de amor como de futebol, preciso me reciclar, reler todo o Machado de Assis, ele me ensina, também relatei isso aos meninos folhais.
Eu careço ouvir todo Jards Macalé, meu ídolo. Esse episódio cá Folha, aliás, não é político, é ridículo se pensamos na grandeza da vida. As folhas das folhas da relva, menino Holden, é o que doravante me interessa como razão de viver debaixo de uma árvore ou sob o guarda-chuva moral dos caras que viram polícia do texto sem saber que uma besteirinha de nada pode virar idiotice e totalitarismo.
Agora voltei de vez para “O Apanhador...”, mas, juro, me perdõe, pela confusão toda com o jornal, com as redes sociais e qualquer coisa. Como dizia Holden, “gosto de Jesus e tudo, os apóstolos é que são uns chatos.”
Beijos, Xico Sá, Copacabana, primavera do ano da graça de 2014
Como só os galãs vencem por nocaute, procurarei, mal-diagramado por natureza que sou, triunfar nessa luta por pontos, minando, nas cordas do ringue ideológico, vosso juízo emprenhado pelas redes sociais. Vamos lá;
1) Não há herói nenhum nesse episódio. O máximo que chego é a anti-herói macunaímico ou ao João Grilo do cordel teatralizado pelo bravo Suassuna. E olhe lá, e olhe lá, amiga Karina Buhr, eu só quero tocar meu tamborzinho cósmico.
2) Como já informaram alguns sites, pedi demissão do meu posto de colunista (do caderno de Esportes) da Folha, jornal com o qual mantenho uma velha relação de duas décadas, entre idas e vindas, furos, erramos assumidos variados, pés-na-bunda de ambas as partes, grandes momentos, crises profissionais e esticadas D.Rs (discussões de relação) gutenberguianas.
3) Eis que na sexta-feira, 10/10, mandei a coluna em cima da hora, só para variar. Nas linhas tortas -o velho Graça me entenderia nessa hora, embora corrigisse a minha escrita adjetivosa-, tratava do Fla-Flu eleitoral, defendia que os jornais saíssem do armário –como as publicações americanas- e tecia queixas à cobertura desequilibrada da Folha e da imprensa no geral. E repare que a Folha, senhoras e senhores, é bem melhor em se comparando aos outros jornalões, vide grande revelação do aeroporto privado de Aécio e o mínimo questionamento do choque de gestão nas Gerais, esse fetiche econômico insustentável até para a Velhinha de Taubaté do meu amigo Veríssimo.
Bem, como eu ia falando, defendia na coluna que os jornais assumissem suas explícitas posições, donde encerrei o desabafo gonzo-lírico-político usando o direito de declarar minha preferência pela Dilma.
4) A direção do jornal entendeu que o texto feria um dos princípios da casa; o de não permitir fazer proselitismo político ou eleitoral em favor de nenhum candidato. Sugeriu, civilizadamente, que alterasse o texto. Prosa vai, prosa vem. Refleti e mantive a escrita. Argumentei que outros colunistas, de alguma forma, feriam o princípio interno, no que me acho prenhe de razão, né não? Ou seriam textos inocentes?
5) Finquei pé, mais honra do que birra, pantins e queixumes. A direção do jornal sugeriu que eu poderia publicar, porém na página 3., na segunda-feira. É a página de “tendências & debates”, na qual convidados, não gente da casa, manifesta livremente suas opiniões, inclusive de voto. Migrar para um espaço de “forasteiros” não me fez a cabeça, não achei que fosse a solução para o impasse. Qual o faroeste dos irmãos Cohen, achei que também teria o direito de ser, pelo menos um dublê, à esquerda, dos caras que botam para quebrar nas suas colunas da Folha. O faroeste moderno se chama “Onde os fracos não têm vez”.
6) Daí o meu pedido de desligamento como colunista do jornal, função que exercia na figura de PJ (pessoa jurídica mediante nota fiscal), não como funcionário contratado pelo grupo Folha.
7) No dia seguinte, não mais na condição de colunista, soltei uma saraivada de posts de escárnio e maldizer nas redes sociais, em um espasmo de ira & lirismo que defini, no twitter, como um manifesto gonzo-político livremente inspirado na minha atual releitura de Hunter Thompson e na memória do genial Nezinho do Jegue, personagem de “O Bem Amado”, do baiano Dias Gomes, que, uma vez alcoolizado, insultava a humanidade. Eis um direito divino, dionisíaco, um direito dos malucos, além muito além de todas as Constituições, como diria o gênio-mor Antonin Artaud e seu duplo.
8) Um dos posts dessa performance dionisíaco-tuiteira-brizolista, meu caro e amado Zé Celso, vociferava também contra os petistas, considerando que não desejava o (inevitável e irrefreável) uso da minha opinião como propaganda oficial. “Phueda-se o PT”, com PH e tudo, dizia este monstruoso cronista. Relembrava que o governo do PT e de todas as siglas da sacanagem alfabética têm que ser investigados sim. Meu reclamo é/era pontual; por que só os caras de um lado são responsabilizados pela história universal da infâmia e ninguém publica, para valer, o “rebuceteio” –para usar um clássico da pornochanchada nacional- do outro lado da suruba pornô-política, querido Reinaldo Moraes?
É muito desequilíbrio. É praticamente jornalismo de campanha. Não cobertura.
9) O pedido de demissão. Finalmente explico. Mais demorado do que a declaração de voto da queridíssima Marina, que infelizmente esqueceu a nova política na qual eu caí feito um patinho de primeiro turno na lagoa Rodrigo de Freitas.
A demissão. Suspense à Hitchcock.
Vixe. Volver a los 17, como cantaria Mercedes Sosa, a quem escuto ao fundo dessa escrita, alternando com Nação Zumbi, óbvio. Volver à minha pobre coluneta do caderno de Esporte da Folha. Defendi meu patrimônio imaterial único e universal, quase um sufrágio, meu direito, daí o finca-pé que resultou no meu pedido de afastamento do universo folhístico.
Ingenuidade achar que, em período de extremada passionalidade e justíssima crítica ao desequilíbrio na cobertura da “imprensa burguesa” (outro termo vintage comuno-anarquista usado e abusado nos meus posts com toda sinceridade desse mundo) neguinho não fosse compartilhar essa bagunça barroca toda, agora falo com meu irmão Wally Salomão, para o que der e viesse. Rede social é como aquela parada bíblica do olhai os lírios do campo, eles não tecem, eles não fiam...
10) Enfim, o resto é barulho, mas creio que narrei, com alguma vantagem pessoal comum aos narradores de primeira pessoa, a onda toda –ai de mim, amigo Walter Benjamin! Donde reafirmo, não há heroísmo algum além de uma refrega dramática de um velho cronista, talvez um pouco ultrapassado e dionisíaco, com la prensa burguesa, reafirmo o clichê da velha bossa, afinal de contas renascemos sempre num Cocoon metafísico de águas imaginárias e milagrosas.
Como diria, agora meu brother Arnaldo Baptista, quero voltar pra Cantareira.
Deus abençoe os velhos e as crianças, eis meu dizer sobre essa confusão toda que eu achei tão normal como falar do seu candidato no boteco da esquina, era assim na vida antigamente.
Por que isso virou tão chato e eu não posso?
Justo num texto tão babaca, defendendo uma candidatura que só consegue ser mil vezes melhor do que Aécio mesmo. Afinal de contas essa peleja é um W.O. da porra. Ou deveria ser para quem tivesse juízo.
Ah, cadê a dialética do esclarecimento das espumas flutuantes dos mares de cerveja, viejo Wander Wildner?
Aliás, por que eu não poderia escrever aquele texto babaca, aliás eu tenho sido um péssimo cronista, tanto de amor como de futebol, preciso me reciclar, reler todo o Machado de Assis, ele me ensina, também relatei isso aos meninos folhais.
Eu careço ouvir todo Jards Macalé, meu ídolo. Esse episódio cá Folha, aliás, não é político, é ridículo se pensamos na grandeza da vida. As folhas das folhas da relva, menino Holden, é o que doravante me interessa como razão de viver debaixo de uma árvore ou sob o guarda-chuva moral dos caras que viram polícia do texto sem saber que uma besteirinha de nada pode virar idiotice e totalitarismo.
Agora voltei de vez para “O Apanhador...”, mas, juro, me perdõe, pela confusão toda com o jornal, com as redes sociais e qualquer coisa. Como dizia Holden, “gosto de Jesus e tudo, os apóstolos é que são uns chatos.”
Beijos, Xico Sá, Copacabana, primavera do ano da graça de 2014
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Xico Sá
segunda-feira, 13 de outubro de 2014
Pequeno Cidadão apresenta ao Hadad a música em apoio às ciclovias ...
Está no site da prefeitura.
Pequeno Cidadão apresentando ao prefeito a música sobre as ciclovias, lembrando que elas são um espaço onde as crianças também podem estar,participar e se APROPRIAR DA CIDADE (AS CRIANÇAS!), super legítimo esse depoimento... <3 font="">3>
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domingo, 12 de outubro de 2014
Ver:Amor, de novo, de novo ...
Aqui na minha cabeceira eu estou alternando a leitura de dois livros ótimos de literatura, o japonês "A Casa das belas adormecidas" e o final de "Um tal Lucas" do Cortázar... mas hoje não peguei nenhum dos dois para continuar a leitura, precisei voltar ao "Ver:Amor"... não sei o que eu tenho com esse livro, como ele me atrai! E olha que eu comecei a ler com má vontade, "mais um livro sobre o holocausto", e fui totalmente surpreendida, me faz pensar tanto em coisas sobre História, sobre a vida e sobre a necessidade /função de narrá-la. Abri aleatoriamente :
"Durante anos, depois que meu avô Anshel desapareceu, continuei a cantarolar internamente a melodia da história que ele contou para o alemão. Duas ou três vezes antes de eu viajar para a Polônia, sentei-me, escrevi, fracassei. Lentamente acumulou-se em meu interior um punhado complexo de raiva de mim mesmo e saudade dele, do velho que há anos circula numa história trancada, um navio fantasma que é rejeitado em todos os portos, e eu o único que posso salvá-lo e redimir a história, não sei e não ouso.Comecei a procurar as obras do meu avô. Remexi em arquivos antigos, entoquei-me em bibliotecas empoeiradas de kibutzim remotos, li jornais velhos que se esfarelavam ao contato de minhas mãos; eram aos meus olhos como afrescos antigos nas paredes da cavernas, que se desintegravam assim que o facho das lanternas de pesquisadores pousavam sobre eles." p. 117
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'Venho de tempos antigos' Hilda Hilst
Venho de Tempos Antigos
Hilda Hilst
Deus pode ser a grande noite escura
E de sobremesa
O flambante sorvete de cereja.
Deus: Uma superfície de gelo ancorada no riso.
Venho de tempos antigos. Nomes extensos:
Vaz Cardoso, Almeida Prado
Dubayelle Hilst... eventos.
Venho de tuas raízes, sopros de ti.
E amo-te lassa agora, sangue, vinho
Taças irreais corroídas de tempo.
Amo-te como se houvesse o mais e o descaminho.
Como se pisássemos em avencas
E elas gritassem, vítimas de nós dois:
Intemporais, veementes.
Amo-te mínima como quem quer MAIS
Como quem tudo adivinha:
Lobo, lua, raposa e ancestrais.
Dize de mim: És minha.
Texto extraído do encarte à edição de "Cadernos da Literatura Brasileira", editado pelo Instituto Moreira Salles - São Paulo, número 8 - Outubro de 1999.Retirado deste site
Iniciei mil vezes o diálogo. Não há jeito. Hilda Hilst
Iniciei mil vezes o diálogo. Não há jeito.
Tenho me fatigado todos os dias
Vestindo, despindo e arrastando amor
Infância, sóis e sombras.
Vou dizer coisas terríveis à gente que passa.
Dizer que não é mais possível comunicar-me.
(Em todos os lugares o mundo se comprime.
Não há mais espaço para sorrir ou bocejar
De tédio).
As casas estão cheias. As mulheres parindo
Sem cessar, os homens amando sem amar
Ah, triste amor desperdiçado
Desesperançado amor, serei eu só
A revelar o escuro das janelas, eu só
Adivinhando a lágrima em pupilas azuis
Morrendo a cada instante, me perdendo ?
Iniciei mil vezes o diálogo. Não há jeito.
Preparo-me e aceito-me
Carne e pensamento desfeitos. Intentemos,
Meu pai, o poema desigual e torturado.
E abracemo-nos depois em silêncio. Em segredo.
Tenho me fatigado todos os dias
Vestindo, despindo e arrastando amor
Infância, sóis e sombras.
Vou dizer coisas terríveis à gente que passa.
Dizer que não é mais possível comunicar-me.
(Em todos os lugares o mundo se comprime.
Não há mais espaço para sorrir ou bocejar
De tédio).
As casas estão cheias. As mulheres parindo
Sem cessar, os homens amando sem amar
Ah, triste amor desperdiçado
Desesperançado amor, serei eu só
A revelar o escuro das janelas, eu só
Adivinhando a lágrima em pupilas azuis
Morrendo a cada instante, me perdendo ?
Iniciei mil vezes o diálogo. Não há jeito.
Preparo-me e aceito-me
Carne e pensamento desfeitos. Intentemos,
Meu pai, o poema desigual e torturado.
E abracemo-nos depois em silêncio. Em segredo.
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sábado, 11 de outubro de 2014
Sobre "A casa das belas adormecidas", de Ysunari Kawabata
Me dei de presente de aniversário e ontem comecei a leitura... estou gostando muito, muito ...
Na sinopse do site da Livraria Cultura eles explicam :
Na sinopse do site da Livraria Cultura eles explicam :
"Imbuída de erotismo, esta obra, escrita em 1961, conta a história de Eguchi, um senhor de 67 anos que frequenta a 'casa das belas adormecidas', uma espécie de bordel onde moças encontram-se em sono profundo, sob efeito de narcóticos. Apesar da idade avançada, o protagonisto parte em busca dos prazeres perdidos e se depara com moças virgens, que os visitantes podem tocar, mas são proibidos de corromper. Kawabata procura desvendar o universo do corpo feminino em um culto ao belo e ao inalcançável, investigando as dores da solidão a partir da sutileza de um erotismo expressivo, atravessado por passagens de ironia e consciência da passagem do tempo, do vazio existencial que permeia as relações humanas."
Na última capa do livro temos um trecho instigante:
"... completamente fora de si, o velho Eguchi esquecera que a garota era a oferenda ao sacrifício, ele procurou com o pé as pontas dos pés dela. Somente ali ele ainda não tinha tocado. Os dedos eram longos e moviam-se graciosos. As articulações, de modo semelhante às dos dedos das mãos, era se dobravam ora se desdobravam, o que já bastava para exercer em Eguchi a forte sedução da mulher misteriosa " Yasunari Kawabata - "A casa das belas adormecidas"
Conforme for lendo,volto a comentar, se for o caso, ok?
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quarta-feira, 8 de outubro de 2014
Emicida - Aos olhos de uma criança (trilha sonora de O Menino e o Mundo)
Partindo do "Pequeno Cidadão",mas mundando um pouco os interpretes e compositores, , algo para adultos, a partir dos "olhos de uma criança" ...
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Mais "Pequeno Cidadão"
Porque é muito bom ...
O SAPO BOI
O FUTEBOL
O SAPO BOI
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Pequeno cidadão e a nova música para crianças!
Como eu percebo desde minhas pesquisas para o doc, tem coisa muito boa sendo produzidas para crianças, "Pequeno Cidadão" é uma das mais recentes ...a música "O X" é uma das que eu acho mais divertidas, acho que as crianças também devem amar
E eles têm outras coisas ótimas como essa, com referências diretas a "A arca de noé", do Vinicius de Moraes e suas borboletas coloridas. Eu sempre acho que a produção cultural para crianças tem ali uma fonte segura...
E as meninas, que eu abordei tanto na tese, também são tema para eles :
E eles têm outras coisas ótimas como essa, com referências diretas a "A arca de noé", do Vinicius de Moraes e suas borboletas coloridas. Eu sempre acho que a produção cultural para crianças tem ali uma fonte segura...
E as meninas, que eu abordei tanto na tese, também são tema para eles :
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segunda-feira, 6 de outubro de 2014
Lucas e seus hospitais (I). In: “Um tal Lucas”
Lucas e seus hospitais (I). In: “Um
tal Lucas”
"Como a clínica onde Lucas e
internou é uma clínica cinco estrelas, os pacientes-sempre-têm razão, e dizer
que ao quando eles pedem coisas absurdas é um problema sério para as
enfermeiras, cada uma mais gostosinha que a outra e quase sempre dizendo sim pelas
razões anteriores.
Certamente não é possível atender
ao pedido do gordo do quarto 12, que em plena cirrose hepática exige de três em
três horas uma garrafa de genebra, mas
em compensação com que prazer, com que gosto as garotas dizem sim, pois não,
claro, quando Lucas, que foi para o corredor enquanto arejam o seu quarto e
descobriu um ramo de margaridas na sala de espera, pede quase timidamente que o deixem levar uma para
o quarto e assim alegrar o ambiente.
Depois de deitar a flor na mesa
de cabeceira, Lucas toca a campainha e pede um copo d’água para dar uma postura
mais adequada à margarida. Quando lhe trazem
o copo e instalam a flor, Lucas repara que a mesa de cabeceira está
cheia de frascos, revistas, cigarros e cartões postais, de modo que talvez se
possa colocar uma mesinha aos pés da cama, localização que lhe
permitiria gozar da presença da margarida sem ter que torcer o pescoço para
distingui-la entre diferentes objetos que proliferam na mesa de cabeceira.
A enfermeira traz logo o que ele
pediu e põe o copo com a margarida no ângulo visual mais favorável, coisa que
Lucas agradece comentando uma passagem que como muitos amigos vêm
visitá-lo e as cadeiras são um tanto
escassas, nada melhor do que aproveitar a presença da mesinha para acrescentar
duas ou três poltronas confortáveis e criar um ambiente mais adequado ao
diálogo.
Tão logo as enfermeiras aparecem
com as poltronas, Lucas diz a ela que se
sente extremamente grato aos seus amigos que o apoiam tanto naquele mau pedaço,
razão pela qual a mesa se prestaria perfeitamente, após a colocação de uma
toalhinha, para sustentar duas ou três garrafas de uísque e meia dúzia de copos
, se possível de cristal facetado, além de um recipiente com gelo e garrafas de
soda.
As garotas se espalham em busca
de tais acessórios e os arrumam artisticamente na mesa, ocasião em que Lucas se
permite observar que a presença de copos e garrafas desvirtua
consideravelmente a eficácia estética da
margarida, bastante perdida no conjunto, mas a solução é muito simples porque o
que está faltando de fato neste quarto é um armário para guardar a roupa e os
sapatos, grosseiramente amontoados num móvel do corredor, de modo que bastará
colocar o copo com a margarida em cima do armário para que a flor domine o
ambiente e lhe transmita esse encanto um pouco secreto que é a chave de toda
boa convalescença.
Superados
pelos acontecimentos, mas fiéis às normas da clínica, as garotas arrastam
penosamente um amplo armário sobre o qual acaba pousando a margarida como um
olho ligeiramente estupefato mas cheio de benevolência. As enfermeiras sobem no
armário para pôr um pouco mais de água fresca no copo , e então Lucas fecha os
olhos e diz que agora está tudo perfeito
e que vai tentar dormir um pouco. Assim que fecham a porta ele se levanta, tira
a margarida do copo e a joga pela janela, porque não é uma flor de que goste
particularmente." p. 51-3.
Claro que o mini conto é mais complexo e tal, mas eu não pude deixar de traçar alguma relação entre a relação de Lucas com a margarida e algumas coisas boas que eu conquistei na vida, mas que minha terapeuta sempre diz que eu tendo sempre a jogá-las pela janela, sem piedade...
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sexta-feira, 3 de outubro de 2014
quarta-feira, 1 de outubro de 2014
A melhor cena de reencontro da literatura brasileira
"... um homem, tropeiro também, vinha entrando, na soleira da porta. Agüentei aquele nos meus olhos, e recebi um estremecer, em susto desfechado. Mas era um susto de coração alto, parecia a maior alegria.
Soflagrante, conheci. O moço, tão variado e vistoso, era,pois sabe o senhor quem, mas quem, mesmo? Era o Menino! O Menino, senhor sim, aquele do porto do de-Janeiro, daquilo que lhe contei, o que atavessou o rio comigo, numa bamba canoa,toda a vida. E ele se chegou, eu do banco me levantei. Os olhos verdes, semelhantes grandes, o lembrável das compridas pestanas, a boca melhor bonita, o nariz fino, afiladinho.
Arvoamento desses, a gente estatela e não entende; que dirá o senhor, eu contando só assim? Eu queria ir para ele, para abraço, mas minhas coragens não deram. Porque ele faltou com o passo, num rejeito, de acanhamento. Mas me reconheceu, visual. Os olhos nossos donos de nós dois. Sei que deve de ter sido um estabelecimento forte, porque as outras pessoas o novo notaram – isso no estado de tudo percebi. O Menino me deu a mão: e o que mão a mão diz é o curto; às vezes pode ser o mais
adivinhado e conteúdo; isto também. E ele como sorriu. Digo ao senhor: até hoje para mim está sorrindo. Digo. Ele se chamava o Reinaldo."
Soflagrante, conheci. O moço, tão variado e vistoso, era,pois sabe o senhor quem, mas quem, mesmo? Era o Menino! O Menino, senhor sim, aquele do porto do de-Janeiro, daquilo que lhe contei, o que atavessou o rio comigo, numa bamba canoa,toda a vida. E ele se chegou, eu do banco me levantei. Os olhos verdes, semelhantes grandes, o lembrável das compridas pestanas, a boca melhor bonita, o nariz fino, afiladinho.
Arvoamento desses, a gente estatela e não entende; que dirá o senhor, eu contando só assim? Eu queria ir para ele, para abraço, mas minhas coragens não deram. Porque ele faltou com o passo, num rejeito, de acanhamento. Mas me reconheceu, visual. Os olhos nossos donos de nós dois. Sei que deve de ter sido um estabelecimento forte, porque as outras pessoas o novo notaram – isso no estado de tudo percebi. O Menino me deu a mão: e o que mão a mão diz é o curto; às vezes pode ser o mais
adivinhado e conteúdo; isto também. E ele como sorriu. Digo ao senhor: até hoje para mim está sorrindo. Digo. Ele se chamava o Reinaldo."
Este é o trecho em que Riobaldo reencontra o menino Diadorim, que atravessou o rio com ele numa bamba canoa TODA A VIDA, o menino que ele queria que gostasse dele e reencontrá-lo era "um susto de coração grande, parecia a maior alegria" ... como Guimarães Rosa sabia das coisas da vida, do medo e do amor : parecia a maior alegria! e era, só posso agradecer aquele reencontro
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