quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Brincar de tempo-será

Tempo Será

A Eternidade está longe
(Menos longe que o estirão
Que existe entre o meu desejo
E a palma da minha mão).

Um dia serei feliz?
Sim, mas não há de ser já:
A Eternidade está longe,
Brinca de tempo-será.
(Manuel Bandeira)

Mas que brincadeira é essa de 'tempo-será'?
Segundo
este site, é um jogo de pique que quando o pegador é escolhido, as outras crianças repetem o seguinte diálogo cantado:

— Tempo será.
— De cericecó.
— Laranja da China.
— Pimenta em pó.
— Pinto que pia?
— Pi-pi-ri-pi.
— Galo que canta.
— Cocorocó
— Quem é o durão?
— Só eu só.
— Olha que lhe pego.
— Não é capaz.
— Olha que lhe pego.
— Se for capaz...


Quando acaba todos se põem a fugir do pegador. O primeiro que for pego será o pegador da rodada seguinte. Brincadeira bem brasilira, não? O interessante é pensar nos "tempos outros" das crianças, que no máximo obedecem às temporalidades dos jogos e brincadeiras, estes sempre à parte do tempo cronológico linear dos adultos!

domingo, 18 de dezembro de 2011

(UM) CRIME DELICADO

Estou lendo o romance "Um Crime delicado", de Sérgio Sant'Anna e estou adorando!
Eu não esperava muito, confesso, mas estou me surpreendendo em cada vez maisudo bem que estou ainda no começo porque (para minha grande surpresa até) é bem densa (nunca chata!)...
Séparei 3 trechinhos logo do começo que eu amei, um sobre narrativa e seu poder; um sobre percepção do amor . Sobre a construção narrativa:

"Não tenho a pretensão de rastrear, reproduzir, aqui, a consciência, a memória em seu fluxo veloz e descontínuo, pois tal procedimento se encontra muito além de minhas potencialidades narrativas, talvez além do alcance das palavras, porque a maior parte desses pensamentos, lembranças e projeções se fazia por meio de sensações e imagens superpostas (AQUI A PERSONAGEM ELENCA IMAGENS DAS QUAIS SE LEMBRA QUE NÃO COLOCO AQUI PRA NÃO ESTRAGAR POSSÍVEIS LEITURAS DE VOCÊS QUE ME LÊEM). Então é preciso organizar esse fluxo, como o tenho feito, para que eu próprio possa segui-lo, dominá-lo ao menos nestas páginas, estas frases que se encadeiam, como se elas, sim, criassem a verdadeira realidade." P. 29-30"
As duas outras passagens sobre percepção da espécie de amor são:
"Minhas emoções, tenho certeza, se atropelavam, mas eu podia resumi-las nesse dia seguinte como sentimento de profunda cumplicidade com Inês e o seu destino, desde quando fora traçado com aquele estigma, muito antes de eu conhecê-la, até o momento mágico em que passara a incluir-me e, a partir dele, até onde esse destino fosse conduzir-nos. Nâo seria amor, ou mais?" P. 31
"...mais importante do que o fato de ser Inês uma pintora, medíocre ou não, havia o fato maior de sermos dignos um do outro, pois os espelhos que nos ligavam, inclusive na ausência, refletiam, para além dos corpos - para além, até, daquilo meio secreto em seu corpo -, uma imagem, digamos, do espírito." P.32

Este romance foi filmado, recebeu o nome de Crime delicado:
Não vou assistir antes de terminar de me deliciar com a sua leitura porque só de saber que está no eleco do filme já perdeu a graça de imaginar as personagens... que droga! De qualquer forma, fica aqui as duas indicações...

sábado, 17 de dezembro de 2011

Cronologia da infância

"A cronologia da infância não segue uma linha reta, mas é feita de sobressaltos. A memória é um espelho opaco e estilhaçado, ou melhor, é feita de conchas intemporais de lembranças espalhadas numa praia de esquecimento. Sei que aconteceram muitas coisas naqueles anos, mas tentar recordá-las é tão desesperador como tentar lembrar um sonho, um sonho que deixou em nós uma sensação, mas nenhuma imagem, uma história sem história, vazia, da qual resta apenas um vago estado de espírito. As imagens se perderam. Os anos, as palavras, as brincadeiras, as carícias se apagaram, e no entanto, de repente, rememorando o passado, alguma coisa volta a se iluminar na sombria região do esquecimento"
- A Ausência que Seremos, Hector Abad

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Crianças. Nomes. Falas

VI
As coisas que não têm nome são mais pronunciadas
por crianças.
VII
No descomeço era o verbo.
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá onde a
criança diz: Eu escuto a cor dos passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não funciona
para cor, mas para o som.
Então a criança muda a função de um verbo, ele
delira.
E pois.
Em poesia que voz de poeta, que é voz de fazer
nascimentos -
O verbo tem que pegar delírio.
(Manuel de Barros. Obras Completas. Pp. 300-01)
"nomear algo significa convocar, criar realidade da coisa, ou antes, reconhecer essa realidade. Trata-se do valor mágico da palavra, do poder da palavra, da palavra eficaz."
(Adélia Bezerra de Menezes. Cores de Rosa.P. 233)

A persistência da memória - Salvador Dali

"Em 1934, Salvador Dali, pintor catalão radicado em Paris e uma das figuras líderes
do grupo surrealista, expõe numa galeria de Nova Iorque, o quadro "A
persistência da memória", o que se tornaria num dos momentos fundamentais
da sua carreira artística, responsável pelo incremento da sua notoriedade
pública. De facto, os relógios moles - designação muitas vezes atribuída a este
quadro - transformaram-se de imediato num dos ícones mais fortes e
característicos da sua obra.Na tela encontram-se representados três relógios
que marcam diferentes horas tendo como fundo a paisagem de Porto Lligat,
localizado no norte de Espanha, (memória de infância de Dali). Segundo o
próprio autor, a solução formal dos relógios derivam de um queijo camembert que
Dali se encontrava a observar enquanto pintava. As suas formas sensuais têm uma
evidente conotação sexual, nomeadamente o que se encontra no centro do quadro,
estendido sobre uma pedra que simula o retrato do artista.
Dali via os relógios como instrumentos normalizados e exatos que traduziam de
forma objetiva a passagem do tempo. O facto de os dotar de formas orgânicas
remete-os para o universo de prazer, recordando a dimensão fugidía do tempo e o
sentido de ambiguidade que a evolução temporal introduz pelo cruzamento da
perceção da realidade com a casualidade e inexplicabilidade da memória.
Esta pintura traduz o interesse do pintor pelas conquistas da ciência moderna,
cruzando teorias mais abstratas de física, nomeadamente a relatividade de
Einstein, que colocou em causa a ideia de espaço e tempo fixos, com as
pesquisas de Freud relativamente ao inconsciente e à importância dos fenómenos
dos sonhos. A duplicidade de sentido das imagens e as inúmeras interpretações
que promovem assim como a tendência para a criação de cenas absurdas repletas
de signos indecifráveis, levaram a Dali a designar esta forma de arte de
crítica paranoica, em tudo oposta a uma visão racional do mundo. De um ponto de
vista técnico, esta pintura, assim como grande parte das criações de Dali,
perseguem um enorme virtuosismo e meticulosidade no desenho das formas e na
representação dos pormenores, com objetivo de obter atmosferas dotadas de
grande realismo, daí o frequente alinhamento desta fase criativa com o grupo
dos surrealistas ilusionistas ou veristas.
Contém uma grande quantidade de referências de carácter historicista,
particularmente as referentes à pintura maneirista ou à enigmática e fantástica
obra do flamengo Jerónimo Bosch. O quadro Persistência da Memória
(também conhecida por Relógios Moles), foi pintado a óleo, aplicado sobre tela
com 24,1 por 33 cm. Encontra-se exposto no Museu de Arte Moderna de Nova
Iorque."(
http://www.infopedia.pt/$persistencia-da-memoria-(pintura)
Neste texto enciclopédico sobre o quadro "A persistência da memória" (1934) , de Salvador Dali aqui na internetvi coisas que quase acontecem nos meus textos: não são inverdades que se coloca, mas são restrições, é como se só Dali tivesse se preocupado com o direcionamento do tempo ou o questionamento da linearidade no século XX. De qualquer forma, para quem (como eu) pretende se voltar a infância, imagens como esta são um prato cheio de questionamentos...

domingo, 11 de dezembro de 2011

Filho é pra quem pode?

Muito bom para refletir e tentar me consolar (eu que não fui filha, nem serei mãe e, confesso, não 'engoli' direito isso e me pergunto diariamente 'por que?'Textos como este tentam alguma resposta...mesmo que seja apenas racional...

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

XVII SEMINÁRIO DE TESES EM ANDAMENTO (SETA) DO IEL -UNICAMP: EU FUI!



Este ano eu participei do "XVII Seminário de teses em andamento (Seta)", desenvolvido pelo IEL da UNICAMP entre 30 de novembro e 2 de dezembro de 2011. Ainda estou tentando "realizar" o fato de ter mostrado um pedacinho da minha pesquisa a uma das mais conceituadas pesquisadora de Rosa, a Susi Sperber, e ter recebido dela comentários e um dos os autógrafos mais bonitos que já recebi:
Como acontece sempre em todos os debates,foi muito legal discutir as idéias nas quais você acredita, quando isto acontece com interessados e conhecedores, é fantástico! Na mesa que eu participei e que tinha a Susi como debatedora, tínhamos plateia e me deixaram mostrar TUDO que eu tinha preparado, todas as imagens, li todas as citações. Acho que porque eu era a voz da alteridade ali (não era nem da UNICAMP, nem das letras), para mim foi bacana ver que era mesmo algo inovador fazer leituras dos cadernos de Rosa, ainda mais com a perspectiva que estou usando, Susi Sperber disse que quando ela estudou a biblioteca de Rosa não havia cadernos, mas que ela pensava que eles eram mais uma questão de praticidade, para não usar folhas avulsas, mas eu não entrei na discussão na hora porque ainda estou pesquisando e não conclui nada ainda, mas sempre questiono ser só uma questão de praticidade, até porque no arquivo também existem muitass folhas avulsas de Rosa.No debate final, conversei com Erich Soares Nogueira (um outro doutorando em Rosa), que já trabalhou com infância no mestrado e que achou muito "delicada" a minha apresentação. Trocamos figurinhas muitas sobre figurações da voz, sobre vocalidade, Zumthor e Meschonnic, silêncio, "paisagem sonora", demais!Outra coisa muito legal foi que eu pude falar aos espeialistas sobre minha oficina com as crianças, sobre minhas hipóteses a respeito das mudanças de recepção e discutimos um pouco sobre isso fiquei bem satisfeita. Para além dos resultados científicos, conheci a galeria do IEL (amigos do meu namorado), gente muito bacana! Resumindo, foi muito legal minha passagem pela UNICAMP esse ano!Às vezes é tão bom pesquisar o que se ama e momentos assim fazem tudo valer à pena!