sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Qualquer semelhança com fatos atuais é só semelhança?


"...Há outros silêncios intencionais, claramente criminosos. Sabemos hoje, com pesquisas históricas e arquivísticas, inclusive aquelas realizadas a pedido da Comissão Nacional da Verdade, que muitos dos fatos sistematicamente negados e desmentidos pelos militares, e que não encontravam comprovação independente de testemunhos das vítimas, aconteceram desde o primeiro dia da ditadura militar instaurada pelo golpe de 1964. Arquivos foram destruídos, outros escondidos, mas sabemos com certeza, hoje, que a tortura e o desapaecimento de pessoas nos porões da ditadura não foram, como tantas vezes nos quiseram convencer, uma reação de um governo em guerra contra a luta armada desencadeada por parte da esquerdaa partir de 1968.Desde o primeiro dia do regime de 1964 prendeu-se e torturou-se neste país. Homens e mulheres, especialmente os sindicalistas de então, fossem comunistas, nacionalistas, trabalhistas, socialistas,ou não,sofreram a violência inominavel da tortura por parte dos Agentes do Estado. Muitos deles perderam seus empregos e ficaram impedidos de conseguir outros pelo conluio entre governantes  e dirigentes das empresas que os demitiram. O silêncio que se difundiu sobre a tortura e o desaparecimento de pessoas no início do período ditatorial, produzido pela covardia dos que apoiaram o golpe nas ruas, nas  associações empresariais e patronais, na imprensa, nos quartéis, aqui e no exterior, contaminou, por muito tempo, a palavra de historiadores que silenciavam sobre o que não podiam comprovar: o terror do regime de 1964, que tomara o poder apoiado por aqueles que diziam falar em nome de Deus, da democracia e da paz social, palavras que, vistas depois da experiência histórica das últimas décadas, me parecem mais heterônimos de certas frações do capital." 

Marcelo Jasmin. "Silêncio da História: experiência, acontecimento, narração" In: NOVAES, Adauto (org).O silêncio e a prosa do mundo. São Paulo: Edições SESCSP, 2014, p.256-7 .

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

LEITURAS DELICIOSAS


Comprei esse na liquidação da Loja Sesc antes do Natal, estou lendo aleatoriamente e demoradamente os artigos e estou ADORANDO...li primeiro o que me levou a comprar o volume que é A descoberta da linguagem, do Francisco Bosco e ele me abriu caminhos para pensar diferentemente sobre as engraçadas falas de crianças ao Pedro Bloch. Bosco fala do gênio como possibilidade inventiva e as palavras em Sartre, e não que ele cite textualmente, mas algumas ideias que ele apresenta me fizeram lembrar de Benjamin lido por Agamben em "Infância e História"... que leitura sensacional essa do Bosco (eu queria escrever claramente assim um dia!).

Esta manhã li a metade de Silêncios da História: experiência, acontecimentos, narração, do Marcelo Jasmim (que nome floral!)... e ele menciona os atos de fala de Austin para abordar o Silêncio da História! Ai fiquei abismada porque isso, de outra forma, também está na minha tese que, embora não pareça, é uma tese de pura Teoria da História, ainda que ninguém quis aceitá-la dessa forma! Lembro que o professor Luiz Costa Lima disse, na defesa, que não via Austin em Rosa em momento algum, que era para eu repensar esta relação na revisão,repensei e deixei como estava, lembando que na hora eu quase recomentei que ele lesse e relesse Os três homens e o boi dos três homens que inventaram um boi!) ...
Ai leio esses artigos e penso que não é possível que eu tenha feito um trabalho tão ruim quanto ficou parecendo, não é !

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Os Emigrantes de W.G. Sebald e a História (pode conter spoiler)

Se é que de fato sou historiadora, devo muito isso aos clássicos lidos na graduação e às experiências de pesquisa, mas acho que aprendi mesmo sobre as possibilidades e limites dela através da literatura. É sempre bem vinda a presença de um contraponto inicial. Em 2005 eu estava muito doente e mesmo assim tentava fazer mestrado, foi quando li esse fantástico livro de Sebald, para um curso de pós...lembro dele sempre, especialmente desse fragmento, que me ensinou tanto sobre História, suas narrativas e fluxos. Sim, isso já estava em outros textos, especialmente nas Teses sobre o conceito de História de Benjamin, mas ficou registrado em mim, mesmo, por essa narrativa:

Mas, cada vez entendo melhor, certas coisas têm um jeito inesperado de retornar, muitas vezes depois de longo tempo ausentes. Pelo fim de julho de 1986 passei alguns dias na Suíça. Na manhã do dia 23 fui de trem de Zurique a Lausanne. Quando o trem cruzou lentamente a ponte do Aare, entrando em Berna, meu olhar viajou da cidade à cadeia de montanhas. Se não estou apenas imaginando agora, lembrei-me do dr. Selwyn nessa ocasião pela primeira vez depois de muito tempo. Quarenta e cinco minutos depois, para não perder a visão daquela magnífica paisagem do lago de Genebra, já ia deixando de lado um jornal de Lausanne, comprado em Zurique, que estivera folheando, quando uma noticia chamou minha atenção: dizia que os restos mortais do guia de montanhas Johannes Naegeli, desaparecido em 1914, tinha sido devolvido depois de 72 anos pela geleira de Oberaar. - Assim, pois, retornam os mortos. Às vezes depois de sete décadas eles saem do gelo e ficam deitados na beira da morena, um montinho de ossos polidos e um par de botas com cravos. W.G. Sebald Os Emigrantes, p. 28.

O passado não passa assim tão facilmente, tem sempre algum corpo em alguma geleira, alguma foto, algum resquício, alguma nota ...tudo isso é narrativa e também pode contar história.

sábado, 17 de dezembro de 2016

Vovô Joãozinho de chupeta



Depois de cerca de dois anos, enfim, um artigo meu saiu do prelo. Trata-se de Vovô Joãozinho de chupetacorrespondência de Guimarães Rosa para Vera Ooó e novas visões sobre acriança no século XX, 
Este texto é muito importante, pois ele apresenta, a um só tempo, faces da minha tese sobre infância em Guimarães Rosa e já indica s ideia que tento desenvolver no meu pós-doc, de observar uma certa  preocupação por parte do século XX em valorizar a voz da criança, da forma mesma como ela é expressa.  Não vou mais falar tanto dele, deixo apenas as palavras de um dos pareceritas que o aprovou na revista:


"A historiadora da infância Egle Becchi defende que o historiador da infância deve estar aberto à multidisciplinaridade, para dar conta de interpretar as experiências da criança de um outro tempo. O trabalho submetido é um ótimo e refinado exemplo dessa interdisciplinaridade:recorrendo à linguística, à psicologia, à antropologia, à sociologia,à história, constrói, com extrema habilidade, um consistente objeto de pesquisa. De fato, o artigo traz um arcabouço teórico de peso, que,infelizmente, não é comum na historiografia da infância brasileira,razão pela qual é modelar para estudos futuros, merecendo, por essa razão, ser publicado e amplamente veiculado.Também é interessante a riqueza empírica de que o trabalho se apropria, recorrendo à fontes imagéticas, escritas ordinárias, história oral, literatura, construindo, assim, imagens bem matizadas das experiências históricas que se propõe a interpretar e analisar.A narrativa é fluída e agradável, fazendo jus ao estilo narrativo de Guimarães Rosa, que é, em última análise, o personagem central por meio do qual a infância e a criança da década de 60 vão emergindo na narrativa histórica empreendida." 

  A quem interessar a leitura, é só clicar no link acima.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

RETROSPECTIVA 2016: Dias melhores ainda virão...

JANEIRO -   No primeiro mês do ano eu estava no melhor dos mundos com a visita de um dos meus grandes amigos da vida, o Rafael. Nós nos encontramos algumas vezes, fomos ao cinema assistir Macbeth e planejamos nos rever durante o ano MG, o que realmente acabou acontecendo e foi ótimo. Fiz óculos novos.  

Vi o último do Tarantino, Os oito odiados, sozinha e foi legal me sentir pertencendo a uma geração. Estava firme me preparando para escrever um artigo sobre o disco Minas e a resenha do livro de Benjamin. A resenha eu escrevi e está em avaliação, mas o artigo ainda não, ou seja, cumpri 50% do planejamento de janeiro para o ano de 2016. Ainda bem que fiz mais coisas, né? 

FEVEREIRO – Teve carnaval e desta vez, depois de anos, eu me permiti pular e foi demais. Teme homenagem ao Bituca na Escola de Samba Tom Maior. Tivemos os deliciosos blocos de rua, me diverti como nunca antes nas ruas da minha cidade, especialmente no Tarado ni você, do Caetano; e fui ao baile do Sesc Pompéia, com a Orquestra Contemporânea de Olinda em um dia em que eu estava me sentindo linda, de verdade. Nessa vibe assisti a um jogo de futebol no estádio pela primeira vez e fiquei encantada com a beleza da torcida do Palmeiras.No final do mês me matriculei no curso de extensão sobre Januz Korczak, com muitas expectativas que acabaram não se realizando, como tantas das coisas que tentei em 2016, ano em que eu só consegui mesmo foi ganhar alguns quilinhos a mais, agora sou uma gordinha sexy.

MARÇOEm março a vida pública começou a desmoronar sobre a pessoal,  que até então era uma forte possibilidade de golpe, se instaurou, amargando muito minha boca e para sobreviver, tentei escapar mergulhando no meu trabalho de pós doutorado. Meu  artigo "A respeito dos cadernos de Guimarães Rosa e o questionamento da História" que foi publicado no livro "Compêndio de Crítica Genética na América Latina" (2015) .



ABRIL - Vi e me deliciei com o espetáculo Crianceiras – música inspirada na poesia de Manoel de Barros.

Ganhei o excelente livro Arco de virar réu, de Antonio Cestaro como cortesia literária e adorei. Assisti ao meu primeiro show do ano no Instrumental SESC Brasil, que foi com a viola do Gabriel Satter. Dias depois fui com minhas amigas a um evento sobre literatura infantil no instituto Goethe e foi muito rico. Vi com uma amiga a exposição Histórias da Infância no MASP, que foi maravilhosa.






MAIO – Assisti ao curso Canção na Era do Vinil, com Sérgio Molina, no Centro Cultural Maria Antonia, tudo isso ainda pensando no artigo sobre o disco Minas, que ainda vai sair. Além disso, em maio eu apenas estive me preparando para as atividades de junho, que foram excelentes.




JUNHO – Em junho eu ministrei uma palestra sobre as quatro personagens meninas das estórias de Guimarães Rosa, na UNIBES cultural e em seguida segui para Belo Horizonte, onde ministrei um minicurso sobre a História nos Cadernos manuscritos e Guimarães, além de ter vivido dias no melhor dos mundos na capital mineira, ao lado dos meus amados grandes amigos da vida, Rafael e Lucas... foi memorável.





JULHO – Foi o mês do luto pelo primeiro ano da morte do meu pai. Eu relembrei a data, de todo coração, assistindo a um curso inteirinho sobre viola caipira no SESC, com Jair Marcatti e a participação do violeiro Sidnei de Oliveira, que me emocionou demais. Como dói a saudade de um ente querido! Em julho, meio que metaforicamente, eu cai de boca no chão e meu joelho esquerdo nunca mais foi o mesmo desde então, e também me parece que a vida toda caiu, ladeira abaixo...essa foto eu tirei no dia que eu cai, mas um pouco antes ...




AGOSTO – Eu fiz uma espécie de balanço de trabalho do meu primeiro ano de pós-doc, no qual me aprofundei no estudo dos livros – dicionários  e anedotários infantis- e fui me aprofundar neles, pensei em escrever um artigo sobre a presença de Portinari neles, que ainda vou escrever, e e também escrevi um capítulo de livro ser editado no ano que vem sobre o humor naqueles anedotários. Dei-me conta de que não iria conseguir mais abordar a coluna de Bloch nas revistas, não do jeito que eu me propus inicialmente, que precisarei fazer um grande recorte nas fontes para que elas sejam citadas. Recebi um enorme  parecer positivo a respeito do meu artigo 'Dicionários infantis de Pedro Bloch', que me sugeria abordar, também, os autores de literatura infantil brasileira na década de 1970 e isso me levou a ricas reflexões sobre o trabalho de Bloch com as crianças, foi um ânimo imenso tê-lo recebido. Em agosto eu fui a dois shows sensacionais no SESC, um do Duofel, Carlos Malta e Robetinho Silva e outro do violeiro  Ivan Vilela e as irmãs Ana e Marlui Miranda, que foi muito emocionante. Também vi Tom Zé e como sempre foi um deleite!




SETEMBRO – Passei com frequência  a todos os concertos do Instrumental Sesc Brasil  SESC Consolação, ali vi Wagner Tiso. Também assisti outros shows, como o Toninho Horta e em 30 de setembro assisti ao insuperável João Omar e me senti desabrochando com a primavera.





OUTUBRO – Depois de ver o talentoso filho, assisti ao show de Elomar, o que é sempre uma emoção. Assisti ao show de 80 anos de Tom Zé, Canções eróticas de ninar, Fui avaliadora em evento científico na USP, muito bonitinho. Vi a exposição de Cândido Portinari no MASP, excelente. Voltei a  ver concerto no Instrumental SESC Brasil, com o compositor, arranjador e bandolinista  Marcos Rufato. E no meu aniversário ganhei cesta de café da manhã, muito chique!



NOVEMBRO – No começo desse mês eu segui para Araraquara para participar do XVII Congresso da Sociedade Internacional de Estudo de Humor Luso-Hispânicos, que foi muito bom falar de Pedro Bloch entre especialistas de humor infantil, como Sírio Possenti e Alessandra Del Ré. Quando voltei, assisti concertos no Instrumental SESC Brasil,o mineiro  Rafael Pansica.


DEZEMBRO – Eu e amigos visitamos o Festival Toyo Matsuri , no bairro da Liberdade. Comecei o mês no Instrumental SESC Brasil,só com a Nelson Ayres Big Band (que som maravilhoso!), depois ainda fui ao show Baile do Almeidinha, do Hamilton de Holanda, com participação da Paula Lima e tudo mais e para fechar com chave de ouro o ano do Instrumental SESC Brasil, acompanhei a superlativa apresentação do Projeto Coisa Fina, que na verdade é coisa finíssima.



Assim foi  meu 2016, foi pesado como foi para todo mundo, mas também teve coisas boas e bonitas. Que venha 2017, animado e mais leve que esse para todos nós.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Sobre o catálogo da Exposição "Histórias da Infância"



Eu "participo" dessa exposição no MASP desde o curso antes dela acontecer, que eu assisti, mas não concordei muito com a maioria do que ali foi dito, mas valeu para que eu percebesse como existem perspectivas muito diversas da minha para pensar em História e crianças. O que me incomodava mais era que as crianças até apareciam, mas sua não aparecia nunca nas falas, tudo muito de "História da Infância", tudo muito perspectiva de adulto apenas.

Mas tivemos momentos ímpares no curso, inesquecíveis mesmo, como a participação da professora Telma Piacentini, do Museu do Brinquedo de Santa Catarina, e seu trabalho com o brincar (que, para ela, é o 'ser criança' e desde então para mim também é).

Porém a exposição foi ótima. reveladora, inspiradora, etc...Arte é sempre mais, não é? Ao contrário do que aconteceu na maioria do curso, na mostra, as crianças também puderam expressar a sua voz, não apenas nos desenhos que estavam emoldurados juntamente com as obras dos autores, mas também com vídeos delas realmente falando, conversando, tudo como acontece na vida real: criança e adulto estão sempre juntos, não faz sentido separá-los definitivamente. Assim que uma ala da atual antropologia da criança também pensa.

No catálogo eu reencontrei as duas faces : Inicialmente temos textos da Lilia Moritz Schwarcz, Maria Helena P. T. Machado e até do Philippe Àries, etc, mas nenhhum da Pieacentini... e eles meio que repetiram alguns discursos do curso.

Mas o catálogo vale mesmo pela amostra das obras expostas.. inclusive os desenhos e os diálogos do vídeo, tudo exposto detalhadamente, então podemos reencontrar algumas obras interessantíssimas. Acho que valeu a a pena ter comprado o catálogo de presente de Natal.