segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Tereza Batista : As várias faces da heroína mítica de Jorge Amado

Quando o livro LINDO chegou
                          

Decidi que minha primeira leitura de 2022 seria Tereza Batista cansada de guerra , do Jorge Amado lá em dezembro do ano passado, porque tinha ouvido falar que ele é todo escrito em cordel (amo literatura oral) e sobretudo que Tereza (TB) seria a melhor heroína de Jorge! Quis saber , ainda nos últimos dias do ano passado me chegou essa primorosa edição da Editora Martins (1972). 

Começando pelas epígrafes que nos explicam duas coisas que não podemos esquecer que a vida de TB é uma história de de cordel! Ela, por sua vez, tem a concha muito dura para suportar todas as batalhas, mas sempre preservando  a ternura de seu interior!

Tradução do francês: "que a tua concha é muito dura para te
 permitir estar ali tenro: a ternura é como a água: invencível você gosta de caracóis?"


Sabendo que Tereza é na verdade uma heroína de cordel, o livro é todo construído assim: a cada capítulo um narrador narra uma história  contada em algum cordel  sobre Tereza Batista. O primeiro narrador já começa exaltando a valentia de TB para um interlocutor que dela pergunta, ele diz que ela 

 "carregou fardo penoso, poucos machos aguentariam com o peso; ela aguentou e foi em frente, ninguém a viu se queixando, pedindo piedade" (p. 3-4).  

 Depois fui lendo com prazer, pelo ritmo gostoso da escritura  de Jorge, mas separando a leitura pelos cinco capítulos/ cordéis. Interessante que todos capítulos apresentam uma gravura, como uma xilogravura, desenhada por Calasans Neto, que. bem ao modo da literatura oral, resume o conteúdo do texto. Aqui vou comentar capítulo por capítulo.  

1.

 

 Neste primeiro capítulo encontramos uma Tereza, que é uma sergipana, contratada como cantora de samba num cabaré de Aracaju, mas que demora um pouco a estrear seu show porque, logo ao entrar no cabaré, meteu-se numa briga com um homem que agredia uma mulher, uma coisa que ela não tolera, e tendo perdido um dente da frente, precisou esperar uns dias até que seu "dente de ouro" (representando aquela luta por uma mulher) ficasse pronto. Também conhecemos alguns personagens que voltarão a aparecer no resto do livro, pois interferirão nas guerras de Tereza, que é uma mulher bem porreta.

2.

Neste segundo capítulo, o maior e o mais difícil de ler, especialmente por uma mulher, pois conta a história de TB, tão  conhecida por todos nós, de menina pobre, que perdeu os pais num acidente ainda criança, vai ser criada por um casal de tios, Felipa e Rosalvo, ambos com segundas intenções na criança, Rosildo, caso tivesse coragem, queria  desejava matar a mulher, deflorar Tereza fugir com ela, já a tia queria vendê-la ao capitão Justiniano Duarte da Rosa, conhecido deflorador de meninas, que levava até um colar de argolas de ouro , mais de quinze, uma para cada defloração! E desse capitão, Tereza foi escrava por anos, sem nunca ter conhecido nada de bom na vida. Até que um dia surge Dan, um mocinho inconsequente, de férias da faculdade, que era amigo do capitão, mas que acaba seduzindo a jovem Tereza e a apresenta o prazer de ser mulher na cama com um homem :

"Dan seduzia Tereza. Sem querer, sem saber por que, à revelia de sua vontade, Tereza responde aos olhares - que olhos mais tristes, mais azuis e funestos, a boca vermelha, os anéis do cabelo, anjo caído do céu. Quando se foram rua afora, conversa de não acabar, Tereza escondeu no peito a flor trazida por ele. Nas costas do capitão, Daniel lhe mostrara a rosa fanada e tendo-a beijado, no balcão a pousou. Para ela a colhera e beijara; no seboso balcão uma rosa vermelha, um beijo de amor" Jorge Amado " (p,157).

  Um dia eles foram pegos em flagrante e Tereza logo percebeu que  Dan era um fraco e ela só podia contar consigo mesma para se livrar da escravidão e do capitão, nasceu a "Tereza medo acabou" (um dos nomes e guerra da TB), que defendeu primeiro a si mesma de seu senhor de escravo .

3.


Ai entramos num dos melhores capítulos do livro, onde TB é mesmo a grande  heroína! Tendo de amigado com um médico enquanto fazia a vida em Aracajú, vai viver com ele numa cidade do interior, pois ele vai assumir um posto de saúde, Mas quando veio a peste de Varíola (das tantas que assolaram o Brasil), que agora já tinha vacina, superfaturada claro, mas o que não tinha era quem tivesse coragem de sair  aplicar e cuidar dos doentes. Todos  morreram de medo de se infectar, inclusive o seu médico, e foi ela, que já tinha se vacinado na capital, a mais valente, que os políticos, os médicos, os enfermeiros, TB, percorreu as ruas miseráveis, entrou no leprosário para vacinar e cuidar. Para isso, chamou suas amigas do bordel e foram elas as heroínas contra a peste: 

Quando veio a peste, TB tinha assumido a chefia das "quengas da rua do Cancro" e a 'bexiga chegou com raiva, tinha gana antiga contra aquela população e o lugar, viera a propósito , determinada a matar, fazendo-o com maestria, frieza e malvadez, morte feia e ruim, bexiga virulenta. (...) Se não fossem a bexiga, o tifo, a malária, o analfabetismo, a lepra, a doença de Chagas, a xistossomose, outras tantas meritórias pragas soltas no campo, como manter e ampliar os limites das fazendas do tamanho de países, como cultivar o medo, impor o respeito e explorar o povo devidamente? Sem a disenteria, o crupe, o tétano, a fome propriamente dita, já se imaginou o mundo de crianças a crescer, a virar adultos, alugados, trabalhadores, meeiros, imensos batalhões de cangaceiros - não esses ralos bandos de jagunços se acabando nas estradas ao som das buzinas dos caminhões - a tomar as terras e a dividi-las? Pestes necessárias e beneméritas, sem elas, como manter a sociedade constituída e conter o povo, de todas as pragas a pior? Imagine, meu velho, essa gente com saúde e sabendo ler, que perigo medonho" (p.199-201)

Esse capítulo é maravilhoso, termina com dois Omolu (um jovem e um velho) louvando a coragem de Tereza. Ao final o capítulo assume contar a história do folheto mais verdadeiro que circula no nordeste sobre TB!  

4. 


Nesse  capítulo sabemos da  história das duas vezes em que Tereza teve a morte nas entranhas. Não foi maior capítulo, mas pelo tema tratado, acho que podia ter sido mais curto. Não me emocionou a história de amor da mocinha Tereza e o usineiro Emiliano, que ao seu modo, foi meio coronel com ela e , pela primeira vez no livro, a força da heroína TB não brilhou,enfim.


5.


Esse último capítulo achei muito bom, logo já consigo ter uma visão geral dessa obra monumental, talvez a maior em tamanho de todas as quatro protagonistas mulheres - e mesmo que a parte inspirada no cordel da "greve do balaio fechado" tenha sido longa, quase interminável, pelo menos nela Tereza aprece brilhando em valentia, ao lado dos encantados e orixás, como eu gosto e comento melhor aqui. Nesse capítulo me reconheci demais, esses orixás, esses encantados eu conheço bem e muitas vezes pensei "por que eu não li isso antes?", sinto que os encantados, os mesmos que me guardam, guardaram esse livro pra que eu lesse na hora certa, sabendo mais coisas sobre mim mesma e também a minha história, e me reconhecesse nas paginas deste romance. Isso é muita coisa. Na verdade, não queria terminar de ler o livro, mergulhei tão fundo na história de mítica Tereza, admirei tanto, gostei dela. Mesmo que Jorge Amado, muito ao modo das narrativas populares (como em Cordéis e até no Grande sertão veredas), antecipe o final em vários momentos da trama e os orixás pedem calma, pois será feliz, o final foi bem surpreendente, com a citação de Caetano, Gil, Caymmi.

Para terminar, embora eu veja a personagem TB construída com base em grandes mitos femininos, em especial as heroínas guerreiras que brilham na literatura oral, especialmente os cordéis, o próprio Jorge Amado amplia a imagem desta grande personagem:

"...lhe digo, meu senhor, que Tereza Batista se parece com o povo e com mais ninguém. Com o povo brasileiro, tão sofrido, nunca derrotado. Quando o pensam morto, ele levanta do caixão" (p. 455)

Para  Lilia Moritz Schwarcz, no artigo "O artista da mestiçagem", publicado no livro  "O universo de Jorge Amado":

"Jorge Amado nunca pretendeu ser intérprete do  Brasil, mas sempre foi"(p. 35) 

E do brasileiro como ninguém, apresentá-lo assim, declaradamente, como uma personagem feminina, bela e  mítica é muito significativo. Talvez Tereza, ao lado do meu querido Pedro Arcajo, de Tenda dos Milagres, seja uma grande personagem da literatura amadiana.

Que grande livro ... amei

Um último comentário: A obra de Jorge Amado, pelo menos a que eu conheço, é muito musical. Na festa de casamento Tereza Batista, a primeira, temos o seguinte trecho:

"Estando de violão em punho, com certeza Dorival Caymmi cantará para a noiva, não lhe compôs uma modinha? Trouxe com ele dois rapazolas, ainda muito jovens, os dois com pinta de músico, um chamado Caetano, o outro chamado Gil" (p.458).

Sim, nos romances de Jorge sempre temos gente inventada e gente real, mas o que eu lamento é que, embora Tereza Batista possa ser a melhor personagem de Jorge Amado, ninguém liga muito para ela, né? Até sua adaptação na Globo (1992) não é muito comentada! E a trilha sonora achei bonita, cheia dos Caymmis, músicos incríveis, como nós gostamos, porém chega a ser bem fraca se comparada às trilhas das adaptações de suas "parentes" para a TV ou cinema, como Gabriela (até a da novela é maravilhosa! Djavan, Tom Jobim, Fafá de Belém, Elomar, João Bosco etc ) e Dona Flor (Chico Buarque , Bituca). Isso sem falar daquele doce deleite que é a trilha de "Tenda dos Milagres" que nunca paro de ouvir (Nela tem Caetano, a voz da Nana está mais amadeirada do que nunca!)
De qualquer jeito, o que eu mais gosto das adaptações dos livros são quase sempre as trilhas sonoras, dá um som, um novo ritmo para a obra.


quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Tereza Batista : a defendida dos orixás

Vários Orixás ajudaram  Tereza Batista nas guerras
E também quiseram seu tanto da cabeça da valente mulher


 Estou no maravilhoso capítulo final deste livro incrível, em breve escrevo um comentário sobre ele todo, mas acabe de ler um dos trechos mais lindos e emocionantes de todo o Jorge Amado que conheço, é sobre a disputa dos orixás pela guarda de Tereza Batista, a grande heroína de cordel. Vejamos:

”... Deseja saber a verdade sobre o santo de Tereza Batista, quem lhe determina a vida e a protege contra o mal, o anjo-da-guarda, o dono da cabeça? (...) 

Em se tratando de Tereza deixe que lhe diga haver motivo de sobra para confusão ; até quem muito sabe, nesse caso se atrapalha na leitura dos búzios sobre a mesa. Muita gente andou vendo por aí e não houve acordo. Os mais antigos falaram Yansã, os mais recentes Yemanjá. A si disseram Oxalá, Xangô. Oxóssi, não é verdade? Euá e Oxumaré, ainda mais? Não se esqueça de Ogum e de Nanã, tampouco de Omolu.

Também eu fiz o jogo e olhei no fundo. Vou lhe contar: nunca vi uma coisa assim e há mais de cinquenta anos sou feita neste peji e há mais de vinte anos zelo por Xangô.

Quem se apresentou na frente com o alfanje rutilante foi Yansã, dizendo: ela é valente e boa de peleja, a mim pertence, sou a dona da cabeça e ai de quem lhe faça mal! Logo atrás compareceram Oxóssi e Yemanjá. Com Oxóssi Tereza veio da mata espessa, do agreste ralo, da caatinga seca, do sertão ardido e desolado. Sob o manto de Yemanjá cruzou o golfo para acender a aurora no Recôncavo, depois de guerrear por ceca e meca. Vida de combate de começo ao fim, para ajudá-la na briga feia e crua, além de Yansã, a primeira e principal, vieram Xangô e Oxumaré, Euá e Nanã, Ossain trazendo as folhas. Com o paxorô da sabedoria, Oxalufã, Oxalá velho, meu pai, lhe abriu o caminho certo onde passar.

Não estava Omolu montado no lombo de Tereza na cidade de Buquim durante a epidemia de bexiga negra? Não foi ele quem mastigou a peste com o dente de ouro e a pôs em fuga? Não a designou Tereza de Omolu na festa dos macumbeiros de Maricapeba? E então? Omolu veio brabo, aberto em chagas, reclamar o seu cavalo.

Veja que grande confusão se armou. Não tive outra saída senão chamar Oxum, minha mãe, para ela apaziguar os senhores encantados. Chegou nos dengues e nos panos amarelos, luzindo ouro nas pulseiras, nos colares, a própria faceirice. Logo se acomodaram os orixás, todos a seus pés enamorados, machos e fêmeas, a começar por Oxóssi e por Xangô, seus dois maridos. Aos pés igualmente de Tereza, em torno da formosura, pois Tereza tem de Oxum o requebro e o mel, o gosto de viver e a cor de cobre. O fulgor dos olhos negros, porém , é de Yansã, ninguém lhe tira.

Vendo Tereza Batista por todos os lados cercada e defendida, os orixás em seu redor, eu lhe disse, resumindo o jogo: mesmo no pior aperto, no maior cansaço, não desista, não se entregue, confie na vida e e siga avante.

Contudo, existe sempre um instante de desânimo, quando até o mais valente se dá por acabado, resolve largar as armas e abandonar a luta. Também com ela sucedeu, pergunte por aí e saberá. Mais não posso lhe dizer por não ter tirado a limpo. Para mim, todavia, quem guiou os passos do afogado nos becos da cidade até o esconderijo de Tereza foi Exu. Para armar baderna, Está sozinho. Quem melhor conhece travessas e atalhos, quem mais gosta de acabar com festas?(...) Sobre esse assinto, lhe disse tudo o quanto sei.” (Jorge Amado. Tereza Batista cansada de guerra, p. 346-7)


Não é lindo? Me parece tanto como eu vejo a guarda dos orixás nas nossas vidas, sendo nossos pais/mães de cabeça ou não, são a eles todos que nós chamamos para nos guardarem em cada momento da vida.

Jorge Amado me representa tanto, suas mulheres então, nem comento!

Capa do livro didático sobre Jorge

De todas as coisas que me interessam na literatura de Jorge Amado é, inegavelmente, a presença das divindades de origem africanas. Quantas vezes não me peguei desejando ler um do Jorge, para ficar mais perto dos orixás? Tem muitos outros temas importantes, que causam extrema identificação, mas esse é o que aquece meu ❤️. Emocionada com o trecho de Tereza comentado acima, dei uma olhada, bem por cima, em um  livro didático sobre Jorge que comprei e no  começo do texto "Religião e sincretismo em Jorge Amado", do antropólogo de Reginaldo Prandi (que admiro muito) e ele fala exatamente sobre o que me toca na literatura amadiana: a ancestralidade, na construção das tramas, das personagens, do cotidiano, assim como também é na vida (alguns atos cotidianos são feitos, conscientemente, para agradar aos orixás, por exemplo). Diz Prandi:

"A religião na Bahia(acrescento:no Brasil), como em Jorge Amado, não se separa do mundo real, que se mostra cheio de mistério, segredo, esse cotidiano também está sempre permeado de ciladas e enganos  e até de falsidades e mentiras. A vida nunca é exatamente o que parece ser, nem deixa de ser o que de fato é. Ingrediente excepcional para fazer crescer um bom enredo. De um lado, homens e mulheres que se comportam como os deuses se comportariam se vivessem na Terra; do outro, orixás que precisam dos seres humanos para se alimentar no repasto dos  ebós, para dançar na roda das feitas, para rememorar no transe das iaôs suas míticas aventuras. Sem nunca perder-deuses e mortais- a sensualidade, a malícia e a alegria de ser. "(P 49)


Coisa linda, né? Acho linda essa coisa de representar as divindades africanas participando da vida e do cotidiano dos humanos, o pouco que aprendi sobre as religiões afro brasileiras isso foi uma das certezas que levo pra vida. ❤️ 
Na literatura de Jorge, os orixás são tudo, são temíveis, guerreiros, heróis...com isso alimenta nosso imaginário sobre outras narrativas, passados e futuros possíveis.
Teria sido Jorge Amado um dos nossos primeiros "afro futuristas"? Só amo! 


quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

20 de janeiro de 2021 : Elza Soares é morta

 



A voz de Elza se calou, mas os registros ficam para sempre
Não sei muito o que falar, só OBRIGADA DIVA 





Metas de leitura para 2022

Meu exemplar ainda não chegou, mas a edição é essa


Em geral levo cerca de 15 dias para ler um livro entre 200 e 300 páginas, por isso meus planos é sempre ler no máximo dois por mês, idealmente um "clássico" e um "contemporâneo". Ler bem lido, sem pressa, comentando, refletindo, escrever sobre, como sempre. Ano passado me assustei porque li muito mais livros do que imaginava e gostaria de diminuir o ritmo e aumentar a densidade da leitura. Como eu tinha  previsto, devo terminar esse mês só com o extenso "Tereza Batista cansada de Guerra" (mais de 400 páginas). E o contemporâneo - Nem sinal de asas, da Marcela Dantés -, que chega em alguns dias, começo a ler em fevereiro. Depois, alternando com os "clássicos", já comprei um " Gabriela cravo e canela", da Martins editora (na expectativa de que não venha fedendo mofo), e com isso termino a leitura das quatro protagonistas de Jorge (Gabriela, Dona Flor, Tieta e Tereza Batista). 

Ai posso dar um tempo no Amado, que venho lendo desde o ano passado, e para alternar com um contemporâneo, posso substituir por outro autor brasileiro ícone que ainda não li como deveria (o projeto sempre adiado é ler DIREITO "O tempo e o vento" do Érico Verissimo ainda está nos planos). 

A expectativa desse ano é a de ler uma quantidade menos de livros, mas as leituras serão mais densas.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2022

Sobre "Música de Brinquedo" do Pato Fu

 













Esse mês eu quase não publiquei nada aqui, né? É que estive ocupada, só no dia 12 relatei:


Parte da bibliografia que tirei da  estante para estudar

BRINCAR DE MÚSICA -No fim do ano passado eu estava tão exausta que quase esqueci do texto sobre "Música de Brinquedo" pros anais do congresso de estudos sobre infância em novembro. O texto é curto e devo terminar agora até o fim de semana. Não vou mudar muita coisa em relação a apresentação, só gostaria de analisar uma música no disco e no DVD. Mas qual faixa? Vou ouvir de novo, mas acho que já sei qual será...deixo em segredo


Era para ser fácil, porque eu tinha feito a apresentação e o esquema do texto final , mas como parecia  que tinham se passado anos que eu fiz aquilo, tive que "estudar tudo de novo", E foi um prazer.

Fui ouvir o disco, rever o DVD, passear pela bibliografia, ouvir várias coisas. no último fim de semana, já tinha selecionado meus interlocutores favoritos

Parceiros do fim de semana 15 e 16 jan 

Nesse momento já pude desfazer o mistério :

TRAMPO - Do repertório de "Música de Brinquedo" escolhi para analisar a canção "Rock and Roll Lullaby", o "rock de ninar", porque com ela dá pra abordar as performances musicais no CD e de palco no DVD e isso é um método atualizado de fazer história da música (valeu Priscila Correa) e sobretudo a questão do acalanto como primeiro objeto cultural infantil das culturas na História (obrigada Paul Zumthor ), a um só tempo vínculo com os adultos por uma herança antiga recebida, como também a introdução a literatura oral (valeu Silvia Machado). E juntando e resumindo tudo isso, vou com base em momentos do meu livro. Estrutura tá pronta, vamos ver se sai algo bom!

Foi tão bonito ver meu livro junto a outras referências. Amei de verdade.

Também amei o texto final, do qual publiquei até um trechinho. Sobre o álbum "Música de Brinquedo":


Incrível como minha paixão pelo tema transparece, né?

Em breve devo terminar minha única leitura de dezembro, Tereza Batista Cansada de Guerra, do Jorge Amado, ai comento aqui.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

8 METAS PESSOAIS PARA 2022

 

Metas 

Entrando no terceiro ano da pandemia, a vida se movimentou bastante apesar de tudo e, embora ainda não seja a hora de traçar tantas metas, acho que já dá para traçar algumas a mais do que no ano passado. Vamos arriscar!


1 - CONTINUAR VIVA

A meta de todo ano, o básico do básico. Mas como em 2021 vivi momentos muito ruins, de fraqueza, de autoestima baixa, desespero e tantas vezes senti que ia me esvaindo, acho que sempre vale a pena relembrar que a primeira coisa a preservar sou eu mesma! Só tenho a agradecer por não ter esquecido nunca disso e planejar não esquecer em 2022;

2 - ACHAR UM MOZÃO

Sei que é a meta mais difícil, que não depende só de mim, que eu também nem sempre ajudo, mas talvez seja a mais fundamental. Depois de um 2021 tão solitário, em todos os sentidos, eu tenho que saber e proclamar que eu também mereço não ficar mais tão sozinha. Começando por abrir mais as portas de acesso até mim, o que já é tão difícil, ainda mais na pandemia. Enfim…

3- TRABALHAR MAIS

Não sei como, não sei onde, não sei com o que , mas é fundamental trabalhar, estudar, conversar, fazer a cabeça funcionar e as sementes brotarem. Na pandemia nunca parei de produzir, mas ainda preciso de mais coisas. Como seria eu não sei, mas solto ao universo que eu estou preparada para desafios.

4- TREINAR O MÁXIMO POSSÍVEL

Em 2021 os treinos foram um ponto alto, fui de momentos em que eu não pude fazer sequer uma caminhada, não sabia quando poderia novamente, se poderia e fiquei muito na bad. Mas assim que foi possível, com minha mãe melhor e eu vacinada, peguei a oportunidade de voltar a academia e retomar os treinos com unhas e dentes, como um sopro de vida, uma esperança em temos pandêmicos : de segunda a sábado, acompanhamento nutricional, força, resistência e autoestima. Com tudo que passei, quando retomei os treinos, voltei com mais interesse em entender os exercícios, as dietas, as possibilidades de fazer tantas coisas, mesmo sem academia. Hoje o Youtube ajuda muito e tenho fé que, sem nada, por tanto tempo, não devo ficar! Isso é uma grande esperança.

5- CONTINUAR CUIDANDO DE QUEM AMO (INCLUSIVE EU)

Há anos larguei tudo e venho cuidando muito da minha mãe, agora acho que ela, enfim, já está mais repuperadinha (que maravilha!), então voltei a cuidar mais de mim também. Em 2022 minha meta é continuar com esses cuidados com todos que amo, com o mundo!

6 -RESTABELECER MINHA LIBERDADE

Nesse momento, em janeiro, estou incomodada porque não consigo nem pensar em circular pela cidade. Tem a Covid, tem o surto de gripe, tem meu medo da vida.  Mesmo estando com a vacinação completa, o que me permite frequentar a academia, ainda não tive ânimo para passear. Espero ter força para retomar isso também, afinal ainda estou viva!

7- PODER VOLTAR A SONHAR, APESAR DE TUDO, POR CAUSA DE TUDO

Já desde antes da pandemia vinha observando em mim uma certa dificuldade em sonhar, sonhar alto, sonhar com tudo. Vinha aceitando o que consegui e agradeço tanto, mas é preciso almejar mais. Vou tentar, um dia de cada vez. Agora meu sonho é sair para passear. Tomara que consiga.

8- ME AMAR MAIS DO QUE NUNCA

É uma meta egoísta? É. Mas sem ela não consigo realizar nenhuma das outras, não? Amor próprio é fundamental, um exercício diário que pretendo fazer em 2022. Vamos ver se consigo.

Espero que eu volte a este post no ano que vem e que o balanço seja positivo! Força pra nós! E que venha 2022!


segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

A minha Elza Soares é a sambista! Sobre a biografia "Elza", de Zeca Camargo

 

Quando comprei a bio, era junho e estava estava frio

Lendo uma ou outra biografia de pessoas famosas negras (em geral não sou fã de biografias), escolhi unicamente a biografia da Elza Soares para ler em dezembro, porque s

ou muito admiradora dessa mulher e achava incrível o pouco que sabia sobre sua história. E dezembro é um mês pesado, cansada do ano todo, queria relaxar com uma leitura fácil (na verdade eu achava que o Zeca Camargo não seria capaz de me apresentar nada muito denso e era isso que eu precisava.

Mas o livro é sobre a vida da Elza Soares, essa grande artista, representa como negra, como cantora, etc, difícil não ser denso de alguma forma. 

outra biografia

Zeca sabe que não é um biógrafo, chega a sugerir que Ruy Castro (um autor que, em meados da década de 1990, teria elevado as biografias a status de grandes obras literárias), escolheu biografar Garrincha em "Estrela Solitária - Um Brasileiro Chamado Garrincha" (1995), e à Elza, essa mulher incrível, só contou com um longo (e bem pago) depoimento, que serviu para esclarecer que foi ela, a atacada e perseguida, quem deu suporte emocional e financeiro para que o alcoólatra Garrincha permanecesse vivo por mais tempo. Mas a sua história, ele não contou. Porém Zeca cita "Elza, cantando para não enlouquecer" (1997) , de José Louzeiro, como uma boa biografia, sugida nessa época. E embora Zeca não diga, sugere que ele mesmo é apenas um redator para o que Elza gostaria de falar sobre sua vida. 

Só que, desde o início, embora a leitura seja agradável, eu não queria ler AQUELA BIOGRAFIA, sonhava com uma biografia musical de Elza (do tipo série "livro do disco"), ou então, para não rejeitar essa trajetória incrível de Elza, queria que a biografia tivesse sido escrita por um biógrafo distante do filtro do olhar da biografada, que pesquisou, refletiu criticamente e transformou em narrativa essa vida.  Mas aceitei a proposta e confesso que, no começo,  até achei interessante essa forma de escrever sobre a vida de um artista. Acreditei mesmo que ele estivesse fazendo o que ele próprio chega a chamar de de uma "história oral" de Elza. 

Essa versão sobre o que é o livro "Elza" (um depoimento) funcionou muito bem por um tempo, pois acreditei  mesmo que era a Elza que estava narrando e o Zeca escrevendo sem outras intenções, sendo que seu trabalho mais intenso foi fazer,  aqui e acolá,  uma mediação sobre as possíveis diferenças entre o posicionamento dela e o pensamento do público atual (a intenção de que Elza não fosse cancelada pelas militâncias, pelo Tribunal das Redes Sociais, etc é clara). 

Porém, chegando aos capítulos finais no último fim de semana, a máscara caiu e eu passei a suspeitar de alguma coisa a mais na  ideia desse livro, quando percebi uma mudança no tom da escrita de Zeca, até então tão descritivo, que passou a defender com paixão o militante e propagandística o  disco  "Mulher do fim do mundo"(2016), a dizer que este seria um dos melhores de Elza e da história da música brasileira e em seguida, "Deus é Mulher" (2018),no qual Elza só quis gravar faixas mais "dançantes" e "ritmadas" (ou seja, mais musicais). Algo não estava me cheirando bem , continua não cheirando, e eu ainda não sei com certeza o que é.

Cheguei a comentar no Facebook, no dia 2 de janeiro, na hora em que li essa parte, ela me pareceu destoar da narrativa até então, quis mostrar minha posição


Ai voltamos ao fato de que  ninguém teria se indignado com Elza e sua história (que não é de uma santinha, nem precisava ser, e tem muitos momentos que serviriam para os tribunais a cancelassem, sem dó) , mas ninguém falou nada.  Ninguém exceto Régis Tadeu, que publicou hoje, 3 de janeiro de 2021, um vídeo muito interessante fazendo ESTA crítica musical interessante sobre as produções recentes de Elza, apontando inclusive, que deve ter muita gente (como Zeca Camargo e a biografia Elza?) interessada financeiramente em promover essa postura tão "moderna" de Elza e ele nem sabe até que ponto uma mulher com mais de 90 anos poderia concordar ou defender algumas coisas, como nos é mostrado.

Eu não sei realmente qual é a do Regis Tadeu, mas ele defende bem suas ideias polêmicas, só nem sempre preciso concordar com ele. No caso deste vídeo, em geral gostei da crítica, mas saliento que, acima de tudo,  acho complicado ir pelo caminho de dizer que tem alguém abusando de Elza e ela não sabe disso, pois, não tenho conhecimento sobre o que ela pensa ou sente nessa fase da vida, mas também não vou dizer que Elza tenha deixado de comandar sua vida a esse ponto, porque está idosa. Sobre suas "deficiências" como cantora idosa, ainda que eu fosse capaz de identificá-las com a propriedade que Régis faz, para mim, como admiradora, vale ouvir sua voz sempre, é sua vida que se expressa, apesar de tudo, como foi para mim ouvi-la no carnaval, sem vê-la pois estava reservada, e achado que era o CD de "Mulher do fim do mundo trocando", até ela começar a interagir e mostrar que estava ali. Isso me emocionou demais e nunca vou esquecer que eu ouvi a voz de Elza ao vivo. Não aquela voz maravilhosa dos discos dos anos 60 e 70, mas a voz da Elza, nossa querida Elza. 

Mas musicalmente falando, eu não tenho o conhecimento musical de Regis Tadeu para concordar ou discordar do conteúdo técnico do vídeo, só sei que ele entende de música, eu sou só uma ouvinte comum (e legítima), mas colocada  essa diferença, eu ele concordamos sobre o fato de que o melhor do trabalho musical de Elza não ser nenhum desses discos militantes que ela gravou no século XXI. Embora eu esteja ainda ouvindo "Do Cóccix Até O Pescoço" (2002) sem parar, que não é um disco de samba, mas reconheço nele um trabalho na escolha de músicas bem escritas, representativas e poéticas de grande compositores. E também o primoroso "Elza e João de Aquino", que Zeca conta ter sido gravado no começo da década de 1990 e só agora lançado, onde contamos com a mesma sofisticação. E tudo isso é  diferente do trio militante de discos, em maior ou menor grau, dos  "Mulher do fim do mundo"(2016) [não gosto]; "Deus é Mulher" (2018) [gosto de poucas músicas] e " Planeta fome" [ouvi pouco e nem comento] (2019).

Vestindo a camisa de Elza sambista


Eu amo Elza Soares como cantora e  MINHA ELZA É A SAMBISTA! Tanto que eu tenho uma camiseta dela, mas não a de "Deus é mulher", mas sim a "Elza: Samba, Amor e Revolução". Embora em seu depoimento para a biografia ela sempre diga que não aguenta mais ser taxada apenas de sambista, e eu não ache  que ela seja "apenas" isso, é fato que é  essa a sua face que me mais me encanta. Sorry.

Quanto a biografia ELZA (2018), até gostaria de defendê-la (ela apresenta motivos para isso), mas a simples suspeita de que ela seja apenas mais um tijolinho na construção de uma narrativa lucrativa sobre Elza , que a explora ao limite das suas já escassas forças, da qual não se sabe até que ponto ela está realmente concordando (eu acho, sim, que em alguma medida ela aprova tudo isso, mas em que medida?); Então eu volto a defender que ela merece, sim, ter sua vida contada por um biógrafo mais imparcial (imparcialidade  é impossível, eu sei, mas talvez menos comprometido com outras coisas que desconhecemos). 

Agora , terminada a leitura e escrito o comentário sobre a biografia, volto a ouvir os discos de samba de Elza, esses valem muito à pena!