quarta-feira, 28 de outubro de 2009

SEMÂNTICA E SEMIÓTICA: QUE LOUCURA!

Escreveu Steven Pinker em seu último livro traduzido no Brasil:
"A semântica trata da relação das palavras com pensamentos, mas também da relação das palavras com outras questões humanas. A semântica trata da relação das palavras com a realidade - modo como os falantes se comprometem com uma compreensão comum da verdade, e o modo como seus pensamentos são ancorados em coisas e situações no mundo. (...)Trata-se da relação das palavras com as emoções: o modo como as palavras não só indicam coisas, mas estão saturadas de sentimentos, quedotam as palavrasde uma idéia de magia, tabu e pecado." (PINKER,Steven. Do que é feito o pensamento: A língua como janela para a natureza humana. São Paulo: Cia das Letras. 2008.P.15)
Certinho,certinho. Ando assistindo as aulas de semiótica de Luiz Tatit. que uma vez disse que Semiótica era Semântica... como assim?
Pesquisando na internet, achei esse texto aqui:
"
SEMIÓTICA FÁCIL

4. SEMÂNTICAS
A semântica que conhecemos é simplesmente aquela parte da gramática que abrange os significados das palavras. Em semiótica, semântica é aquela dimensão do entendimento que nos dá conta dos significados de todo e qualquer signo ou de toda e qualquer composição sígnica ou proposição. A semântica, em semiótica, diz respeito a todo tipo de signo, e não somente das palavras escritas ou faladas e dá conta da compreensão também de imagens e sons e toda e qualquer informação que nos chega pelos sentidos e pela elaboração mental.
Quando queremos saber o significado usual, costumeiro, de uma palavra, recorremos, sem hesitar, ao dicionário. Entretanto, nem sempre o dicionário informa sobre os sentidos derivados em que as palavras são empregadas, como nas metáforas ou quando estamos diante de neologismos e gírias, por exemplo. Por isso os semiólogos, como Umberto Eco, ou lingüistas, como o dinamarquês Hjelmslev, definem a semântica como um vasto universo que compreende desde os significados restritos e usuais até aos significados possíveis, em função de relações associativas..."
Tudo isso tá pirando minha cabeça! O que vocês acham?
(Ah, no site temos uma bibliografia de referência, vou consutar, indico aqui:

BIBLIOGRAFIA
ECO, Umberto. Semiótica e filosofia da linguagem. Lisboa: Instituto Piaget, 1984.
HJELMSLEV, Louis Trolle. Prolegômenos a uma teoria da linguagem. São Paulo: Abril Cultural, 1978 - p.195/197.
SAUSURRE, Ferdinand. As palavras sob as palavras. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Meninices de Rosa...


Em 2003/4 eu fiz uma experiência muito interessante de apresentar os jogos de linguagem de Rosa a crianças. Foi marcante, claro!
Hoje eu tenho contato com algumas daquelas crianças - hoje já adolescentes - e no último domingo,quando eu fiz aniversário, recebi votos de parabéns de uma delas,com cheiro de lembranças :"
Manu : Parabéns Camila, um beijão do Guilherme - lherme!! " rs
Em nossas atividades de dividir as palavras em pedacinhos e tentar transformá-los em outros significados, esta menina chamava o Guimarães Rosa de "Guilherme-lherme", então eu a chamava assim ... eu nunca vou me esquecer, e quando ela se lembrou disso, depois de anos, foi um grande presente que eu ganhei: PELO MENOS UMA ALUNA NÃO SE ESQUECEU DAS NOSSAS BRINCADEIRAS COM O ROSA!


Por isso que eu não posso desistir do doutorado, não posso mesmo...
Que o Rosa esteja conosco, sempre!

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

30 ANOS? SOLIDÃO, QUE POEIRA LEVE...

"Na Vida quem perdeo telhado em troca recebe as estrelas..." E DAI?

E QUANDO DA DESCOBERTA DAS MINAS?

Vimos aqui que os colonizadores do Brasil - metalistas- andavam em busca de ouro, prata e pedras preciosas desde a carta inaugural de Caminha, mas esses produtos só foram encontrados no século XVIII. Isso está registrado na literatura, vejamos o poema de Alvarenga Peixoto, extraído da antologia Com palmos medida:










sábado, 24 de outubro de 2009

"... ela mesma não podia ser um sonho para nunca envelhecer..."


Conforme já estava previsto, domingo 25 de outubro de 2009, completo 30 anos.
Viro uma balzaquiana com uma cara de moleca, mas a idade já me pesa um pouco...
Se até a Brigit Bardot- que era uma moça bonita - ficou velha, por que eu não poderei curtir meu amadurecimento?
Com ela eu não sei, mas comigo, nenhum rapaz de 20 anos me telefonou AINDA e eu, como ela, estou "ficando velha, triste e sozinha", mas ao contrário dos dela, os "MEUS SONHOS NÃO QUEREM PEDIR DIVÓRCIO", não ainda!
FELIZ ANIVERSÁRIO PARA MIM, A MAIS NOVA BALZAQUIANA DO PEDAÇO!

sábado, 17 de outubro de 2009

"Sou um mulato nato no sentido lato mulato democrático do litoral"


Esse vídeo nunca postei aqui, mas eu o conheço desde a época que Obama era candidato...
Só que eu estava ouvindo com muita atenção o disco de Caetano, Araçá Azul (porque eu queria beber da fonte colonial para meu doutorado) já que eu dei uma passada de olho (ler é outra coisa ) na dissertação de mestrado de Peter Dietrich sobre este disco e o que ele escreveu sobre a frase de Sugar cane fields forever, que dá título a esse post,me fez lembrar muito desse vídeo.
Escreveu Dietrich e vou parafrasear aqui : Mulato é a mistura das raças negra e branca, é a personificação da síntese entre Europa e África que deu origem ao povo brasileiro. A democracia válida para o mulato é a etnica, e o "nato" refere-se às características herdadas pela etnia. E o mas genial de tudo é que, ao justapor os adjetivos "lato" e "nato", como se estivessem saindo da palavra "mulato", que então passa a aparecer como algo original e autêntico, que o distanciam de suas origens e o colocam como algo novo. (C.f. Peter Dietrich. Araçá Azul: Uma análise semiótica.P.145)
Bom, Caetano é foda e eu concordo MUITO com ele PREFIRO UM MULATO A UMA MULHER (rs)
Por causa do Caetano, se tenho coragem, me denomino Preta Chique, a democrata social racial, como Neide Candolina!
O que vocês acham?

terça-feira, 13 de outubro de 2009

MALABARISMOS

Parece que cientistas estão descobrindo que praticar MALABARISMO ajuda o cérebro a se desenvolver melhor. Leiam aqui.
Isso me lembrou um dos melhores poemas de Viníciu, Acrobatas.
Leiam o poema e imaginem as acrobacias cerebrais, porque para mim parece muito interessante pensar que acrobacias do corpo podem interferir no poder da mente, que conhecemos bem como imaginação, mas parece que vão bem alám disso; e depois imaginem exercícios de acrobacia sexual, da qual fala Vinicius no poema, até que caiamos mortos, pela "pequena morte", que é como os franceses chamam o orgasmo...

domingo, 11 de outubro de 2009

TRAUMAS DE INFÂNCIA : JESUS DO SBT

Não posso colar o vídeo aqui, só o link: http://www.youtube.com/watch?v=TmtQKStTV_I
Escrevi aqui outro dia, sobre como algumas crenças religiosas estavam tentando destruir o imaginário infantil...
Pois agora eu pude entrar em contato com vídeo que, durante a minha infância me aterrorizava!
Eu morria de medo do tom ameaçador da mensagem! O pior era o final
"VOCÊ TEM CERTEZA DE QUE JÁ FEZ TUDO O QUE PODIA PELO SEMELHANTE? PENSE BEM, POIS UM DIA VAMOS NOS ENCONTRAR..." (rs)
O problema era o seguinte: Eu não fazia idéia de quem era esse tal de meu semelhante, então com certeza eu não tinha feito nada por ele e a qualquer hora ESSE JESUS IA VIR ME BUSCAR! (RS)
Isso me dava muito medo! Que monstros, bruxas, duendes... eu tinha medo mesmo do JESUS DO SBT!
Isso tudo,que hoje euacho engraçado, me faz lembrar da catequização dos índios, que nada estavam entendendo direito, e recebiam sobre si, sem aviso prévio, essa carga ameaçadora, só podiam se converter MESMO!
É cada uma, né?

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

SOBRE OBAMA E O NOBEL DA PAZ


Todo mundo sabe que eu considero Obama "tudibom", que homem chique, elegante, influente e lindo! Mas agora ele veio a receber o Nobel da Paz, e claro que os narizes tortos não sossegaram em se contorcer ainda mais... calei-me, mas Saramago não... concordo plenamente com ele e ofereço a todos esse link com sua opinião, que também é a minha... se quiserem, confiram...
Investimento em esperança é acreditar na construçãode algum um tipo de HERANÇA IMATERIAL e apostar em Obama é tentar pintar a história com outras cores, não é?
Vejamos...

NOTÍCIAS DA USP : ELEIÇÕES E VESTIBULAR

Para pessoas mais ou menos ligadas a questões políticas da USP (muito mais menos do que mais como eu), não deve ser novidade que as Eleições para reitor estão tomando o centro das atenções do movimento estudantil. A preocupação não é tola, não só para pessoas da comunidade USP - a quem foi apresentado um site com o tema Eleições USP 2009- mas também a todos os paulistas, pois a eleição do reitor da USP interfere diretamente na economia de poderes que sustem o poder do governador do Estado de São Paulo...


Como em todas as eleições, a do reitor da USP é repleta de jogos de politicagem, de disputas partidárias e de disputas ideológicas entre "esquerdas" e "direitas"...


Mas a lista com os 8 candidatos a serem avaliados pela Assembléia Universitária, composta pelo Conselho Universitário, pelos Conselhos Centrais e pelas Congregações das Unidades, já está disponível...
Como eu me envolvo bem pouco com questões políticas da USP, conheço bem poucos nomes da lista, mas um deles me faz pensar (e temer) que se as coisas seguirem o fluxo que estão seguindo, é bem capaz que quem substituirá Suely Vilena (a Suely"chama a PM pro campus"), será Sonia Penin!
Quem é Sonia Penin?
Quem participou da greve dos alunos da FFLCH em 2002, pela contratação de novos professores para a faculdade, pois contávamos com poucos e as salas estavam sempre lotadas, e o que pior, havia cursos como o e chinês, seria fechado pois seu único docente estava para se aposentar... CHINÊS, MEUS CAROS, QUE É UMA LÍNGUA QUE JÁ VINHA CRESCENDO MUITO EM IMPORTÂNCIA , DADA A COLOCAÇÃO DA CHINA COMO ESTADO QUE MAIS CRESCE DEMAIS NO MUNDO... E a Universidade de São Paulo quase aboliu o seu ensino.
Foram 4 meses de greve, que resultaram na contratação de muitos professores, não só de chinês, mas para a faculdade toda, mas até isso aocntecer, algumas cenas serão para sempre inesquecíveis, como na tarde que os estudantes convocaram a então "Pró reitora de graduação Sonia Penin" para ouvir as colocações dos alunos a respeito da contratação de novos professores.
Conhecendo como as coisas funcionam, os estudantes foram munidos de arsenal simbólico, caso a pró reitora nos falasse coisas absurdas (o que seria mais do que provável), poderíamos colocar os narizes de palhaços devidos...
Então , não foi que ela despejou absurdos? Sona Penin é da área de Educação, e teve a coragem de dizer que PROFESSORES NÃO PODERIAM SER CONTRATADOS, MAS QUE UM NOVO PRÉDIO PODERIA SER CONSTRUÍDO PARA RESOLVER A SUPER LOTAÇÃO DAS SALAS(???) E TAMBÉM OFERECER MUITOS COMPUTADORES MODERNOS PARA SEREM USADOS NAS NOVAS SALAS.
Isso não é chamar os alunos de palhaços?
Sempre, sempre, sempre, educação precisou, basicamente, de apenas duas coisas : mestres e alunos ... como alguém da área de educação estava propondo que os professores fossem substituídos por computadores? Ela fez isso. E agora está querendo ser reitora da USP...
Tomara que ela seja excluída agora em outubro e nem chegue a integrar a listra tríplice da qual o nosso "querido" governador José Serra indicará o novo reitor...
Veremos o que acontecerá.
___________________________________________________________________
Mudando só um pouco de assunto
Por outro lado, a USP enfim se colocou a repeito da utilização do resultado do ENEM no vestibular. Ao contrário da UNICAMP, que assim que se soube da compra da prova, desconsiderou de cara a utilização, a USP ficou pensando, pensando.
Eu achei muito triste o que aconteceu com esse novo ENEM, que seria o primeiro passo de uma nova forma, proposta pelo MEC, de como ensinar os conteúdos, mas não sei... no caso de história (minha área) é muito claro que a mudança seria bastante radical... muito menos conteúdo tipo google, mas muito mais reflexão e compração de saberes (que é muito mais próximo do que se aprende nas faculdades de história), com isso os cursinhos pré vestibulares (os donos do dinheiro investido na educação) poderiam sair perdendo, né? Será mesmo que essa fraude foi um evento realizado para interesse financeiros de algumas pessoas? Achei muito estranho. Como uma prova tão conhecida teria sob si uma segurança assim tão fágil? Como confiar?
Se a USP estivesse mantendo essa utilização, mesmo com todo o cenário de questionamentos de legitimidade desta prova do ENEM, estaria assinando embaixo desse mar de questões, que pode ser bem sujo. Mas não manteve. Novamente, vamos ver as cenas dos próximos capítulos.
Chega de assuntos polícos e politiqueiros porque estamos entrando na semana das crianças: OBA!

terça-feira, 6 de outubro de 2009

MST E OS LARANJAIS : ARBITRARIEDADE SE PAGA COM ARBITRARIEDADE?

Vocês receberam notícias sobre os pés de laranja que tratores do MST destruíram em uma fazenda de São Paulo, não é? Eu estive revendo essas cenas e ouvindo comentários vários sobre ela o dia inteiro...
É que todo mundo sabe que a reforma agrária é algo importantíssimo de se realizar no Brasil, mas sempre me pergunto se o caminho que o MST está percorrendo vai garantir esse objetivo, será?
Se alguém for procurar quais os argumentos do MST para ter destruído os pés de laranja vai, pelo menos, parar para pensar um pouco... A fazenda pertence a Cutrale,que é uma das maiores produtoras de suco de laranja do mundo, a cada três copos de suco tomado no mundo, um foi produzido pela Cultrale, que vêm adiquirindo empresas estrangeiras, e é frequentemente acusada de cartel por outros produtores de laranja. O MST levantou dados de que fazendas ocupadas pelo movimento, que fazem parte do grupo Cutrale, são áreas ilegalmente ocupadas pela empresa, uma vez que a fazenda está localizada em uma região onde 10 mil hectares de terras pertencem à União, então a empresa está sediada em terras do governo federal, o INCRA já havia se manifestado denunciando que à ocupação de tais terras pelo latifúndio dos Cutrale é ilegal. (isso quem esclareceu foi uma pessoa ligada ao MST,que não foi ouvida pela mídia, claro). Então,quem invadiu primeiro a terra da União foi a Cultrale, o MST só veio fazer isso depois? Parece que sim e isso está de pleno acordo com a ideologia defendida pelo MST de lutar contra o predomínio de latifúndios,entretanto, sair destruindo laranjais- sem ter recomeçado imediatamente a plantar o feijão prometido para brecar a monocultura- e ficar pichando muros são manisfestações infantis que são usadas nas greves da USP e que só podem levar a indignação da sociedade (que como sabemos, morre de medo de entrar em contato com algumas coisas como a questão fundiária e com esse tipo de atitude do MST, acabam achando alguma legitimidade para esse medo... péssimo!)
Por outro lado, claro que eu fico sem palavras com as opiniões apresentadas pela mídia,como sempre...O Alexandre Garcia, nesta manhã, entoou um verdadeiro discurso indignado pela existência e permanência de ORGANIZAÇÕES AUTÔNOMAS QUE SE APRESENTAM COMO MOVIMENTOS SOCIAIS, COMO O MST...E o direito da livre manifestação? Péssimo isso de pensar e agir com arbitrariedade.
Assim,sou eu é quem fica com medo, medo de ignorância paga com mais ignorância e arbitrariedade paga com mas arbitrariedade... nessa luta por saber quem é o mais hostil, e as questões fundiárias e trabalhistas acabam ficando à margem e são usadas por interesses politiqueiros de todos os lados.
Assim, todos perdem e, como sabemos,os mais fracos perdem mais.. mas quem são os mais fracos, mesmo?
Tô confusa, eu sei,mas eu acho que é uma questão para ser muito discutida, muito mesmo, mas como a luta para saber quem grita mais, vamos apenas ouvir ruídos demais!

domingo, 4 de outubro de 2009

"Y una hermana muy hermosa que se llama libertad..."


Não é com nenhuma alegria que fico sabendo que neste dia 04 de outubro nos deixou aqui sozinhos nesse mundo quase todo errado uma das pessoas que mais lutou, louvou e se preocupou com a fraternidade no mundo: Morreu Mercedes Sosa.
Muitas canções que ela entoou me emocionaram e emocionam,mas essa do vídeo é especial... e quando penso que ela morreu, só me lembro do poema de Drummond, em seu lindo e melancólico livro Farewell, no poema "Liberdade" :
"O pássaro é livre
na prisão do ar.
O espírito é livre
na prisão do corpo.
Mas livre, bem livre,
é mesmo estar morto."
Que Mercedez voe em direção a sua "hermana muy hermosa que se llama libertad..."

sábado, 3 de outubro de 2009

UFANISMO UTÓPICO



O título e a charge eu peguei do perfil do meu orkut-amigo Jonh Bernardes Justiniano.

Mas a idéia também é minha: Esse entusiasmo adolescente não está mais colando em mim...

Como no dia que seria divulgado o resultado da disputa do local a ser realizado em 2016 foi decretado PONTO FACULTATIVO!... Sei lá, esse tipo de envento não dá certo sem muito empenho e muita grana (que grana?)

Eu não fiquei tão "feliz"... mas é apenas a minha opnião...

O que vocês acham?

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Certidão de batismo da literatura do lugar que viria a ser o Brasil

Sexta-feira, 1º de Maio de 1500

“... Entre todos os entes que aqui vieram, não veio mais que uma mulher moça, a qual esteve sempre à missa e a quem deram um pano com que se cobrisse. Puseram-lho ao redor de si. Porém, ao assentar, não fazia gande memória de o estender bem, para se cobrir. Assim, Senhor, a inocência desta gente é tal,que a de Adão não seria maior, quanto a vergonha..
Ora, Vossa Alteza, se quem em tal inocência vive se converterá ou não, ensinando-lhes o que pertence à sua salvação. (...)
Esta terra, Senhor, me parece que da ponta que mais contra o sul vimos até outra ponta que contra o norte vem, de que nós deste porto houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte e cinco léguas por costa. Tem, ao longo do mar,nalgumas partes,grandes barreiras,delas vermelhas.delas brancas; e a terra por cima toda chã e muito cheia de arvoredos. De ponta a ponta, é tudo praia-palma, muito chã e muito formosa.
Pelo ‘sartaam’ nos pareceu, vista do mar, muito grande porque a estender olhos,não podíamos ver senão terra com arvoredos,que nos parecia muito longa.
Nela, até agora, não pudemos saber que haja ouro, nem prata,nem coisa alguma de metal ou ferro; nem lho vimos. Porém a terra em si é de muito bons ares, assim frios e temperados, como os de Entre Doiro e Minho, porque neste tempo agora os achávamos como os de lá.
Águas são muitas; infindas. E em tal maneira é gaciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se á nela tudo, po bem das águas que tem.
Porém o melhor fruto, que dela se pode tirar, me parece que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza nela deve lançar. (...)
Beijo as mãos de Vossa Alteza.
De Porto Seguro, da vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro de maio de 1500.
Pero Vaz de Caminha ”

Se eu seria personagem

No conto “Se eu seria personagem”, do livro Tutaméia de Guimarães Rosa o narrador duvida da própria existência e deseja a chegar a existir (que seria ser realmente personagem), assim como seu amigo Tito-lívio Sérvulo. Como tudo do Guimarães Rosa este texto é sublime, vejamos como ele começa:

Note-se e medite-se. Para mim mesmo, sou anônimo; o mais fundo de
meus pensamentos não entende minhas palavras; só sabemos de nós mesmos com muita
confusão.
” (Guimarães Rosa. Se eu seria personagem. In Tutaméia.P.199)

Para um texto de Antonio Candido, já mais antigo que eu, a personagem de romance (que estou entendendo aqui como personagem de ficção escrita no geral) :

“a personagem é um ser fictício, -expressão que soa como paradoxo.
De fato, como pode uma ficção ser? Como pode existir o que não existe? No
entanto, a criação literária repousa sobre este paradoxo, e o problema da
verossimilhança no romance depende desta possibilidade de um ser fictício,
isto é, algo que, sendo uma criação da fantasia, comunica a impressão da
mais lidima verdade existencial. Podemos dizer, portanto, que o romance se
baseia,antes de mais nada, num certo tipo de relação entre o ser vivo e o ser
fictício, manifestada através da personagem, que é a concretização
deste.”
(Antonio Candido. A personagem do romance. In A
personagem de ficção. P.55)
Mas por que eu trago estas colocações tão teóricas e literárias neste texto? Existe uma motivação real.
Faz cerca de duas semanas eu acompanhei pela televisão a história de um homem que se inventou, como se ele mesmo fosse uma personagem de ficção. Falo da História de Julio César Santos, que foi contada em uma
reportagem do Globo repórter.
Julio Cesar, nome que foi a única informação que ele recebeu sobre sua origem desde quando foi entregue a um abrigo no Rio de Janeiro em 1970, com menos de 2 anos de idade e sobre o qual não se sabia quase nada além deste primeiro nome, nem o sobrenome, nem a data de nascimento, nem a identificação dos pais...isso ele, com mais de 40 anos, ele foi buscar, com a ajuda de uma assistente social, pois ele pensava (e com razão) que ele tinha direito a ter na certidão de nascimento um sobrenome e o nome da mãe.... aí foi dado a ele o direito de inventar sua realidade. Escolheu o sobrenome Santos porque ele assistia muitos filmes evangélicos e a idéia de alguma coisa “santa” rondava sempre sua cabeça, e o que eu achei mais importante: para a mãe ele escolheu um nome extraído do seu nome, se ele era Julio César, a mãe poderia ser Juliana...
Começou assim a criação da personagem Julio César Santos, bombeiro,que adotou pais depois de adulto ...sim, ele não foi adotado por ninguém quando criança, e nos relatórios de sua internação nos abrigos sempre só constou que “não se sabia de ninguém que o tivesse vindo procurar” , mas depois que saiu do abrigo ele mesmo “adotou” um casal que apresentou a esposa e aos filhos como sendo seus pais...sim, ele nunca dizia a ninguém sobre o que realmente tinha lhe acontecido, que tinha sido entregue em um abrigo, ainda bebê e lá permaneceu, pois tinha medo de ser rejeitado pelas pessoas. Esta verdade lhe doia muito. Eu entendo muito bem do que ele está falando e o tamanho da dor que ele sente.
Eu não conseguia escrever sobre isso (e ainda é difícil), porque embora eu saiba que minha história não é como a dele, eu tenho pais e família que me acolheram desde sempre e ainda me acolhem (os meus me adotaram, não precisei adotá-los depois de adulta), o que é ótimo para mim, claro, e significa uma ferida a menos, mas eu também sei que a ferida mais aberta não está na adoção – que é um história bela e de acolhimento-, mas sim no que aconteceu antes dela... quando a gente sabe que a primeira coisa que lhe aconteceu quando surgimos no mundo foi que fomos abandonados, como ter uma grande auto estima? Como qualquer abandono, tolo que seja, pode não doer mortalmente em você?
Não pode.
Julio César precisou contar a sua história para a Globo, e o fez na esperança de que a sua mãe (que pode não se chamar Juliana, mas é a “única pessoa que ele gostara que ouvisse seu relato”),porque pensa que isso fizesse com que doesse menos. Será?
Comigo a história é ligeiramente diferente. Me dói muito aquilo que a minha mãe (a mulher que me adotou) contou a história de como eu apareci aqui em casa, uma linda história, da qual eu só posso me orgulhar, mas quando me narrou ela ainda comentou (um pouco sem ter noção de quanto doeria) “achei estranho que a sua mãe (ela referia-se a mulher que me pariu) nunca ter te procurado,nem por curiosidade...
Claro, você pode achar isso um detalhe tolo, mas digo-lhe que não é. No fundo, no fundo, eis a base desse meu (inexplicável a primeira vista) sentimento de não pertencimento a esse mundo onde vivo...
Não vou procurar a mulher que me pariu há 30 anos atrás, nem procurar a Globo numa atitude desesperada de resgatá-la, porque ela já significa quase nada naquilo que eu vim a me tornar, mas não sei se é intencional ou não, não posso esquecer que eu escolhi -e lutei muito para sustentar essa escolha- estudar as crianças abandonadas da literatura de Guimarães Rosa com0o tema do meu doutorado e como anunciei claramente na defesa do meu mestrado em março, aquela dissertação só existiu porque Guimarães Rosa escreveu “Lá, nas campinas” , que é a história de Drijimiro, que é mais ou menos como a de Julio César Santos, alguém que sabia quase nada da sua origem ... estudar essas questões e tocar profundamente em feridas são formas de tentar digerir o que não é digerível.
Boa sorte para Julio César, para mim, e para todos que começaram a vida a partir de um nada, porque é possível, sim, que este “quase nada” se transforme em tudo, como na palavra Tutaméia, que quer dizer “quase nada”, mas também quer dizer “tudo o que é meu”.