A Biblioteca da Faculdade de Educação (FE) da USP vai abrigar, a partir do dia 11 de março, um parque de esculturas muito especial: as obras monumentais móveis da artista Sandra Guinle, que reproduzem o universo de jogos e brincadeiras de uma infância de outrora. Em Memórias de Uma Infância – Cenas Infantis, Sandra busca o resgate do universo infantil onde a imaginação e criatividade eram ingredientes fundamentais para as brincadeiras dos tempos passados.
As esculturas lúdicas de Sandra Guinle foram doadas ao Museu da Educação e do Brinquedo (MEB) da FE e encontram-se no segundo andar da biblioteca, em amplo e iluminado espaço destinado à pesquisa de acervos especiais, obras raras, entre mesas com computadores, aconchegantes e coloridos sofás, e a paisagem verdejante das tipuanas, que podem ser vistas pelas janelas. As obras permanecerão na biblioteca até que o prédio do Museu de Educação e do Brinquedo seja concluído.
Antes exclusiva dos livros, a biblioteca passa a ter, nos tempos atuais, uma nova concepção que integra o registro da cultura por meio dos livros com outras formas de registro, como obras de arte, brinquedos e espaços lúdicos. Tome-se como exemplo as bibliotecas da Bélgica, onde convivem em harmonia livros, brinquedos, arte e cultura. Livros e brinquedos podem ser emprestados, e os eventos nesses espaços incluem não apenas lançamentos de publicações, mas exposições de arte, inclusive da arte infantil, fruto do registro da cultura lúdica. A integração de espaços e de concepções é o foco que ilumina as ações do século 21.
Nesse ambiente destaca-se a brincadeira de amarelinha, balões, pipas, balanços, bambolê, carniça, bola de gude, carrinho de rolimã, balanços, trepa-trepa, ciranda e pular corda. Alguns jogos infantis retratados pela artista em esculturas de bronze colorido, que têm ainda a magia de poderem ser tocadas e até mesmo movidas pelas crianças. É um convite para imaginação, reflexão, produção e expressão da cultura. “Tudo pode ser tocado, e o público poderá sentir e sonhar”, avisa Sandra.
Trabalhando inicialmente com tela de arame, onde monta a estrutura de barro que será o molde da futura peça fundida em bronze e depois pigmentada com cores, Sandra Guinle recria o tempo de sua infância passada no interior de São Paulo, em que mulheres lavavam roupas no riacho enquanto as crianças brincavam com o barro. “A criança nunca estava sozinha”, lembra, ressaltando que seu trabalho denuncia a “tecnologia avassaladora que cerca o universo infantil, onde o jogo de amarelinha foi encaixotado”.
Para a professora Belmira Bueno, Diretora da Faculdade de Educação, “contar com esse conjunto de esculturas é um privilégio para a FE, que pode, além do mais, comunicar a seu público um novo sentido da biblioteca. Um espaço não mais formado unicamente por livros, mas também por acervos culturais diversos e espaços que valorizam a estética, o conforto e o prazer”.
E a artista não exclui nenhuma criança. Seu envolvimento com a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) provém da experiência de sua filha, Maria Isabel, que foi estudar essa forma de comunicação para conversar com crianças surdas. Essas vivências colaboram para viabilizar, inclusive, o direito das crianças cegas experimentarem pelo toque e descobrirem o brincar infantil, elas podem “ver” suas esculturas, em painéis táteis.
“A importância da doação desse acervo, para além da estética e riqueza material, é a de constituir peça fundamental na formação de professores brincantes dotados de atitude lúdica e capacidade de dar suporte à expressão lúdica das crianças. Nesse ambiente, professores podem ocupar o espaço da exposição para suas aulas interativas sobre o brincar e a cultura, assim como crianças e adultos podem relembrar suas brincadeiras, em reflexões, gestos e narrativas carregados de imaginação e de aprendizagens em visitas monitoradas”, afirma a professora Tizuko Morchida Kishimoto, curadora da exposição.
Instalação
Quarenta e duas esculturas pequenas, em bronze colorido, mostrando jogos como bola de gude, pião, gangorra e trepa-trepa estarão expostas. Exibe-se também, sete esculturas interativas de grandes dimensões – algumas atingindo três metros de altura e alicerçadas em roldanas embutidas – e duas de médio porte. Juntamente a isso, 15 painéis táteis para portadores de baixa visão. Por todo o espaço encontram-se frases poéticas de Sandra referindo-se a infância de outrora.
Uma vídeo instalação feita por Tereza Lampreia e Ricardo Gomes mostrará o processo criativo, da modelagem das peças à fundição, trazendo depoimentos da artista e imagens poéticas de uma infância cada vez mais distante dos tempos modernos. Tudo ao som do refrão da música Roda Viva, de Chico Buarque.
Interatividade é uma das características do trabalho de Sandra Guinle. Bases acrílicas giratórias permitem que as esculturas sejam movidas e sentidas. “Extrair do bronze, metal duro e frio; leveza, movimento e emoção sempre foi um desafio para mim”, relata a artista. A exposição conta todas as informações em braile.
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